Home FilmesCríticasCatálogos Crítica | O Grande Mentiroso

Crítica | O Grande Mentiroso

E se a verdade for uma grande mentira que revela o real?

por Davi Lima
942 views

Mentiroso

Você pode acreditar em mim, a verdade é superestimada. – Marty Wolf

 

O que poderia ser uma comédia metalinguística de referências, se torna um comentário sobre como o cinema trabalha com a mentira das imagens, enquanto tenta buscar a verossimilhança. Não dependendo do roteiro como uma suposta alma de maior valor dentro de um filme, O Grande Mentiroso nasce de uma redação de colégio roubada, que pode virar roteiro de uma grande produção. Essa é a graça da mentira cinematográfica.

O diretor Shawn Levy (Uma Noite no Museu, Gigantes de Aço) busca destacar, com lentes deformadoras da imagem e em modelo videoclipe, o travestimento de sua obra com imaginação juvenil e transgressões temporais. Mas o que torna tudo mais interessante é como o longa trata o roteiro e o seu valor monetário atribuído ao mundo de Hollywood. Ele só alcança realmente a verdade que quer trazer quando o diretor se torna o objeto almejado, um macaco de pelúcia. A verdade acaba não sendo superestimada, como diz o filme, porque então não haveria cinema.

Constantemente mostra-se como é mais fácil mentir socialmente em Hollywood, enquanto mostra-se os bastidores dos estúdios, com atores vestidos para filmar. Aí também entra a magia manipuladora das situações de filme em paralelo, mostrando aspectos físicos e realísticos de Los Angeles enquanto Jason e sua amiga Kaylee fogem pelos camarins. É um drama que se passa enquanto a comédia usa da obsessão do filme, tornando o produtor em vilão, tanto por aspectos do politicamente corretos – pois o personagem Marty Wolf é racista e machista de maneiras bem indelicadas – quanto por subestimar a mentira do cinema que permite um garoto de 14 anos pular de um prédio e cair num colchão grande e azul.

Embora tenha referências cinematográficas que parecem mais recheio do que narrativa, é com uso de trilha sonora de outros filmes que vai demonstrando uma espécie de reciclagem de história clássicas, cenários de filmes já montados para contar outras histórias a quem conhece o manual do cinema – o tal possível filme paralelo que comentei. Exemplo disso é como a trilha de Tubarão é usada numa cena tensa para Marty (tornando-se cômica pela atuação de Paul Giamatti), com toda a interpretação de um ser execrável dentro da sociedade de aparências, o mundo do cinema. Por isso existe toda uma justificativa minimamente realista para se acreditar num resgate de helicóptero que acontece no meio de um deserto, porém utilizando-se de imagens que emulam um filme de suspense ou de ação.

No final, a escolha do filme é testar o espectador. Se a história ocorre por causa de um roteiro, por causa de um filho que precisava provar para o pai que ele poderia falar a verdade, o filme delimita finais antecipados para amenizar e organizar sua metalinguagem cômica e dramática, dando voz às pessoas que fazem a aventura ser possível. Ainda assim, mesmo que o filme pareça abrir mão de uma certa ousadia, comprova a realidade de um plano B com a irrealidade da imagem demonstrando que não importa o roteiro. É no aqui e agora da transmissão pela tela que a verdade impossível será entregue.

Por fim, O Grande Mentiroso, o filme dentro do filme, mostra que o gigante que destrói cidades está nas telas do cinema, mostrando que a verdade dessa arte não é superestimada por comprovação lógica, e sim no envolvimento emocional com a narrativa. Ela é esperta demais para jovens de 14 anos protagonizarem uma vingança e convencerem Los Angeles a ser um cenário de fato de um filme? Talvez. Mas é aí que se subestima o caráter reflexivo da arte banhada pela cultura popular. A diversão e o drama se encontram como qualquer manipulação assumida pelos realizadores, os verdadeiros envolvidos, os que agem de fato artisticamente e revelam que mesmo com todo o planejamento de um filme, é preciso antes acreditar nele, porque o roteiro mesmo, a redação, pode ser queimada ou improvisada.

O Grande Mentiroso (Big Fat Liar) – EUA, Alemanha, França | 2002
Direção: Shawn Levy
Roteiro: Dan Schneider, Brian Robbins
Elenco: Frankie Muniz, Paul Giamatti, Amanda Bynes, Amanda Detmer, Donald Faison, Sandra Oh, Russell Hornsby, Michael Bryan French, Christine Tucci, Lee Majors, Sean O’Bryan, Amy Hill, John Cho, Matthew Frauman, Don Yesso, Rebecca Corry
Duração: 88 min.

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais