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Crítica | Mulher-Maravilha: Bloodlines

por Gabriel Carvalho
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“Tenho que parar os intrusos.”

Para alguém conhecido pelo seu grande descontentamento com as animações da DC, a primeira abordagem solo da Mulher-Maravilha nesse universo compartilhado de longas animados consegue superar os erros crassos que foram os projetos anteriores. Em teoria, contudo, a obra em questão seria uma renovação para o estúdio responsável por estes filmes, em meio apenas a produções de materiais protagonizados ou pelo Batman ou pelo Superman. Quem comanda o espetáculo dessa vez, no caso, é a amazona mais conhecida da cultura popular, interpretada por Rosario Dawson e bem pouco explorada por tal universo animado. Entretanto, o seu longa-metragem, constituído pela mesmíssima equipe criativa de sempre, não poderia soar mais genérico, desperdiçando quase que por completo uma personagem com enormes potenciais a serem investigados. Ao mesmo tempo, surpreende que tanto desgosto mostre ser consequência de uma obra que adentra de maneira vasta na mitologia da Mulher-Maravilha, no entanto, pouco se aprofunda verdadeiramente nela. Da quantidade enorme de antagonistas clássicos da super-heroína presentes, passando pela aparição de inúmeros membros consagrados de seu rol de aliados, e até mesmo resgatando pontos já bem esgotados da sua história de origem, Justin Copeland e Sam Liu não conseguem aproveitar muita coisa do coração dessa maravilhosa personagem, numa descartável animação mequetrefe e vazia.

O reino da preguiça pegou o lugar do reino das amazonas, na verdade, e os primeiros passos da animação comprovam isso com maestria. Em primeiro lugar, o porquê do roteiro optar por recontar a história de origem da Mulher-Maravilha, contudo, a sufocando em uns míseros dez minutos, é um mistério. Não existe o menor interesse dos responsáveis pela obra em dar tempo para as conexões entre os personagens vingarem, o que ocasiona uma sucessão insípida de acontecimentos vagos. E a mudança de focos nesse ato é um gigantesco problema, porque o longa começa com a visão de Steve Trevor (Jeffrey Donovan), chegando à Themyscira por acidente como conta a maior parte das revisitas ao mito da heroína, só para posteriormente rejeitar qualquer protagonismo seu. Ele, porém, é relegado à dimensão de coadjuvante que preenche tela e não tem verdadeira relevância para a narrativa. Trevor não possui um arco, apenas ganha uma barba, dada uma progressão de tempo que é igualmente problemática – por X razões, que explicitarei mais para frente. Etta Candy (Adrienne C. Moore), por sua vez, surge abruptamente, como mais um dentre os sintomas que comprometem a integridade da obra, sem ser capaz de perfumar alguma cerimônia para a amiga da amazona. No mais, a animação não aprofunda sua relação com a protagonista, e então revela-se que Etta é lésbica – naturalmente até, mas tentando mascarar o quão gratuita a sua presença é.

Do menosprezo de Trevor, o enfoque passa a ser a Mulher-Maravilha, por motivos compreensíveis. Mas nem isso é tão mantido, pois a protagonista acaba ignorada um pouco pela obra para Vanessa (Marie Avgeropoulos), a filha de uma amiga sua, ganhar proeminência. Nesse sentido, existe certa coerência, porque o cerne do longa trata justamente do relacionamento entre uma personagem e outra. Basicamente, acompanhamos Diana esforçando-se para impedir que Vanessa se renda ao crime. Contudo, estas questões são construídas, continuando com os problemas já apresentados anteriormente com a introdução de Trevor, de um modo raso, apressado, agilizando dinâmicas que são impossíveis, por isso, de convencerem. Vanessa é uma garota revoltada, porém, sua revolta é superficial e se encaminha a consequências nenhum pouco proporcionais. Enquanto isso, Diana é impedida de qualquer desenvolvimento por muito tempo, até que, quando assume de vez o volante de seu próprio filme, já é tarde demais. Pouco importa para Copeland e Liu estudar a personagem, a respeitar, tentando, quiçá, consolidar um arco para a sua existência. O que existe é um propósito dramático muito simples, mas que, por ser pessimamente orquestrado, torna-se simplório. Já os antagonistas não possuem motivações críveis, servindo meramente para o propósito de cenas de ação, que não são nem criativas o bastante e nem terríveis o suficiente, apenas ocas de estímulos.

Pelo contrário a uma ressignificação de prioridades, o desenho não sabe com o que se importar, muito menos como se importar com algo. Pois, em paralelo a tantas coisas que existem pela pura noção de existirem, também há uma rixa entre mãe e filha completamente perdida no meio dessa bagunça toda. Esse ponto de trama tange a expulsão de Diana de sua terra-natal, após ter ido com Trevor impedir ameaças externas – novamente, a cronologia é mal-resolvida na sua relação com o enredo da animação, porque Liga da Justiça: Guerra acontece no seu decorrer. Há, no entanto, um anseio dramático vigente que a obra nunca consegue concretizar, pois, sendo curto e grosso, é incompetente demais para isso. Em contrapartida a uma quantidade interminável de equívocos, um dos poucos bons momentos da animação é a reviravolta na personalidade do Minotauro, um dos tantos antagonistas que os personagens confrontam. Enquanto Trevor preparava-se para atacar a criatura, Diana interfere e consegue encerrar com a sua escravidão, referente a sua obrigação de proteger eternamente o Labirinto. Há uma graciosidade nessa quebra de correntes – um propósito para a missão da Mulher-Maravilha que a distinguiria de outros heróis -, contudo, que posteriores momentos do desenho não continuam. No restante, a personagem é usada somente para fins de vendas, num longa criado de maneira automática, sem ter essência e sem causar maravilhamento.

Mulher-Maravilha: Bloodline (Wonder Woman: Bloodlines)  – EUA, 2019
Direção: Justin Copeland, Sam Liu
Roteiro: Mairghread Scott
Elenco (vozes): Marie Avgeropoulos, Kimberly Brooks, Ray Chase, Rosario Dawson, Jeffrey Donovan, Michael Dorn, Mozhan Marnò, Adrienne C. Moore, Cree Summer, Courtenay Taylor, Nia Vardalos, Constance Zimmer
Duração: 83 min.

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