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Crítica | Moonfall: Ameaça Lunar

Retorno às origens do sci-fi ironizado pelo nosso presente anti-ciência e conspiracionista.

por Davi Lima
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Moonfall

Um dos filmes independentes mais caros desde Valerian e a Cidade de Mil Planetas (2017), quase todo custeado por parceiros estrangeiros e estúdios independentes, fora do cerco dos streamings e sem Universal, Paramount, Warner e Disney; Moonfall: Ameaça Lunar, dirigido por Roland Emmerich, o rei dos filmes de desastre, é um filme de retorno às origens do sci-fi ironizado pelo nosso presente anti-ciência e conspiracionista. O diretor havia dito no Festival de Cannes de 2019 que pretendia misturar 2012 (2009) com Independence Day (1996), mas o que essa sua produção consegue mesmo é ser sufocada pelos moldes blockbusters contemporâneos enquanto tenta comentar uma mitologia lunar como um progresso alternativo para a sociedade.

Apesar das boas ideias diluídas no roteiro de Roland, Harald Kloser e Spenser Cohen, é inegável a fragilidade narrativa que acompanha toda a direção, contaminando a qualidade dos atores, esvaziando dramas familiares e descompensado o processo de lógica em constante decrescente. Não é novidade que nos filmes de Emmerich haja uma quebra de “protocolos” com aquilo que o público está acostumado. A facilidade em olhar para suas obras como um nível menor, por se sustentarem em efeitos visuais e perda de realismo, é uma maneira pragmática de se assistir aos filmes, porque o que importa mesmo é o entretenimento e a especulações emergenciais em torno dos desastres naturais (em 2012) e as ações patriotas para destruir aliens que vem atacar a Terra perto do 4 de julho. Moonfall não escapa de nada disso, contendo ainda os limites noventistas que o diretor mantém como linguagem para o gênero sci-fi e cinema de espaço. No entanto, nesse filme há uma crueza nas suas abordagens conservadoras e excessos de atualidade dos blockbusters modernos que diminuem as tensões da tragédia lunar.

Grosso modo, o filme utiliza o conhecimento do senso comum misturado com o científico sobre a Lua para tornar a gravidade um artifício inerente a resoluções quaisquer. Esta, por sinal, avança num modelo narrativo que busca a relação da descoberta que, infelizmente, vai dificultando a credibilidade das temáticas trazidas. A maior força conceitual que se põe é no anti-estado, anti-mísseis, anti-NASA e anti-Lua, sempre a favor da família e do idealismo pós-científico, a partir da crença inabalável da relação entre pais e filhos, esposos e esposas contra o automatismo, contra a alta tecnologia da sociedade. É uma amálgama crua facilmente ironizada pelas citações a Elon Musk e pela heroicização dos padrões de terraplanistas no protagonista K.C Houseman (John Bradley). É como se Roland Emmerich pegasse o discurso amoroso de Matrix Resurrections e buscasse quebrar as expectativas das relações de ex-esposos com ex-esposas em meio à luta do estado imediatista contra os loucos astronautas da teoria da Lua descobrindo sobre seus antepassados.

Em meio à luta pela família, em meio aos sacrifícios sucessivos no filme que interagem os personagens como meros corpos inteligentes a lembrarem convenientemente da mudança de gravidade a cada proximidade da Lua gigante da superfície da Terra, eles precisam olhar para cima. Pegando a frase do momento, depois do sucesso do longa de Adam Mckay, Moonfall acredita bastante no desastre, acredita bastante na ciência, ao ponto de vasculhar a Apollo 11, reconectar ônibus espaciais pichados com #fuckupmoon e delinear uma cena de personagens jogando cédulas de dólar fora. No entanto, essa volta às origens do sci-fi com mega estruturas dentro da Lua feita por aliens, sonhos molhados de teorias “pansmêmicas” dão voz, ironicamente, a visões reacionárias. 

É uma ironia que se torna mais forte que o conceito do filme de gênero contra a maré de blockbusters, ainda mais por ser um longa que faz Halle Berry, como Jo Fowler, praticar piadas no estilo Marvel. Mesmo que Emmerich capriche junto ao seu  designer e ao diretor de efeitos visuais, a contradição da Inteligência Artificial desestimulante visualmente em comparação às construções humanas das megas estruturas, essa antítese é minguante, não cheia.

A tragédia em 2012 era mais emocionante e mais verossimilhante, e em Independence Day era mais lúdica e tematicamente melhor trabalhada no conservadorismo. Além disso, atuações não têm tempo na montagem, ou intensidade reativa para expressar emoções. Os dramas são mais conexões familiares didáticas que podem ter tido menos desenvolvimento pela dificuldade de filmagens e refilmagens no período pandêmico junto com o custo da produção independente de grande orçamento – que inclui custos para proteções contra o Covid-19. Pode-se também argumentar alguma proposta de Emmerich artificializar relações humanas como tradução de signos de seu roteiro e crença cinematográfica. 

Num script que valoriza mais os objetos menos tecnológicos e informações como pulsos narrativos, desde o  brinquedo da criança e o globo de neve, do jornal mijado pelo gato, ao celular não smartphone – ao ponto de um smartphone ser quebrado para cessar uma cena de tensão no filme -, revela-se um drama sobre esquecer as pessoas e valorizar os sentimentos. De que adianta o pai Brian Harper (Patrick Wilson) se preocupar com o filho se ele não o reconhece na TV, ele se culpar por perder um parceiro astronauta e se esquecer de Jo Fowler, que ele salvou? Emmerich tem uma crença notada em seus filmes que o espaço e os corpos têm seus efeitos em tela nos desastres, valorizando mais cenas de ação de sobrevivência e sacrifício do que diálogos dramáticos.

A verdade é que Moonfall busca o passado como futuro sem pensar nas margens contemporâneas, criando micro-contradições que se acumulam na leveza do blockbuster, despedaçando muitas ideias boas. O diretor, de certo modo, é um suspiro em meio a sequências intermináveis de franquias e universos fechados dos estúdios. O sci-fi se torna mais próximo, tem suas referências vulgares que tornam o astronauta e o analógico relevantes em meio a um desastre que faz as pessoas olharem para o céu, para a Lua e sua mitologia. Infelizmente, não é pela inverossimilhança e as quebras de grife clássicas do diretor antiquado que diminuem a experiência, e sim a mistura pouco firme da tragédia e de seus dramas, como uma fuga dos assuntos que se quer tematizar na atualidade. É uma ousadia covarde, afinal.

Moonfall: Ameaça Lunar (Moonfall) – Reino Unido, China, Estados Unidos | 2022
Direção: Roland Emmerich
Roteiro: Roland Emmerich, Harald Kloser, Spenser Cohen
Elenco: Halle Berry, Patrick Wilson, John Bradley, Charlie Plummer, Kelly Reilly, Michael Peña, Carolina Bartczak, Zayn Maloney, Ava Weiss, Hazel Nugent, Chris Sandiford, Jonathan Maxwell Silver, Eme Ikwuakor, Stephen Bogaert, Maxim Roy, Ryan Bommarito, Kathleen Fee, Donald Sutherland, Frank Schorpion
Elenco: 130 min.

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