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Crítica | O Bem-Amado (1980) – 1X01: A Ressurreição de Odorico Paraguaçu

por Ritter Fan
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Bem-vindos ao Plano Piloto, coluna dedicada a abordar exclusivamente os pilotos de séries de TV.

Número de temporadas: 5
Número de episódios: 220
Período de exibição: 22 de abril de 1980 a 9 de dezembro de 1984
Há continuação ou reboot?: Sim. A série já é uma continuação da novela O Bem-Amado, que foi ao ar entre 22 de janeiro e 3 de outubro de 1973, com 178 capítulos. Houve um reboot homônimo em forma de filme em 2010 e uma versão do filme em minissérie de quatro capítulos que foi ao ar entre 18 e 21 de janeiro de 2011. Há uma telenovela mexicana de 96 episódios que adapta o material base de Dias Gomes chamada El Bienamado e que foi ao ar entre 23 de janeiro e 4 de junho de 2017.

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Botando de lado os entretanto e partindo pros finalmente, O Bem-Amado, novela baseada em peça teatral de Dias Gomes de 1962 (conhecida por três títulos, O Bem-Amado, Odorico, o Bem-Amado e Os Mistérios do Amor e da Morte) foi e continua sendo uma das mais importantes da teledramaturgia brasileira. Primeiro, por um fundamental aspecto técnico: foi a primeira a ser produzida e transmitida em cores, começando em janeiro de 1973 e acabando em outubro do mesmo ano, depois de 178 capítulos. Segundo, porque, emboramente tenha ido ao ar durante a Ditadura Militar e tendo como como mote o ferrenho tom acusatório destabocado em relação ao status quo da época, com os políticos e a politicagem sendo alvo de ironias desaforistas e subversentas, a obra sofreu pouco nas mãos da censura. E é claro que a novela em si se sustenta pelos seus méritos próprios, com um elenco invejável encabeçado por Paulo Gracindo como Odorico Paraguaçu, prefeito corrupto e imoral de Sucupira, fictícia cidade do litoral baiano, que tem como objetivo de vida fazer os providenciamentos inauguratícios do cemitério da cidade, tarefa tornada impossível pela “falta de mortes” e também por Lima Duarte como o jagunço religioso José Tranquilino da Anunciação, mais conhecido pela alcunha Zeca Diabo, além de um sem-número de outros que marcaram época.

Mas, como é sabido de Vossas Senhoricências, o sucesso foi tanto que, nada menos do que sete anos depois do fim de O Bem-Amado, depois de uma longa confabulância sigilenta nos bastidores da Globo, a novela foi revivida na forma de série televisiva (ou seriado, como era a nomenclatura da época) que foi ainda mais longeva, com nada menos do que 220 episódios transmitidos ao longo de cinco anos. E eu disse “revivida” propositalmente, pois, ao final da novela, o funéreo cemitério é realmente inaugurado, mas, em razão justamente da morte do prefeito pelas mãos de Zeca Diabo, ironicamente contratado pelo prefeito para apenasmente suicidar alguém. Ou seja, o protagonista e grande atração da novela estava morto e continuar a narrativa seria um desafio. Mas claro que não foi e a solução foi simples e direta: tudo não passou de um plano mirabolante e Odorico estava vivinho da silva, com o início do mais do que descritivo A Ressurreição de Odorico Paraguaçu mostrando o prefeito saindo de sua cova e retomando seu ofício como se nada tivesse acontecido.

Uma artimanha narrativa para o prefeito mais artimanhoso que já viveu? Com certeza. Mas quem liga para isso? O importante é que, sem diversionismo desgastativo, Odorico estava vivo e que o saudoso Paulo Gracindo poderia mais uma vez vestir os ternos impecavelmente bregas do prefeito e falar suas barbaridades inimitáveis, com direito ao uso muito próprio e delicioso da língua portuguesa, ou seja, tudo estava armado para mais O Bem-Amado. E o melhor é que a coisa não parou com Gracindo, já que todo o elenco – ou quase todo – retornou a seus respectivos papeis, com novos personagens sendo introduzidos na medida em que a série progredia.

O primeiro episódio, portanto, é despido estripitisicamente de complexidades, servindo para fazer o básico, ou seja para reapresentar Odorico, que vem de branco que é pra ser mais claro, não exatamente para uma nova geração, mas sim para aqueles que, à época, já haviam esquecido um pouco do melhor político fictício do Brasil (que, claro, perde de longe para os reais tanto da época, quanto de hoje em dia…). O protagonista (ou seria antagonista?) retorna de seu estado de defuntice compulsória e a narrativa desse recomeço lida não somente com esse artifício, já que ele é logo absorvido pela população local depois que Odorico diz que foi um atentado inescrupulento e traiçioneiro, mas também com o sumiço de Zeca Diabo que, porém, surrealmente reaparece como um turista viajando com sua família. Melhor dizendo, Lima Duarte reaparece vivendo esse outro personagem que, “por acaso” é exatamente igual ao cangaceiro redimido que rezava para Santo Padim Pade Ciço Romão Batista com aquela voz miúda que só o ator conseguia fazer e, claro, é imediatamente confundido e preso, gerando uma confusão dos diabos (com trocadilho).

É um reinício muito trepidante e dinamitoso que recoloca todas as peças da novela novamente no tabuleiro e estabelece um mistério que não é resolvido de imediato, além de outros “sumiços” também serem utilizados, mais para a frente, como gatilho narrativo, como, por exemplo, o de Dirceu Borboleta, vivido brilhantemente por Emiliano Queiroz, foco já do episódio seguinte. Entretanto, vê-se já aqui nesse início os contornos do que seria a estrutura da série pranfentemente, ou seja, o caso da semana, com cada problemática ganhando uma solucionática imediata e simples, ainda que não menos divertida.

Não obstantentemente, a meticulância do trabalho de Dias Gomes, mais uma vez em plena democratura, demonstra que mesmo partindo de uma ideia desapretechada de sensatismo, a série foi digna da merecedência de uma vida longa que, ainda que olhando pratrasmente na construção de histórias, novamente entrou para os anais e menstruais da história da dramaturgia brasileira. Talqualmente a novela de 1973, O Bem-Amado de 1980 lava e enxagua a alma dos brasileiros e de todos os cachacistas juramentados, deixando todo mundo da época e também de hoje em dia com cara de seu-Malaquias-cadê-minha-farofa.

O Bem-Amado (1980) – 1X01: A Ressurreição de Odorico Paraguaçu (Brasil, 22 de abril de 1980)
Criação: Dias Gomes
Direção: Régis Cardoso
Roteiro: Dias Gomes
Elenco: Paulo Gracindo, Lima Duarte, Ida Gomes, Dirce Migliaccio, Yara Côrtes, Carlos Eduardo Dolabella
Duração: 30 min.

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