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Crítica | Nação Fast Food – Uma Rede de Corrupção

Não coma hambúrgueres.

por Kevin Rick
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Eu tenho dificuldades com filmes de denúncia que são gritantemente explícitos. O conteúdo acaba ficando óbvio ou superficial demais, martelando e mastigando suas críticas para a audiência como se o espectador não pudesse interpretar uma mensagem. Poucos artistas conseguem lidar com os didatismos de filmes assim, como, por exemplo, Adam McKay e suas sátiras da estupidez coletiva, ou então o fantástico Spike Lee e sua filmografia cheia de críticas sociais, sendo que até os dois cineastas erram a marca em alguns longas.

Richard Linklater se depara com esse desafio em Nação Fast Food – Uma Rede de Corrupção, uma obra que critica a indústria de comida processada, mais especificamente as empresas de fast food, com alfinetadas direcionadas ao McDonald’s, através de diferentes indivíduos que são pegos na cadeia produtiva do abatedouro. Baseado em um livro de não-ficção de Eric Schlosser, o roteiro de Linklater é uma investida corajosa, adaptando uma investigação jornalística em ficção. Tentando subverter o estilo documentarista que faria mais sentido para o material original, o cineasta explora sujeitos à frente do organismo, como são engolidos pela máquina, e como todos (inclusive a audiência) têm participação na chacina.

Até certo ponto, Linklater encontra sucesso na proposta. De Don Anderson (Greg Kinnear), o diretor de marketing do Mickey’s, uma cadeia de restaurantes de fast food de hambúrguer, até famílias mexicanas que trabalham ilegalmente em uma unidade de processamento de frigoríficos, a narrativa é basicamente um compilado de histórias que formam um mosaico do funcionamento sistemático. De certa forma, Nação Fast Food continua sendo quase um documentário, mostrando para o espectador os processos ilícitos e nojentos, e a crueldade animal que levam a carne para nossas bocas, mas o roteiro cria rostos para as críticas. Não está apenas explicando a mensagem, e sim compondo o cenário com personagens que vivenciam esses dramas de perto.

Essa é, talvez, a melhor forma de equilibrar denúncia com Cinema, trazendo o lado humano e utilizando-se de perspectivas pessoais para trabalhar um quadro maior sem cair em comentários evidentes demais. Linklater oferece ao espectador empatia para além da mensagem, indivíduos para além da reportagem. Como sempre, o cineasta tem ótima percepção de histórias cinematograficamente humanas, dando à obra um estilo íntimo e uma cadência melancólica, e também fazendo com que as críticas direcionadas aos EUA e sua indústria alimentícia ganhem camadas globais, sobre aqueles explorados, sobre os que exploram e principalmente sobre os que preferem ignorar a exploração, felizes em abocanhar o Big Mac no final de semana.

O filme acaba se tornando uma crítica sobre a máquina do capitalismo como um todo e a alienação popular que mantém as engrenagens funcionando, com as várias histórias paralelas se conectando mesmo sem interação. Para bem ou para mal, essa abordagem tem seus limites narrativos, com núcleos de personagens sem desfechos, pouca substância dramática, uma montagem cansativa e um ritmo dilatado. Se você está afim de ser confrontado, porém, há reflexão e culpa na experiência. As obviedades estão lá, com a mensagem central da obra sendo capturada nos primeiros minutos, mas isso faz parte do caráter de denúncia. Linklater só espera que haja autocrítica para além dos julgamentos.

Com exceção dos didatismos, diria que meu único problema com o filme está na sensação de que algumas críticas ficam numa superfície segura. Talvez seja subjetivo demais, mas fiquei com a impressão de que Linklater poderia ter ido mais fundo, cutucado mais a ferida. Mas a polêmica, provavelmente, não é tão importante para a produção quanto o lado humano neste meio. E, bem, assistir Nação Fast Food – Uma Rede de Corrupção e não sentir imediato nojo de hambúrgueres é praticamente impossível, então a obra atinge seu objetivo principal.

Nação Fast Food – Uma Rede de Corrupção (Fast Food Nation) – EUA, 2006
Direção:
 Richard Linklater
Roteiro: Richard Linklater (baseado no livro Fast Food Nation, de Eric Schlosser)
Elenco: Patricia Arquette, Luis Guzmán, Ethan Hawke, Ashley Johnson, Greg Kinnear, Kris Kristofferson, Catalina Sandino Moreno, Ana Claudia Talancón, Wilmer Valderrama, Bobby Cannavale, Paul Dano, Aaron Himelstein
Duração: 112 min.

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