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Crítica | Mocha Dick: A Lenda da Baleia Branca

Uma tradução visual esplendorosa da mitológica baleia cachalote.

por Leonardo Campos
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Uma obra ficcional inspirada no naufrágio do Essex, em 1820, bem como na lenda do cachalote branco que afundou diversas embarcações pelos arredores da Ilha Mocha, no sul do Chile, nesta mesma época, acontecimentos que inspiraram Herman Melville em seu processo de composição de Moby Dick, em 1851, romance com elementos de aventura, cetologia, existencialismo e filosofia. Todo este conteúdo inspirou Gonzalo Martinez e Francisco Ortega na composição de Mocha Dick: A Lenda da Baleia Branca, uma verdadeira obra-prima dos quadrinhos, publicada no Brasil em 2021, pela editora Conrad, material que ao longo de suas 128 páginas entrega muita adrenalina e reflexão para os seus leitores, bem como uma técnica impecável na construção de seus quadros, num encadeamento de situações que transforma os seus personagens em criaturas esféricas, cativando o leitor além da mera aventura marinha.

Dentre as citações de sua abertura, temos Jonas, o conhecido livro da Bíblia Sagrada que retrata a trajetória do homem que desobedeceu determinadas ordens divinas e pagou um alto preço, tendo que atravessar uma jornada de provações, dentre elas, ser engolido por uma enorme baleia (nalgumas interpretações, um peixe de grandes proporções), até ter o perdão pelos seus atos. Em sua cuidadosa abordagem de um território cultural já vasto no campo das adaptações, a HQ traz em sua nota preliminar, descrições sobre como o conteúdo se inspirou no naufrágio do Essex, na existência de uma baleia cachalote de proporções monstruosas no sul do Chile, bem como no mito mapuche de Trempulchae, além de abordar o descanso da alma de grandes guerreiros. A Lenda da Baleia Branca, em seu processo narrativo, traz para o leitor a história de Caleb Hienam, um garoto de 15 anos que embarca numa aventura pelos confins do oceano Pacífico para aprender sobre a economia baleeira, tradição em sua família.

O lance é que o rapaz sequer se interessa pelo empreendimento. Em sua primeira viagem, conhece o jovem Alipo Leftraru, integrante de uma tribo guerreira mapuche e, assim, desenvolve uma amizade belíssima, ambos testemunhas do mencionado naufrágio, tragédia que traz um sobrevivente a testemunhar todo o horror vivido por aquele que ficou à deriva por bastante tempo para se tornar uma pessoa traumatizada para o resto de sua vida. Ao ser atacado por uma baleia cachalote de proporções gigantescas, como sabemos, os tripulantes do empreendimento náutico de caça foram morrendo aos poucos, vitimados por sede, fome, desnutrição, etc. Tudo isso é mesclado com a história paralela construída pelos criadores da HQ, numa narrativa que entremeia ficção e realidade, estabelecendo fios tênues entre o que é real e o que é imaginação. Um primor, focado em personagens inseridos em suas trajetórias de busca, tal como Ismael e Capitão Ahab, de Moby Dick. O primeiro, desejoso em encontrar o seu lugar no mundo e, o segundo, focado na obsessão pelo encontro com a baleia que o mutilou.

Produzida durante dois anos, Mocha Dick: A Lenda da Baleia Branca se conecta com Moby Dick não apenas pela história em si, mas pela inclusão de um glossário bastante elucidativo. São informações sobre elementos que compõem os estudos em várias áreas, dentre elas, biologia, geografia, sociologia, dentre outras. Com fontes de Lilian Mitsunaga, a HQ ainda conta com uma excelente tradução de Claudio Martini. Em seu desenvolvimento em preto e branco, os criadores desta aventura envolvente empregam bastante o uso dos planos gerais, compondo belíssimas pinturas das paisagens por onde passam os personagens, figuras ficcionais assertivamente delineadas em suas feições quando contempladas em planos mais fechados. Ademais, o material é de uma acessibilidade incrível, pois funciona como leitura de entretenimento, tem perspectiva pedagógica para quem deseja inserir em sala de aula, proporcionado reflexões interdisciplinares.

Em linhas gerais, um trabalho de primeira linha, visualmente atrativo e tematicamente interessante.

Mocha Dick: A Lenda da Baleia Branca (Mocha Dick: La leyenda de la ballena blanca) — Chile, 2012
Roteiro: Francisco Ortega
Tradução: Claudio Martini
Arte: Gonzalo Martínez
Editora: Conrad (Brasil, setembro de 2021)
Páginas: 144

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