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Crítica | O Assassino Mora no 21

por Luiz Santiago
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Muito se fala que O Assassino Mora no 21 foi “a estreia de Henri-Georges Clouzot no cinema“, mas isto não é bem verdade. Sua estreia aconteceu de fato em 1931, com o curta-metragem O Terror de Batignolles, uma comédia que tem como princípio um assalto que dá errado. Nos anos seguintes, o jovem cineasta dividiria a cadeira de direção em duas ocasiões, a primeira com Joe May, na condução de Tudo Por Amor (1933) e a segunda com Karl Hartl, na condução de Capricho de Princesa (1934). Após essas três experiências, Clouzot demorou oito anos até que voltasse a filmar. E desta vez veio sozinho, num longa-metragem que adapta a obra L’assassin Habite au 21 (1939), de Stanislas-André Steeman.

À parte as curiosas semelhanças do enredo (provavelmente vindas também do original) com O Enforcado de Saint-Pholien (1931), de Georges Simenon, a obra nos traz um grande frescor, para a época, na abordagem dramática em uma investigação de assassinatos em séries, nesse caso, em Paris; todos eles “assinados” por um tal de Monsieur Durand. O mais interessante é que O Assassino Mora no 21 é a sequência de O Último dos Seis (1941), adaptação feita por Clouzot do livro Seis Homens Mortos (1931), também de Steeman, mas dirigida por Georges Lacombe. Mesmo trazendo alguns personagens de volta e trabalhando com uma atmosfera previamente construída, o diretor conseguiu um resultado muito bom, mesmo insistindo nos pequenos números musicais, entoados por Mila, personagem de Suzy Delair.

Dominando muito bem a câmera e mostrando de forma interessante e criativa as sequências que terminam em assassinato (lições bem observadas do Realismo Poético na representação em chiaroscuro da cidade e da sujeira de algumas almas), o diretor consegue rapidamente estabelecer a ameaça que divide a opinião dos cidadãos — alguns acham que as notícias sobre um serial killer são um truque para vender jornal — mas o roteiro não dá atenção direta para o grande problema já na primeira metade da fita. O texto procura mostrar o comportamento incomum do detetive, criar um forte espaço cômico relacionado à própria investigação e só então, já durante a estadia do Inspetor Wens (Pierre Fresnay) no hotel Mimosas, é que firma os pés nessa abordagem mais escrupulosa, sempre trazendo os problemas da cidade para dentro dos quartos, salas e delegacias, o que não dá apenas uma falsa sensação de proteção para esses personagens, como também intensifica a impressão teatral que o diretor dá ao filme.

O que faz O Assassino Mora no 21 realmente funcionar, apesar da personagem de Suzy Delair, é a forma como o humor tempera o suspense. O texto cria suspeitos que desdenham da investigação e que até chamam a atenção para si mesmos, como se isso não fosse nada demais. A partir de um determinado momento, a trama fica deliciosamente intricada, com muitas possibilidades para quem poderia ser o assassino e para as motivações que impulsionariam cada um. Um maior foco no desenvolvimento desse lado e um menor mergulho nos espetáculos dentro do filme faria a obra fluir melhor e nos levaria com melhor ritmo para o surpreendente final, que mais uma vez brinca com a composição íntima SPOILERS! dos vilões, tornando-os meio bobos e irreais, embora isso faça parte do charme, proposta e recorte da obra. Uma instigante investigação conduzida por um diretor que se tornaria referência nesse tipo de filme, não só na França (muito bem acompanhado por Claude Chabrol) mas em todo o mundo.

O Assassino Mora no 21 (L’assassin habite… au 21) — França, 1942
Direção: Henri-Georges Clouzot
Roteiro: Henri-Georges Clouzot, Stanislas-André Steeman (baseado na obra de Stanislas-André Steeman)
Elenco: Pierre Fresnay, Suzy Delair, Jean Tissier, Pierre Larquey, Noël Roquevert, René Génin, Jean Despeaux, Marc Natol, Huguette Vivier, Odette Talazac, Maximilienne, Sylvette Saugé, Louis Florencie, André Gabriello, Raymond Bussières, Antoine Balpêtré, Paul Barge, Léon Belières, René Blancard, Daniel Gélin, Lucien Blondeau
Duração: 84 min.

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