- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios da série.
Sei que faz parte da infraestrutura da franquia Star Wars retratar os Stormtroopers como incompetentes, especialmente no que se refere à sua notória incapacidade de acertar alvos com seus blasters. Faz parte do jogo e não tenho o menor problema com isso. No entanto, existe uma diferença substancial entre tratá-los dessa forma e não fazer sequer um mínimo de esforço para criar uma situação crível de tensão.
Refiro-me, claro, ao começo do terceiro episódio de Obi-Wan Kenobi em que o personagem titular, levando Leia a tiracolo, aboleta-se em um transporte no planeta Mapuzo depois que o contato prometido por Haja não aparece no ponto de encontro. Em determinada altura, três Stormtroopers pegam carona no mesmo transporte, dizem que estão atrás de um Jedi, mas sequer imaginam que aquele sujeito barbado e usando um manto bem ali na frente deles poderia ser quem eles estão procurando. Além disso, fica preguiçoso imaginar que eles não receberam um WhatsApp com a imagem do procurado e não fazem ideia sequer se estão procurando um humano ou um Wookiee, seja sozinho ou acompanhado de uma menina falastrona que parece se chamar Luma, mas que pode ser Leia.
Em outro momento, na barreira laser, depois que o motorista toupeira vivido por Zach Braff se dá ao trabalho de apontar os dois como suspeitos para os guardas por ali, Obi-Wan não demora a eliminar todo mundo, com a oficial Tala (Indira Varma) terminando o trabalho logo em seguida ao revelar-se como o contato atrasado da dupla de fugitivos. Novamente, faz parte do jogo ter Stormtroopers incompetentes, mas há um limite para tudo e, quando as supostas situações de tensão tornam-se fáceis demais, elas automaticamente perdem seu valor e parecem mais maneiras que a tropa de roteiristas encontrou para enrolar a história até o grande momento da chegada de Darth Vader (Hayden Christensen em tese, mas poderia ser o Seu Chico da vendinha da esquina, pois o que realmente importa é James Earl Jones, no alto de seus 91 anos, retornando para empresar sua icônica voz ao vilão*).
E o aguardado aparecimento de Vader no vilarejo foi à altura de sua lenda, com ele usando a Força para matar e arrastar aldeões de maneira a atrair Obi-Wan Kenobi para fora de seu esconderijo. Essa não só foi uma sequência forte, como rara na própria franquia, com momentos chocantes assim, portanto, sendo realmente valiosos, mesmo que a inexplicável ausência da Marcha Imperial de John Williams tenha sido sentida. No entanto, diferente de outros grandes momentos de violência em Star Wars, sejam eles causados ou não por Vader, este aqui foi completamente anticlimático, já que o que se seguiu a ele foi uma razoavelmente desapontadora luta entre mestre e pupilo, a primeira depois da fatídica pancadaria à la Marios Bros. de A Vingança dos Sith.
Mas deixe-me ser bem claro: o embate de sabres de luz em si foi ótimo, pois justamente fugiu daquela vergonha alheia do citado filme e do patético balé saltitante ao som de Duel of the Fates, em A Ameaça Fantasma. A vibe de Uma Nova Esperança foi a escolha acertada para o estilo da luta, assim como Vader tentar torturar Obi-Wan como parte de sua vingança foi também muito interessante. O problema está no liga e desliga sabres de luz, no entrecorte da luta com Reva atrás de Leia, a chegada providencial de Tala e seu robô caladão, Vader basicamente desistindo de correr atrás de seu ex-mestre, e, também, a ambientação, esta não mais do que um deserto genérico. Talvez a melhor descrição do que senti seja dizer que faltou solenidade e peso ao momento e isso é algo que afeta toda a série, pois o próximo encontro entre os dois já não será mais o “primeiro desde Mustafar”, ou seja, a oportunidade foi perdida para se criar algo realmente inesquecível.
Por outro lado, o retorno ao lado psicológico de Obi-Wan, com suas dúvidas, seu temor e a culpa que carrega em seus ombros foi muito bem-vindo, com o momento em que ele observa Vader atacar os aldeões e escolhendo fugir novamente sendo emblemático do que podemos classificar como sua completa incapacidade de processar o que está vendo, talvez por ainda nutrir a esperança de que Anakin – seu pupilo Anakin – simplesmente não pode ser o homem atrás daquela armadura ameaçadora. Esse é o aspecto mais fascinante da série, não tenho dúvida disso, mas seu tamanho, apenas seis episódios, vem impedindo que haja um trabalho cadenciado, ainda que seja mais problemática a questão da perda de oportunidades importantes como a que descrevi logo acima.
Obi-Wan Kenobi já chegou em sua metade e parece já ter tido o seu grande momento que, infelizmente, foi desperdiçado, mesmo que, no conjunto, tenha sido um bom, mas decepcionante episódio. Confesso que, a partir de agora, a não ser que um milagre aconteça – de preferência sem recorrer a um milhão de fan services gratuitos como foi a menção à Quinlan Vos – a minissérie parece-me fadada a ser apenas ok, sendo provavelmente lembrada como mais outra história que, se era para ser realmente contada, precisava de pompa e circunstância, não a mera reconfirmação do que sabíamos sobre Stormtroopers e um combate encerrado por intervenção externa. Espero estar errado, porém.
* O crédito dado à tecnologia moduladora de voz Respeecher, a mesma que tornou possível o uso da voz do jovem Luke Skywalker em The Mandalorian e O Livro de Boba Fett, pode indicar que o ator não efetivamente atuou especificamente para a série como fez em Rogue One, porém. Trata-se de uma suposição minha, apenas, e, se for verdade, isso não retira o poder de sua voz e o quanto ela é importante para dar vida a Darth Vader.
Obi-Wan Kenobi – Parte III (EUA, 1º de junho de 2022)
Direção: Deborah Chow
Roteiro: Joby Harold, Hannah Friedman, Hossein Amini, Stuart Beattie
Elenco: Ewan McGregor, Vivien Lyra Blair, Moses Ingram, Hayden Christensen, James Earl Jones, Sung Kang,
Rya Kihlstedt, Indira Varma, Zach Braff
Duração: 48 min.
