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Crítica | O Destino de Júpiter

Um manifesto aos moldes do blockbuster dentro do blockbuster.

por Davi Lima
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O anti-mercado já está na trama de Destino de Júpiter, e de certa forma a maneira como as irmãs Wachowski engajam isso na Space opera tem um vínculo de resistência, basta ver a  plasticidade dos efeitos visuais e trilha sonora empurrando o  conteúdo da obra. No entanto, apesar dessa pretensa virada de chave, de elaborar uma trama minuciosa sobre o sci-fi mais novelesco a partir da síntese clássica; a direção parece seguir uma linha “georgelucasiana ” dos filmes prelúdios de Star Wars, propondo menos valor de atuação, ao mesmo tempo que precisa dos intérpretes para conectar a complexa trama familiar, submergindo os mais sinceros textos humanistas, românticos e temporais.

Há um didatismo das irmãs Wachowski que elas já treinaram para interpelar o público sobre suas críticas ao método do cinema blockbuster. De certa forma, há um cálculo das diretoras em “desperdiçar” dramaticamente o filme em prol de um conflito de ideias simples, sobre o que é comunidade, consumismo e posse. Mas essas linhas não são tão senso comum e “universais” como a sinceridade do texto parece dialogar com o espectador. Diferente de Matrix e Speed Racer, que tinham a filosofia e o “orientalismo ocidentalizado” mediados pela ação e tecnologia como apetrecho comunicativo, ou diferente de Speed Racer que se expunha ao lúdico, ao familiar e a computação gráfica como velocidade formal sobre a crença das imagens; Destino de Júpiter busca engajar o anti-blockbuster ao  seu blockbuster como dialética, mas o gênero de Space opera talvez tenha suas limitações de efeito com essa dialética, ou simplesmente expõe alguns defeitos da direção.

As atuações nos filmes das Wachowski sempre eram compensadas pela montagem, pela simplicidade didática e comunicativa do roteiro que mesmo numa possível incompreensão dos detalhes da história, a ação e o CGI exagerado tratavam de efetivar gatilhos a que o espectador pudesse se apegar, dando tempo para desfechos dramáticos. Em Destino de Júpiter, o material de construção de universo depende muito dos personagens, porque além da trilha sonora e visual estonteante, o encaixe dos personagens, mesmo sendo superficiais – como nos prelúdios de Star Wars – precisam ser pontuais  nas alocações e dinâmica da montagem com os efeitos.

O personagem Caine, interpretado por Channing Tatum, parece facilmente posto entre as cenas de ação e, com objetividades dramáticas, pelo seu encaixe subserviente ao que a narrativa precisa, especialmente porque a base do personagem justifica a ausência de emoções . Enquanto isso, Júpiter (Mila Kunis), especialmente em seu papel diferencial de ser uma princesa clássica e moderna, acaba precisando reforçar suas atitudes e precisa ser a ponte de interpretação do roteiro para a trama acontecer. Várias vezes a montagem tenta se desvencilhar disso, mas a Space opera, necessitando de um  ar novelesco, quer um plano mais fechado que não permite fugir da atuação da atriz. Por mais que haja uma ironia na atuação de Kunis, parece contrariar as expectativas de uma atriz sensualizada nos blockbusters, colocando-a como uma posição de rainha em personalidade preguiçosa desde o início  até sua felicidade em ser proletária; não há elenco de apoio, muito menos disfarces de velocidade na trama ou conceitos do universo que suprimam a necessidade de uma atuação mais precisa da protagonista.

Star Wars tinha a religião fantasiosa da Força, tinha coadjuvantes; Guardiões da Galáxia tem o apelo musical além da trilha sonora instrumental e a comédia interativa; Destino de Júpiter tem sua linha anti-burocracia do mercado e a realeza do proletariado posto numa personagem que compõe essa dialética pouco comum em uma atriz dramaticamente questionável . Mesmo quando Mark Hamill e Carrie Fisher eram limitados no primeiro Star Wars, a jornada do herói e da princesa feminista sem superfícies políticas diretas tinham engajamentos comuns. Infelizmente, a agregação de Caine e Júpiter numa corrida contra a burocracia da protagonista reencarnada na mãe milenar da família Abrasax, que domina o universo intergaláctico, para ter o testamento da Terra não é uma história tão interessante que seja facilmente integrada à  Space opera.

Por fim, apesar da boa ausência de dramaticidade apelativa e falta de cinismo dentro de uma mínima ironia anti-blockbuster, usando o formato mercadológico dominante dentro da operística espacial de se fazer um gênero cinematográfico fundamentador de blockbusterStar Wars é um exemplo -; ainda assim,  o mais básico em quesitos imersivos, emocionantes e entendíveis, que uma boa direção de maneira geral garante, as irmãs Wachowski chegam no limite da mediocridade pelas pressões e modelagens criativas de se revolucionar o cinema hollywoodiano por dentro e efetivamente por fora, com o público. O Destino de Júpiter demonstra talvez um dos últimos manifestos mais claros às  imposições do cinema histórico do Destino Manifesto e do faroeste.

O Destino de Júpiter (Jupiter Ascending) – EUA, 2015
Direção:
 Andy Wachowski, Lana Wachowski
Roteiro: Andy Wachowski, Lana Wachowski
Elenco: Mila Kunis, Channing Tatum, Eddie Redmayne, Sean Bean, Douglas Booth, Tuppence Middleton, Nikki Amuka-Bird
Duração: 127 min.

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