Home QuadrinhosOne-Shot Crítica | Mulher-Maravilha: Terra Um – Volume Dois

Crítica | Mulher-Maravilha: Terra Um – Volume Dois

por Ritter Fan
952 views

O primeiro volume de Mulher-Maravilha: Terra Um foi uma gostosa viagem pela Era de Ouro da super-heroína repaginada para os dias de hoje com uma pegada surpreendentemente simplificada – mas não boba – de Grant Morrison, roteirista notoriamente conhecido por abordagens mais complexas e diferentes. E, como salientei na crítica, vi essa escolha do autor com bons olhos o que resultou, também muito graças à magnífica arte de Yanick Paquette, uma graphic novel mais do que recomendada que reapresentou a Mulher-Maravilha nessa linha editorial lenta, mas que costumeiramente traz excelentes obras.

No segundo volume, continuação direta do primeiro, a Amazona que se tornou embaixadora entre o paraíso de mulheres imortais onde vivia e o “Mundo do Homem” continua seu trabalho para empoderar as mulheres seja facilitando que elas galguem as mais diversas posições em um mundo claramente paternalista, seja literalmente usando seus poderes e habilidades para diminuir as injustiças. Mas é claro que o Homem – e aqui quero mesmo dizer o ser do sexo masculino – não quer perder sua posição de dominação total e vê as investidas da Mulher-Maravilha com muita desconfiança, com planos em movimento para minar as atividades da super-heroína.

Para tornar esse jogo possível, Morrison faz um leve retcon, revelando que Amazonia fora invadida por forças nazistas durante a Segunda Guerra, com a Rainha Hipólita e suas amazonas rechaçando o ataque com facilidade e “adotando” a super vilã Uberfraulein – criada para a graphic novel – como um projeto pessoal de transformação em alguém que enxerga o erro de suas atitudes. Essa inserção retroativa, depois que ela ganha primeiro plano no início da HQ, passa a funcionar em segundo plano apenas seguindo um caminho razoavelmente óbvio para qualquer leitor com um mínimo de traquejo em quadrinhos. Mas a obviedade não é o problema aqui, porque o foco é mesmo na Mulher-Maravilha no presente tendo que enfrentar outro vilão, este tirado da HQs clássicas da personagem: o Doutor Psycho ou, pelo menos, uma nova e repaginada versão dele como um homem machista ao nível caricatural que usa seu “charme” para manipular mulheres a fazer literalmente o que ele quiser.

Este é o elemento que me causou espécie, para dizer a verdade. A objetividade narrativa de Morrison cria, aqui, um problema que inexistia na história inaugural, que é a construção de uma Mulher-Maravilha que parece ter acabado de deixar sua ilha paradisíaca, sem conhecer nada do “mundo real”. Se isso era perfeitamente razoável no primeiro volume, aqui a coisa muda completamente de figura, até mesmo pela elipse temporal que ele faz questão de mostrar que ocorreu, inevitavelmente fazendo-a amadurecer. Com isso, a forma como o Doutor Psycho se aproxima de Diana e a manipula profundamente parece simples demais, como se ela fosse até mesmo burra, para falar português claro sem floreios. E o mais incômodo é que se torna necessária a intervenção de Steve Trevor – novamente não fazendo mais do que uma ponta – para que ela percebesse que estava sendo enganada, o que derruba toda a construção da heroína até aqui (e que lembra o final do primeiro longa solo da personagem).

Além disso, esse volume parece muito claramente um “volume do meio”, ou seja, que existe unicamente para fazer a ponte entre o primeiro e o terceiro que fecha a história como um todo (pelo momento ao menos). Se “histórias do meio” são realmente complicadas justamente por serem o que são, as melhores são aquelas que fazem todo o esforço possível para serem autocontidas, mesmo que deixem as até necessárias pontas soltas para seu encerramento. Infelizmente, porém, Morrison não tem esse cuidado e descaradamente coloca o plano que Maxwell Lord apresenta envolvendo o Projeto A.R.E.S. fica completamente no ar, sem sequer algum tipo de desenvolvimento maior do que algumas imagens aqui e ali para servirem de teaser.

Se o roteiro deixa a desejar, a arte do canadense Yanick Paquette novamente arrasa. Não só ele continua a enquadrar suas páginas com belíssimas e sofisticadas molduras, como ele esbanja cuidado nos figurinos variados da Mulher-Maravilha, inclusive uma burka-maravilha, além de belas sequências de ação como mais uma vez a heroína salvando Steve Trevor da morte certa. É um prazer enorme apreciar, página a página, o trabalho do desenhista que captura a essência da personagem e de suas histórias clássicas com absoluta perfeição.

O segundo volume de Mulher-Maravilha: Terra Um é, apesar dos problemas, uma boa história. Ela só decepciona de verdade em comparação com o primeiro volume, muito superior a este aqui que é, muito claramente, uma preparação para o terceiro e derradeiro capítulo.

Mulher-Maravilha: Terra Um – Volume Dois (Wonder Woman: Earth One – Volume Two, EUA – 2016)
Roteiro: Grant Morrison
Arte e capa: Yanick Paquette
Cores: Nathan Fairbairn
Letras: Todd Klein
Editoria: Eddie Berganza, Andrew Marino
Editora original: DC Comics
Data original de publicação: 09 de outubro de 2018
Editora no Brasil: Panini Comics
Data de publicação no Brasil: maio de 2020
Páginas: 129

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais