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Crítica | “Norman Fucking Rockwell” – Lana Del Rey

por Handerson Ornelas
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Lana Del Rey sempre foi uma artista que apresentou um talento e uma visão musical interessantíssima, sabendo se aproveitar do emergente apelo indie pelo retrô e vintage. No entanto, parecia se perder um tanto nessa fusão pop de elementos modernos e retrôs em seus álbuns. Não que ela não tenha lançado bons trabalhos. Seu disco de estreia, mesmo que irregular e imaturo, é um bom debut, seguido de um sophomore album (Ultraviolence) de boas intenções, mas meio mal produzido. O EP ParadiseHoneymoon haviam mostrado o ápice de frescor criativo e interpretativo da cantora, que, em seguida, voltou a cair de qualidade em seu pior e mais incoerente álbum, Lust For Life.

E agora em seu quinto álbum, Norman Fucking Rockwell, Lana parece atingir seu ápice de maturidade e desenvolvimento artístico. Se trata de um balanceamento perfeito das influências que a cantora sempre buscou incorporar em suas canções: aquele clássico cantar sedutor típico de Nancy Sinatra temperado com instrumentais mesclando beats modernos com vibe sessentista e letras sobre o sonho americano na costa oeste. Mas aqui Lana soa bem mais livre e comedida, se apoiando também em uma base instrumental mais orgânica. Pegue qualquer canção de Ultraviolence e compare a interpretação da cantora naquele tempo e agora em NFR. Perceberá como Lana evoluiu seu cantar, interpretando agora suas canções de maneira bem mais sutil e leve comparado a seu costumeiro abuso um tanto teatral de sedução em sua voz.

Lana libera citações a suas influências por toda parte. Em somente uma música a cantora consegue citar The Beach Boys, Kanye West e Bowie, além de Led Zeppelin e Crosby, Nash & Young em outras, artistas que embora soem completamente divergentes, demonstram um grande impacto nas formas sutis da cantora abordar sua música neste disco. Isso sem mencionar o título do álbum, que cita justamente uma grande influência artística, o ilustrador e pintor Norman Rockwell, que se imortalizou por buscar refletir em suas obras a cultura americana. É basicamente o que Lana tenta estabelecer em sua música: um imaginário do sonho americano um tanto contemplativo e irrealista, mas não menos poético, colecionando aqui algumas de suas melhores letras.

Jack Antonoff assina aqui uma das melhores produções de sua carreira. A escolha do álbum por um clima mais acústico do que dos trabalhos anteriores permite um cuidado especial com a sonoridade de cada instrumento. A guitarra de The Greatest carrega um frescor setentista que muitos tentam e poucos conseguem reproduzir com tanta autenticidade. O combo de singles Mariners Apartment Complex e Venice Bitch, os primeiros liberados, já ditavam esse brilhante trabalho instrumental. A primeira carrega uma melancolia quase palpável através do trabalho conjunto da guitarra e do piano como base para um dos melhores usos de vocais de Lana, arranjados de diferentes formas e personalidades, trazendo um ar dinâmico à canção. Quanto ao vocal, o mesmo pode ser dito de Venice Bitch, a canção mais surpreendente que ouvi da artista até hoje, com uma interpretação angelical simplesmente apaixonante por cima de texturas nostálgicas e um devaneio psicodélico com tons de desert rock, uma pacote de memórias guiadas por uma experimental catarse guitarrística de mais de 5 minutos (dos 9 minutos de canção).

O piano, onipresente por todo o disco, soa como um parceiro de bar acompanhando todos os contos da cantora, se tornando quase um personagem. A doçura da magnífica Bartender parece incorporar ares de Brian Wilson e Joni Mitchell com a personalidade própria sedutora de Lana. Love Song é um grande clichê de canção romântica, mas conquista por uma sincera e impecável interpretação da cantora junto ao crescimento do arranjo, passando uma belíssima sensação sonora de efemeridade daquele amor cantado. California soa como uma faixa de Ultraviolence, só que feita com uma boa produção e uma construção de arranjo que escalona exponencialmente em um refrão cada vez mais bombástico.

Norman Fucking Rockwell é extremamente coeso e bem estruturado, algo cada vez mais raro acertar no meio das atuais propostas de longos álbuns pop. Praticamente passa ileso de problemas, há apenas duas leves quebras de ritmo no disco: Doin’t Time parece deslocada de tudo, com beats que estreitam relação com discos anteriores e se afastam da proposta mais intimista desse álbum, soando como algo saído talvez do Lust For Life. Ainda assim, se trata de um bom cover, um single com cara mais comercial. O outro é hope is a dangerous thing for a woman like me to have – but I have it (ufa, que título!), que fecha o álbum soando como uma faixa bônus, uma demo mal acabada e crua demais. Se trata de uma faixa decente, mas que quebra o clima da ótima música anterior, Happiness Is a Butterfly, que funcionaria muito melhor como faixa de encerramento.

É interessante observar a evolução artística de Lana Del Rey. Alguém com o respaldo na indústria, visão, talento e conhecimento musical como o dela era apenas questão de tempo até lançar o famoso “trabalho definitivo” de sua carreira. E, a julgar pelas declarações da cantora, que já prevê lançamento de um novo disco para ano que vem, podemos ainda estar diante de obras ainda melhores e mais surpreendentes. De qualquer forma, o feito de Lana em seu sexto álbum de estúdio já demonstra o tamanho da artista que estamos acompanhando.

Aumenta!: Venice Bitch
Diminui!:
 Doin’ Time

Norman Fucking Rockwell
Artista: Lana Del Rey
País: Estados Unidos
Lançamento: 30 de agosto de 2019
Gravadora: Interscope records
Estilo: Folk, trip hop, pop

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