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Crítica | O Paraíso da Serpente

por Roberto Honorato
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Filmes como O Paraíso da Serpente, carregados de alegorias religiosas, podem facilmente cair na armadilha de tentar criar paralelos narrativos de maneira superficial, introduzindo debates que não será capaz de desenvolver com a cautela exigida. Além de ter caído na armadilha, o longa de Bernardo Arellano parece tão perdido com os temas introduzidos que não é capaz de executá-los sem apelar para viradas da trama que destoam completamente do que o filme vinha apresentado.

Após sofrer um acidente em uma estrada no deserto, um homem é resgatado por um jovem vaqueiro chamado Sky, e seu avô, um treinador de galos de briga, que o levam para sua vila. Mesmo consciente, o estranho não parece se lembrar de sua identidade, mas ao passar os dias na pequena vila começa a conhecer os seus habitantes e inesperadamente realizar curas milagrosas, o que rapidamente lhe dá a fama de profeta. O homem pode não se importar com o título, mas as notícias não agradam nem um pouco o pároco da comunidade.

Há componentes chamativos logo de cara, como a ambientação na pequena vila e a ideia de explorar subtramas mais misteriosas, como uma peste, que atinge principalmente os animais. Essa proposta e o cenário desértico dão uma aparência quase distópica ao material, e poderiam contribuir até para um maior apelo visual; mas além da ideia ser abandonada ao longo do caminho, o que acaba se tornando a regra em certo ponto da rodagem do filme, por algum motivo o fotógrafo Damián Aguilar achou interessante investir no preto e branco, o que é uma decisão estranha e a obra tenta justificá-la em seus últimos minutos, quando já é tarde demais (e a justificativa não convence).

O longa aborda diversos temas, mas nenhum é tão evidente quanto a fé. E, assim como tudo nessa obra, a intenção é boa, e o roteiro procura explorar uma oposição ideológica, criando um debate entre as tradições dogmáticos da religião e uma abordagem mais naturalista. Em certo ponto, o estranho tem um embate com o pároco sobre a origem dos recentes milagres, e através dos diálogos podemos ver que o filme não procura uma crítica específica a alguma instituição, mas ao comportamento do ser humano, cada vez mais individualista. Mas ao tentar inserir subtramas inesperadas para elevar o drama e o mistério, o filme perde parte da pouca identidade que já tinha.  

Além de uma direção sem foco, a obra traz uma estrutura simples, mas repetitiva, reciclando os mesmos pontos ao longo do enredo, deixando tudo mais previsível do que deveria, sem contar as atuações pouco expressivas de um elenco não profissional. Essa abordagem não é nova, mas mesmo com as liberdades dadas pelo diretor para que os atores improvisem um pouco, chega a distrair a forma como parte do elenco parece estar tentando decorar suas falas, principalmente os três jovens que formam um triângulo amoroso em certo ponto (mais uma daquelas coisas que o filme tenta inserir e não explora). 

O Paraíso da Serpente compromete os poucos elementos que poderiam ser o diferencial da obra. Um filme que antes parecia um estudo sobre a fé em tempos de desalento acaba se rendendo à tentação de querer mais do que o necessário, e assim ficamos com uma obra perdida e cansativa. 

O Paraíso da Serpente (El Paraiso de la Serpiente) — Itália, México, EUA, 2019
Direção: Bernardo Arellano
Roteiro: Bernardo Arellano
Elenco: Angel Garnica Pérez, Sky Sangermani, Mariela Martínez Gómez, Fabricio Vergara, Jesús Ipalnemohuani
Duração: 93 min.

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