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Crítica | O Esporte Favorito dos Homens

por Luiz Santiago
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Howard Hawks tinha a admirável capacidade de fazer cinema de entretenimento com conteúdo, uma característica que pode ser melhor percebida em suas comédias. Aparentemente despretensiosas, as comédias de Hawks trazem não epenas o riso e situações impagáveis envolvendo todo tipo de personagens, mas também um contexto e um conceito de humanidade em apuros e cheia de problemas para resolver que nos faz pensar de maneira divertida sobre a vida e o que faz parte dela.

O diretor sempre teve um grande fascínio pela personagem feminina no cinema, gênero que acabou sendo o verdadeiro objeto de suas comédias, basta lembramos de personagens como a de Katharine Hepburn em Levada da Breca; de Jane Russell e Marilyn Monroe em Os Homens Preferem as Loiras e de Paula Prentiss em O Esporte Favorito dos Homens. É impossível pensar tais tramas sem a presença dessas personagens, posto que são a alma e o conteúdo desses filmes, mas não só isso; é preciso também reconhecer a força e importância que os roteiros dessas obras dão às mulheres, mesmo que em um momento ou outro apareça alguma indicação machista, às vezes de forma proposital, às vezes como um sinal da época em que foram escritos.

O Esporte Favorito dos Homens é filme bastante especial nesse sentido, porque é a última comédia de Hawks, um filme da fase final de sua carreira e um exercício de louvor à mulher que só pode ser descrito em uma palavra: apaixonante. O roteiro conta a história de Roger Willoughby, autor de um livro reconhecido sobre pescaria e que trabalha em uma notável loja de pesca. Os problemas começam quando o patrão de Roger o inscreve em um concurso, a convite de uma pousada que tem a encantadora Abigail Page como gerente de negócios. O fato de Roger jamais ter pego um único peixe em toda a sua vida e a inflamável relação entre ele e Abigail são os detalhes que fazem a comédia acontecer e garantem a alta qualidade do filme.

As primeiras cenas já dão o tom do que seria todo o restante da obra. Hawks opta por planos mais curtos e mais próximos dos atores, dirigindo com elegância a chegada do protagonista ao seu trabalho. A apresentação, no entanto, é uma isca. Roger está em destaque e, de pronto, tomamos o seu partido contra a imprudência ao volante da motorista que o segue. Mas alguns minutos depois, quando vemos Abigail pela primeira vez, ficamos confusos. A postura dominante da bela jovem e a excelente interpretação de Paula Prentiss faz com que também tomemos o seu partido, e esse tipo de identificação para os dois lados – um artifício que Hawks era exímio em criar – torna natural o ponto romântico da fita.

Diferente das comédias românticas mais populares no cinema atualmente, o romance aqui não é o ponto que ocupa o maior espaço no filme. A comédia gira em torno de uma mudança de perspectiva da personagem principal e a sua relação com uma mulher que se impõe onde chega, e isso com a maior graça e delicadeza possíveis. Paula Prentiss estava no início da carreira, fazendo o seu 6º filme, mas como só atuara em comédias até então, manteve um ritmo e uma postura impecáveis, transitando entre a chefe, a amiga, a mulher sedutora, manhosa ou mandona com uma facilidade tremenda. Vale destacar ainda que o timbre contralto da atriz, bastante contrastante com o seu rosto delicado, adiciona uma aura ainda mais misteriosa e exótica à sua personagem.

Em todos os cenários de O Esporte Favorito dos Homens podemos observar o extremo cuidado dos diretores de arte e do diretor de fotografia em criar um ambiente aconchegante, visualmente limpo, mas composto por um grande número de objetos ou composição plural de elementos estéticos, como a combinação quase insana entre as cores dos figurinos e dos cenários, ao mesmo tempo que cada cor simbolizava um momento dramático das personagens, definiam parte de seu perfil psicológico e agiam como metáforas visuais na relação entre elas, basta observarmos a semelhança e o contraste de cores entre a primeira e a última parte da fita, tanto nos cenários quanto no guarda-roupa dos atores. Também a disposição de cada objeto e a dinâmica de movimentação dos atores em relação à câmera resultam numa mise-en-scène (e aqui uso essa palavra em seu sentido original, não genérico) elegante e muito agradável de ver, resultado de um trabalho perfeito de direção.

Com diálogos inteligentes, cenas hilárias, excelente música e boas atuações (com direto a um Rock Hudson parecidíssimo com James Stewart), O Esporte Favorito dos Homens fecha com chave de ouro o ciclo de comédias dirigidas por Howard Hawks, classificando-se como uma das obras que todo cinéfilo e todo fã de boas comédias deveria ver.

O Esporte Favorito dos Homens (Man’s Favorite Sport?) – EUA, 1964
Direção:
Howard Hawks
Roteiro: John Fenton Murray, Steve McNeil (baseado em The Girl Who Almost Got Away, de Pat Frank).
Elenco: Rock Hudson, Paula Prentiss, Maria Perschy, John McGiver, Charlene Holt, Roscoe Karns, James Westerfield, Norman Alden, Forrest Lewis, Regis Toomey, Tyler McVey, Kathie Browne
Duração: 120 min.

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