Home Diversos Crítica | Até que a Morte vos Separe (Mistérios do 87º Distrito #9), de Ed McBain

Crítica | Até que a Morte vos Separe (Mistérios do 87º Distrito #9), de Ed McBain

Um casamento cheio de surpresas.

por Luiz Santiago
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Por volta de uma e meia daquela ensolarada tarde de domingo, Antonio Carella estava pronto para atirar em sua esposa, desafiar seu filho para um duelo, deserdar sua filha e cancelar todo o maldito casamento.

O padrão narrativo utilizado por Ed McBain neste livro é o do “dia de folga de um policial“, outra forma dele explorar um procedimento investigativo num espaço nada propício para isso. A ação se passa em um domingo de junho de 1959 (mesmo ano de lançamento do livro), quando Steve Carella está de folga. Ele é acordado pela manhã com o telefone tocando, e fica surpreso ao ouvir a voz alarmada do cunhado, Tommy Giordano, que diz estar com muito medo. Ele acabara de receber uma caixa com um absurdo presente, naquela mesma manhã. A manhã do dia em que se casaria com Angela Carella.

O livro é certamente um dos mais divertidos dessa série até o momento, e curiosamente foi um dos que menos impacto teve nos leitores à época do lançamento, considerando aí o decálogo inicial dos Mistérios do 87º Distrito. Diria até que toda a primeira parte do livro é muito mais chamativa, interessante e gostosa de ler do que muitos dos enredos anteriores do autor, começando pela proposta, que é abordar um dia de folga (não muito “de folga” assim) na vida de alguns policiais. Nesse caso, Carella tirou folga porque precisava estar presente no casamento da irmã. Mas o telefonema do cunhado, que recebeu — como “presente de casamento” — uma aranha viúva-negra numa caixa, tornou o dia agitado para o detetive e de seus amigos Cotton Hawes e Bert Kling, que também estavam de folga e que Carella convidou para que ajudassem a mantar a segurança na festa.

Descobrimos que Steve possui pavor de aranhas, e vemos como o “presente de casamento” dado a Tommy coloca em andamento uma curiosa investigação “de bastidores”. O autor foi certeiro ao manter a cerimônia religiosa e a festa de casamento ativas, enquanto o perigo estava o tempo inteiro à solta. Essa ameaça em potencial, mostrando suas garras enquanto as pessoas se divertem, deixou a ação geral mais tensa, fazendo com que o leitor temesse o andamento das coisas. Apesar de o livro ser bastante apedrejado pelo caráter do mistério que traz, eu não tenho nenhum problema com ele nessa seara. A grande questão aqui não são os eventos em si. São algumas coincidências absurdas entre eles e, principalmente, a falta de uma melhor justificativa para um dos blocos dos vilões  — porque o livro nos apresenta duas esferas diferentes de inimigos, cada um com intenções e motivações bem diferentes, mas apenas um desses lados é dramaticamente explorado na obra.

Até este livro, eu não tinha visto Ed McBain tão à vontade em mostrar o lado humano, simples e despreocupado de alguns personagens principais da saga do 87º Distrito, bem como de alguns coadjuvantes de luxo da série. Aqui, o autor faz isso e, com muito bom humor, consegue explorar coisas sérias como a neurose e o trauma de guerra, ou a fixação doentia (e passional, possessiva, machista, violenta) de um jovem para com uma antiga namorada, sendo esta linha uma das mais interessantes da história, chegando quase por acaso e se desenvolvendo muito bem. Aliado a isso, temos boas cenas de ciúmes causados por diferentes pares durante a festa de casamento, uma hilária e fraterna conversa entre Steve e Angela sobre a noite de núpcias e um processo investigativo rápido e pouco usual, com estágios que aparentemente não dão em lugar nenhum, mas que, na verdade, estão fornecendo pequenas peças para montar toda a grande figura. Até que a Morte vos Separe traz inúmeras mudanças para a família Carella, finalizando a jornada com o parto antecipado de Teddy, nos parágrafos finais do livro, entregando-nos uma última (bem-vinda e grande) surpresa.

Mistérios do 87º Distrito (87th Precinct) – Livro 7: ‘Til Death (EUA, 1959)
Autor: Ed McBain
Edição lida para esta crítica: Thomas & Mercer, 2012
201 páginas (edição digital)

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