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Crítica | O Enfermeiro da Noite

Promessa que acaba não sendo cumprida.

por Ritter Fan
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A escalação de Jessica Chastain e de Eddie Redmayne para viverem dois enfermeiros de um hospital de Nova Jersey, a primeira uma mãe solteira com problemas cardíacos e o segundo um serial killer que mata os pacientes foi muito interessante, não só por suas atuações, que são inegavelmente boas, mas não espetaculares, como, principalmente, pelo quanto os dois se parecem fisicamente. É como ver dois lados de uma mesma moeda, com dois personagens que convergem em absolutamente tudo – dedicação, eficiência e uma relação muito próxima de fidelidade e amizade entre eles – menos, claro, no terrível desvio psiquiátrico que leva um deles a ceifar a vida de pessoas completamente indefesas.

Outra qualidade da produção comandada por Tobias Lindholm (talvez mais conhecido pelos roteiros dos dolorosos A Caça e Druk – Mais Uma Rodada, que ele co-escreveu com Thomas Vinterberg) é a criação da atmosfera lúgubre do hospital e do drama pessoal de Amy Loughren (Chastain) que precisa esconder sua grave enfermidade para que ela tenha acesso ao seguro de saúde de seu emprego, algo que a coloca em constante estado de tensão psicológica, física e financeira, especialmente considerando as filhas pequenas que precisa cuidar sozinha. O roteiro de Krysty Wilson-Cairns (1917, Noite Passada em Soho), baseado em livro jornalístico de Charles Graeber é inteligente ao manter o foco em Amy, trazendo o experiente e recém-contratado Charlie Cullen (Redmayne), que passa a dividir com ela o antes solitário turno noturno, como um merecido e compreensivo alívio para suas mazelas diárias, o que torna ainda mais cruel a descoberta sobre o que ele realmente faz em seus sucessivos empregos.

É uma pena, porém, que o longa, depois de construir todas as suas angustiantes bases em seu terço inicial, dependa quase que exclusivamente da atuação da dupla principal em diálogos lentos e contemplativos que não carregam substância alguma. Isso acaba fazendo com que as tentativas para lá de surreais (ao ponto de serem pouco críveis) de Linda Garran (Kim Dickens), ex-enfermeira que, agora, é a gerente de riscos do hospital, de encobrir as mortes sejam a promessa não cumprida de um desenvolvimento narrativo mais relevante que alimenta a investigação policial da dupla formada por Danny Balwin (Nnamdi Asomugha) e Tim Braun (Noah Emmerich), mas nunca satisfaz realmente.

Não tenho ideia de como a enervante e inacreditável história real aconteceu, mas suspeito que Wilson-Cairns tenha tentado se manter fiel aos acontecimentos e isso acabou esvaziando o potencial do longa, de maneira não muito diferente de Cinco Dias no Hospital Memorial em que toda a construção inicial é demolida pelos acontecimentos seguintes que mais se assemelham àquela linha reta – ou flatline – dos monitores de hospitais quando um paciente morre ou está próximo da morte. Nem sempre a aproximação dos eventos verdadeiros beneficia uma obra de ficção, algo que poucos realmente compreendem considerando a constante cobrança de fidelidade que vemos por aí até mesmo de celebridades bem estabelecidas no mercado.

A bem da verdade, Lindholm até tenta extrair o máximo de Chastain e Redmayne, mas, assim como o roteiro, as atuações dos dois desgastam-se rapidamente na repetição e marasmo da história, algo que não é ajudado por um Redmayne que parece não encontrar completamente o tom de seu personagem para diferenciá-lo dos papéis de “gente estranha” que ele parece ser especialista em fazer sempre da mesma forma. Pelo menos Chastain realmente tem espaço para trabalhar e o drama pessoal de sua personagem é o que efetivamente segura a coesão do longa e clama pela atenção do espectador, sobrepondo-se até mesmo ao horror dos atos de Charlie que, vale dizer, nunca são abordados na dimensão que talvez fosse necessário para fazer do longa um true crime realmente marcante.

O Enfermeiro da Noite ensaia uma apresentação que nunca realmente faz e acaba desapontando com sua frieza e repetição, mas o horrível caso em si do enfermeiro assassino e as atuações da dupla principal – especialmente Chastain – como opostos que se atraem sustentam o longa por tempo suficiente para ele não se perder completamente. Creio ter faltado um pouco mais de tempero para um prato que acaba tendo mais aparência do que gosto, mesmo que, no final das contas, a experiência como um todo valha à pena nem que seja para conhecer mais um caso assustador de um serial killer real.

O Enfermeiro da Noite (The Good Nurse – EUA, 26 de outubro de 2022)
Direção: Tobias Lindholm
Roteiro: Krysty Wilson-Cairns (baseado em livro de Charles Graeber)
Elenco: Jessica Chastain, Eddie Redmayne, Nnamdi Asomugha, Noah Emmerich, Kim Dickens, Malik Yoba
Duração: 121 min.

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