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Crítica | O Último Mergulho

Repetição de ideias envolvendo tubarões não inova, mas ao menos não deixa a audiência entediada.

por Leonardo Campos
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A presença dos tubarões no cinema, especialmente em filmes de terror e aventura, continua a capturar a imaginação do público, mesmo após o cinquentenário de Tubarão, clássico dirigido por Steven Spielberg. Essa obra-prima, que estabeleceu o subgênero, inspirou uma série de produções que, embora nem sempre atinjam a mesma altura, claramente refletem um entendimento comercial do apelo que esses predadores marinhos têm sobre os espectadores. O recente lançamento de O Último Mergulho, dirigido por Joachim Hedén, ilustra como a indústria cinematográfica ainda busca explorar o medo e a fascinação que cercam os tubarões. Com uma trama que apresenta um grupo de amigos presos em um labirinto subaquático, cercados por ameaças naturais, ao longo de seus 98 minutos, o filme se posiciona como mais uma peça nesse quebra-cabeça narrativo que se mantém viva ao longo das décadas.

Apesar de não ser considerado um grande filme, O Último Mergulho evita ser um desastre total, situando-se num espaço entre o entretenimento leve e a preocupação com a qualidade. Com um roteiro assinado por Andrew Prendergast e Nick Saltrese, a narrativa estabelece um enredo que, ao mesmo tempo em que é simples, não cai completamente na armadilha da banalidade. Nesta obra, o mergulho no Caribe para explorar os destroços de um navio da Segunda Guerra Mundial se imediatamente transforma em um pesadelo subaquático, com tubarões brancos enfurecidos em busca de suas presas. O equilíbrio entre a simplicidade da história e a tensão gerada pelas cenas de ação é um ponto positivo do filme, que consegue manter o espectador interessado, mesmo diante de um elenco que não conta com estrelas de renome, exceto pelo veterano Julian Sands, que traz uma profundidade necessária ao seu personagem obcecado pela busca do USS Charlotte.

Os aspectos técnicos do filme, embora não cheguem a ser inovadores ou impressionantes, cumprem seu papel de forma eficiente. O diretor de fotografia Eric Börjeson, junto ao supervisor de mergulho Ian Creed, proporciona uma movimentação orgânica nas cenas subaquáticas, que, por sua vez, adicionam uma camada de realismo e intensidade aos momentos de tensão. A fotografia em O Último Mergulho aproveita o ambiente marinho, criando uma atmosfera claustrofóbica que retrata os desafios enfrentados pelos personagens. Enquanto os efeitos visuais podem não ser considerados marcos históricos do cinema, eles fazem justiça à premissa do filme, superando muitos outros lançamentos do mesmo segmento que decepcionam em termos de qualidade técnica. A atenção aos detalhes nesse aspecto mostra que o filme tem uma consciência do que seus concorrentes falham, conseguindo, assim, manter um ritmo dinâmico que evita que o espectador se desinteresse.

A quantidade de produções que continuam a emergir nesse nicho é surpreendente e demonstra que o tema dos tubarões no cinema ainda é um filão a ser explorado. Evidentemente, esse fenômeno é impulsionado pela curiosidade inata do público diante do desconhecido e do perigo que a figura do tubarão representa. Lar dos instintos primordiais de sobrevivência e de combate contra um predador implacável, esses filmes combinam o fascínio pela vida marinha com o medo visceral que os tubarões suscitam. Assim, O Último Mergulho, embora irregular, consegue se inserir nessa tradição, mostrando que mesmo dentro de um cenário saturado, ainda há espaço para histórias que alimentam a imaginação coletiva. À medida que o streaming se torna uma plataforma cada vez mais dominante no consumo de mídia, a contínua produção de narrativas envolvendo tubarões parece estar longe de se esgotar. O futuro desse gênero assim se revela promissor, com a perspectiva de mais histórias que exploram essas criaturas, ainda que por vezes de forma simplista ou clichê, noutros casos, de maneira tenebrosa.

Mas, como já realizei em outras reflexões, um questionamento: porque exercem tanto fascínio com o público?

Os filmes de tubarões, desde o mencionado Tubarão, de 1975, aos que são produções contemporâneas, têm exercido um fascínio duradouro sobre o público. Essa atração pode ser atribuída a diversos fatores, como a representação do desconhecido, o medo primal que os tubarões evocam, bem como o nosso magnetismo diante de narrativas acerca da luta pela sobrevivência. Em primeiro lugar, os tubarões representam uma forma de vida aquática que desafia a compreensão humana. Embora tenhamos aprendido muito sobre esses animais, ainda existem mistérios em torno deles, especialmente em relação ao seu comportamento e habitat. Essa incerteza cria um senso de curiosidade e apreensão, fornecendo o terreno perfeito para o desenvolvimento de histórias que exploram o medo do desconhecido, apresentando tubarões não apenas como predadores eficientes, mas quase como criaturas mitológicas que desafiam a capacidade humana de domínio sobre a natureza.

A tensão, outro elemento central nos filmes de tubarões, decorre da forma como esses filmes manipulam a expectativa do espectador. O uso de técnicas de filmagem, como a construção lenta da ansiedade antes da aparição do tubarão, gera um clima de expectativa que culmina em momentos de terror visceral. A trilha sonora marcante de John Williams, que se tornou sinônimo da iminência do perigo, é um exemplo claro de como a música pode intensificar a experiência de tensão e pavor. Cada vez que a famosa melodia toca, o público é involuntariamente levado a sentir um aperto no estômago, antecipando o ataque do tubarão. E, importante observar que nenhum filme com tubarões posterior ao de 1975 conseguiu uma trilha tão impactante. Além disso, o tema da sobrevivência é um elemento essencial que ressoa com audiências de diferentes idades e culturas. A luta pela vida contra um predador implacável invoca instintos primitivos e emoções intensas. Os personagens frequentemente se encontram em situações extremas, obrigando-os a confrontar seus medos mais profundos.

Por fim, a representação dos tubarões como vilões, embora frequentemente exagerada e enviesada, ajuda a criar uma narrativa envolvente. Essa personificação do tubarão como o “monstro” no abismo marinho não só alimenta o medo, mas também permite uma catarse emocional ao longo da jornada dramática que nos é apresentada. Mesmo os filmes de tubarões que falham em termos técnicos ou narrativos continuam a atrair público justamente por essa razão: a promessa de emoção, adrenalina e uma experiência que, embora fictícia, provoca reações intensas e duradouras. Em linhas gerais, os filmes de tubarões capturam a atenção do público pela combinação de medo do desconhecido, tensão constante, e a luta pela sobrevivência. Essas histórias não são apenas sobre predadores marinhos, mas são reflexões sobre a condição humana diante do medo e da adversidade. O grande problema é que em sua maioria, são filmes ruins, abaixo da média ou no limite da mediocridade, como é o caso deste O Último Mergulho, simples, mas ambicioso. Irregular, mas possível de ser assistido sem tédio.

O Último Mergulho (Last Breath, EUA – 2024)
Direção: Joachim Hedén
Roteiro: Andrew Prendergast, Nick Saltrese
Elenco: Jack Parr, Kim Spearman, Alexander Arnold, Ellen Muller, Julian Sands, Arlo Carter, Maxime Durand
Duração: 96 min

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