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Crítica | Obrigado por Fumar

por Guilherme Coral
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estrelas 5,0

O consumo de cigarro foi um fator que lentamente adentrou a cultura popular, atingindo seu ápice nos anos 1960 – somente nos EUA, por exemplo, mais de 40% da população consumia os produtos das diversas gigantes do tabaco – qualquer um que tenha assistido Mad Men certamente terá essa noção bastante fresca na cabeça. Desde então o que vimos foi uma queda vertiginosa desse hábito, com o cigarro gradualmente desaparecendo de filmes, séries e anúncios e locais fechados não mais tolerando a constante fumaça proveniente do produto, ao passo que os danos causados pela inalação dos elementos químicos neles presentes passou do conhecimento mais restrito para o senso comum.

É justamente contra esse tipo de aversão ao produto anteriormente tão popular que Nick Naylor (Aaron Eckhart) deve lutar. Ele é o principal lobista representando a indústria tabagista, pulando de entrevista em entrevista, talk show em talk show, buscando convencer as massas de que o cigarro não é o demônio. Não que ele não admita os danos causados pelo produto, ele está muito ciente deles (apesar dele próprio ser fumante), mas sua grande tarefa é minimizar o impacto desses malefícios nas vendas e na opinião pública. Seus conflitos são travados principalmente com profissionais da saúde e políticos que buscam regulamentar cada vez mais a indústria em questão. Obrigado por Fumar, portanto, não é um filme sobre o ato de fumar ou não e sim sobre um homem que defende o indefensável, sobre o advogado do diabo – afinal, em sua própria linha de raciocínio, todos contam com um direito de defesa.

O roteiro de Jason Reitman, baseado no livro de Christopher Buckley, é, sem dúvidas, um dos maiores méritos da obra. De forma inteligente ele se mantém neutro acerca do consumo de tais substâncias. Trata-se de uma história movida pelos seus personagens, ou melhor, pelo protagonista e os elementos que o cercam. A construção de Naylor chega a ser impressionante, mesmo sabendo o que ele defende, em ponto algum chegamos a sentir algum desprezo por ele. Suas convicções são sólidas e o que enxergamos é apenas um homem que permanece fiel a seus ideais.

Naturalmente a direção do próprio Reitman, que já provara, desde então, repetidas vezes seu talento, não deixa a desejar. Com planos que evidenciam a inquietude de seus personagens (especialmente após o ponto de virada na metade do filme), sabemos perfeitamente onde, psicologicamente falando, se encontra cada um deles. Ao mesmo tempo ele sabe garantir a dose certa de incerteza, criando sutis suspenses que, com o decorrer do longa, acabam vindo à tona, quando já praticamente esquecidos pelo espectador.

O trabalho de Aaron Eckhart também não há de ser desdenhado. Enxergamos nele a figura do lobista perfeito, um homem que conseguiria vender estrume como a coisa mais maravilhosa do mundo e não para fins de adubagem. Evidentemente sua aparência ajuda, mas o poder de sua atuação está em seu tom de voz, a maneira como gesticula, a pausa entre cada palavra, os sorrisos. Tudo isso vende seu personagem como um verdadeiro santo, em suas próprias palavras, ocara que no colégio conseguia todas as garotas. Com isso, Reitman cria um óbvio paralelismo com Lúcifer, o diabo se esconde atrás de um rosto bonito. Paralelamente, cada vez mais enxergamos a humanidade do protagonista, seu cuidado com seu filho chega a ser palpável, se tornando cada vez mais evidente conforme o longa-metragem progride. A aproximação do público com o personagem (o que ocorre quase que imediatamente, em virtude da narração em off nos primeiros minutos) permite, consequentemente, que as doses de humor negro sejam bem mais efetivas. Cada argumento e saída esperta do personagem provoca inevitáveis risos no espectador, que passa a torcer pelo protagonista.

No fim, Obrigado por Fumar é um filme perfeitamente resumido pelo seu título, que traz consigo uma inerente ironia, que imediatamente nos atrai. Jason Reitman abre sua carreira nas telas grandes com um longa-metragem inesquecível, um estudo de personagens e comportamentos com fortes críticas sociais além de doses saudáveis de sarcasmo, que irão entreter a qualquer espectador. E somente para deixar totalmente claro: esse filme não defende ou ataca o cigarro.

Obrigado por Fumar (Thank You for Smoking – EUA, 2005)
Direção:
Jason Reitman
Roteiro: Jason Reitman (baseado no livro de Christopher Buckley)
Elenco: Aaron Eckhart, Cameron Bright, Maria Bello, Joan Lunden, Mary Jo Smith, J.K. Simmons, Robert Duvall, Katie Holmes.
Duração: 92 min.

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