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Crítica | O Capelão das Galeras

por Iann Jeliel
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O Capelão das Galeras

O Capelão das Galeras é p vencedor do Oscar honorário de Melhor Filme Estrangeiro de 1947. Trata-se de um gospel disfarçado de biografia, em que o biografado é um dos maiores nomes da história da igreja católica, São Vicente de Paulo, também conhecido como Papa Clemente XII, sacerdote responsável por salvar várias vidas nos tempos sombrios dominados pela peste negra no início do século XVII.

A trajetória dramática do filme busca uma valorização da figura central, tal como de sua ideologia, que acreditava estar à frente da doença que assolava a época e que milagrosamente não se contaminou, um fato referenciado simbolicamente por influência divina e que o filme usará como recorte histórico para explorar a construção da fé de seu protagonista, junto à dimensão do acreditar também do público sobre o que ele possa fazer com essa fé. Sim, estamos falando de uma biografia do cinema francês da década de quarenta, mas a construção dramática da narrativa segue princípios bem acessíveis e busca se comunicar com o espectador por meio de seu próprio exercício de fé diante da fidedignidade da história. E isso é muito bem colocado pelo diretor Maurice Cloche, porque ele segue a escola de Jean Renoir a respeito de um cinema extremamente naturalista, ou seja, calcado na naturalidade de seus elementos cênicos, de modo a tornar os eventos ali orquestrados tão realistas que nem parecem ser um filme.

Alie essa naturalidade da mise-en-scène a um roteiro que se preocupa a mencionar, explorar e expor as fragilidades emocionais e morais de seu protagonista, e Cloche consegue humanizar o caráter docente da sua história. Tudo parece fazer parte de um mesmo bolo, que também possui uma parcela gratificante de sensibilidade ao tornar as cenas mais explícitas nos ensinamentos religiosos, tais como as cenas de explosões comportamentais em uma etapa da jornada dramática biográfica. Nesse sentido, talvez o filme perca pontos por adotar uma estrutura para lá de convencional, mesmo escolhendo um recorte específico. É tudo muito linear, o que dentro dessa proposta naturalista acaba se tornando episódico, com vários bons episódios, é verdade, mas como uma sequência de colina, cheia de picos e depressões, inflando o filme que não tem a proposta de ser uma biografia de caráter épico com início, meio e fim da carreira do padre.

Essas barrigas, no entanto, nunca parecem tomar conta da relevância do estudo de personagem que é movimentado, no fim das contas, por esses microconflitos sendo colocados e afetando crescentemente a saúde mental do protagonista e seu dilema de querer salvar todos ao passar dos anos. O discurso do filme nesse ponto atravessa o caráter religioso e passa a se relacionar com um drama da universalização da empatia. Até onde dá para se sacrificar em prol do outro? A câmera de Maurice é precisa nos entrecortes de planos abertos para mostrar o quanto existe um caos ao redor de Vicente de Paulo, para depois fechar o plano em sua face angustiada sobre aquilo que acabará de ver e vai acumulando junto a outros que acreditam na sua figura e o cobram também por ajuda. Ou seja, o filme deseja a todo momento que você nunca esqueça esse dilema e o que o motiva a escolher a empatia.

Portanto, até nos momentos mais morosos, a estrutura do naturalismo junto à narrativa convencional de conversão de fé nunca deixa o público e o protagonista confortáveis, o que valoriza o longa enquanto drama também. Independentemente do caráter católico, o grande valor de O Capelão das Galeras está no drama humano por trás da figura e o que o motivou a escolher seu caminho, o que mais importa é o que esse caminho lhe proporcionou em atitudes. É um jeito honesto e decente de colocar o catolicismo, com um de seus grandes símbolos, como o bonzinho, uma vez na história.

O Capelão das Galeras (Monsieur Vincent | França, 1947)
Direção:
 Maurice Cloche
Roteiro: Jean Bernard-Luc, Jean Anouilh
Elenco: Pierre Fresnay, Aimé Clariond, Jean Debucourt, Lise Delamare, Germaine Dermoz
Duração: 111 minutos

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