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Crítica | O Solar Maldito

por Davi Lima
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Oh não, senhor. Se a casa morrer, eu morrerei com ela.

O que o diretor Roger Corman faz com O Solar Maldito – obra homônima de Edgar Allan Poe – é trabalhar na corda bamba entre o tosco e o suspense, duas coisas que juntas se destroem por afastar o espectador, mas o diretor articula a estranheza como trunfo, onde a casa dos Usher é um teatro de classe e morbidez.

Corman estabelece a chegada ao filme como algo desolador, um panorama de longa-metragem de terror que já quebra a expectativa quando o mordomo não quer que o protagonista entre na casa. A relação deles dois é de um nível de estranheza intrigante, do tirar das botas como regra da casa ao mordomo desaparecer do nada. Parece mesmo um espírito do que Edgar Allan Poe escrevera em sua literatura gótica, já que o filme evidencia o escritor como fato, naquele universo. Então, nessa estranheza meio infantil, o diretor consegue criar curiosidade quanto a casa, pois se na relação humana há uma peculiaridade, os cômodos são gravados como se tivesse impondo ao protagonista a fragilidade diante do grande casarão dos Usher.

Não bastasse a câmera dizendo algo nos movimentos abruptos e enfoques de suspense, as cores da casa que dão o sentimento completo de um ambiente vermelho, que são a preparação perfeita para o ator Vincent Price como Roderick Usher aparecer inesperadamente com trejeitos e cabelos loiros. O diretor usa o ator como base para exemplificar a dinâmica bizarra/elegante que o filme demonstra o tempo todo. Até nas portas há demonstração disso, quando o protagonista Philip Winthrop, no simples ato de abri-las, confunde de maneira recorrente se é para puxá-las ou empurrá-las. Isso também é evidenciado quando pequenos acidentes banais envolvendo uma lareira ou um caldeirão parece ser de grande e fervoroso perigo que, por sinal, acabam sendo flashfowards (pontos indicativos na narrativa do futuro da história) poderosos na trama.

Até mesmo na dinâmica dos personagens há uma complementação da narrativa de mistério e descoberta. O personagem de Vincent Price representa o suspense e ao mesmo tempo a entrega da história misteriosa dos Usher, enquanto o protagonista se mostra realista, cético. Numa mistura dos dois personagens, a amada de Philip e irmã do personagem de Roderick, Madeline Usher, é imersa nos extremos estáticos de alguém muito estranha, ou alguém disposta racionalmente a fugir da casa com seu noivo. E tal dinâmica vai crescendo. Na maneira como o diretor busca alcançar a casa para seu efeito de suspensão de descrença, no uso dos quartos enquadrados, nas cenas muito estáticas e nos movimentos bruscos de revelação, demonstra-se uma relação de difícil equilíbrio com os personagens, principalmente para desenvolver um suspense que não se suspende, porque a graça é relacionar algo sobrenatural, nunca de fato revelado em tosquice, com a realidade lógica do ambiente real de uma casa e família em conflito.

Nesse processo de equilíbrio atingido durante o filme, sempre há novas camadas. diante da capacidade do diretor em entregar a tosquice num ambiente seguro que não desagregue a realidade completamente. Assim, um close-up nos olhos de uma personagem termina por explicar mais do que qualquer história revelada pelo mordomo ao protagonista, ou pelo personagem de Vincent Price. Pois a maldição/moralidade é a discussão implícita inteirada na obra sobre os Usher, envolvendo natureza, riqueza e morte no campo metafísico e no campo material. Por isso, a resolução imagética de O Solar Maldito está na entrega do olhar, o meio entre o que se observa e reflete sobre a encenação do excêntrico.

O Solar Maldito (House of Usher) – EUA, 1960
Direção: Roger Corman
Roteiro: Richard Matheson (baseado na obra de Edgar Allan Poe)
Elenco: Vincent Price, Mark Damon, Myrna Fahey, Harry Ellerbe, David Andar, Mario Bellini, Bill Borzage.
Duração: 79 min.

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