Home FilmesCríticas Crítica | O Projeto Adam

Crítica | O Projeto Adam

E os anos 80 ganham outro pastiche...

por Ritter Fan
7,8K views

O Projeto Adam é mais um filme construído sobre os alicerces da nostalgia pelas obras infanto-juvenis dos anos 80, como Super 8 e a série Stranger Things, só para citar talvez os dois melhores exemplos desta “categoria” audiovisual. Trata-se de uma ficção científica leve com viagem no tempo envolvendo um adulto (que parece uma criança) e uma criança (bem mais adulta que o adulto) que são a mesma pessoa e alguns momentos calculados para arrancar sorrisos, suspiros e, forçando muito a barra, lágrimas e talvez até mesmo, com esforço supremo, algumas risadas.

Porque sim, o filme de Shawn Levy, do recente e bem-sucedido Free Guy: Assumindo o Controle, também estrelando Ryan Reynolds, até tenta surfar na onda da nostalgia oitentista por filmes como E.T. – O Extraterrestre e De Volta para o Futuro, mas, em seu esforço para agradar todo mundo, acaba sendo uma cinética colcha de retalhos que não passa de um emaranhado genérico de sequências de ação com espasmos irregulares de drama coming of age e um inexplicável uso de Mark Ruffalo no elenco como o falecido pai do protagonista (ou devo usar plural aqui?), ator muito mais qualificado do que exige o roteiro hilariamente escrito por quatro pessoas (sério, quatro cabeças pensantes chegaram nesse resultado?). E o mais triste é que Levy já mostrou ter domínio sobre as relações pai e filho em filmes como Doze é Demais e Gigantes de Aço, que ele tem em seu currículo, mas que o roteiro não deixa ele usar de verdade.

A história é simples: Adam Reed, um piloto do ano distópico (mas que só é distópico porque dizem que é) de 2050 rouba um avião máquina do tempo e viaja até 2022, quando coopta seu eu de 12 anos (Walker Scobell) para ajudá-lo em sua missão de descobrir o que aconteceu com sua esposa Laura (Zoe Saldaña), enquanto tem que fugir da vilanesca Maya Sorian (Catherine Keener que aparece em duas versões, a atual e uma rejuvenescida com uma plástica CGI que se acha tão boa quanto às que a Marvel Studios vem fazendo) e seu inesgotável exército de Master Chiefs. É até uma premissa bacana, mas O Projeto Adam não tem foco algum e permanece muito mais preocupado em pular de cena genérica de ação em cena genérica de ação do que construir seus personagens, que também inclui Ellie Reed (Jennifer Garner), mãe viúva de Adam.

É como se os roteiristas (novamente, para que quatro???) tivessem pego algum Manual de Clichês e aplicado-os ao pé da letra no longa, sem acrescentar nada para torná-los relevantes e bem inseridos, já que o clichê faz parte natural de obras audiovisuais, só precisando ser trabalhado decentemente para funcionar. Tem o menino que sofre bullying na escola? Sim! Tem sua versão adulta que é uma metralhadora giratória de diálogos pseudo-engraçadinhos? Claro! Tem o terno contato da versão adulta do protagonista com sua mãe de 28 anos antes mesmo que pareça um episódio à parte dentro do filme? Ô, não poderia faltar! Tem a esposa durona deus ex machina? Mas como não teria? Tem o pai falecido que é visitado na época em que estava vivo e que parece um mendigo nerd? Não poderia faltar! Além disso tudo, tem os momentos copia e cola que servem de homenagem aos clássicos, como a sequência inicial que é quase quadro-a-quadro o começo de E.T. e toda aquela aura de O Último Guerreiro das Estrelas.

Mas não há ressonância, não há charme, não há nada além de um filme derivativo com computação gráfica minimamente boa, mas que privilegia o verbo e não a imagem. Com exceção do jovem Scobell, que mostra algum talento e vive uma versão de Ryan Reynolds que é melhor do que o Ryan Reynolds, o restante está no piloto automático. Menos Reynolds, claro, pois Reynolds não está no piloto automático, já que ele parece ser a própria encarnação do piloto automático. Sempre foi e, pelo visto, continuará sendo o cara bonitão, com algum carisma e “engraçaralho pra cadinho” que ninguém tem coragem de dizer para ele tentar fazer outra coisa (o pior é que, no começo de sua carreira, ele até tentava…). Encontrem uma diferença entre Adam Reed, Guy ou o ladrão daquela porcaria com a Mulher Maravilha e o Adão Negro – ou Deadpool, que seja – que não os figurinos e a barba por fazer e ganhem um doce! No caso de Ruffalo, coitado, chega a ser engraçado como ele parece querer se livrar de seu personagem o mais rapidamente possível, atuando na base do “deixa eu falar logo minhas linhas e em um take só, e olhe lá, porque eu tenho horário marcado com meu dentista para fazer canal”.

Em outras palavras, O Projeto Adam é uma casca vazia dos filmes que tenta emular e homenagear. É como aquela rosquinha sem recheio e dormida que você até acha gostosinha unicamente porque só vem comendo porcaria pior ainda há um bom tempo (ou porque você só gosta de rosquinhas assim, o que é preocupante…). Com base no que vi em Free Guy, achei que seria pelo menos uma experiência divertidinha, mas, na verdade, O Projeto Adam, de repente, faz Free Guy ser uma obra-prima, o que talvez tenha sido o plano de Levy desde o começo…

O Projeto Adam (The Adam Project – EUA, 11 de março de 2022)
Direção: Shawn Levy
Roteiro: Jonathan Tropper, T.S. Nowlin, Jennifer Flackett, Mark Levin
Elenco: Ryan Reynolds, Walker Scobell, Mark Ruffalo, Jennifer Garner, Catherine Keener, Zoe Saldaña, Alex Mallari Jr.
Duração: 106 min.

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais