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Crítica | Operação Fronteira (2008)

Uma valiosa lição de como não escrever um roteiro.

por Ritter Fan
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Lá pelo começo do terço final de Operação Fronteira (que, em inglês, tem o inexplicável título The Shepherd ou O Pastor), depois da captura do patrulheiro Jack Robideux (Jean-Claude Van Damme) e de sua chefe, a capitã Ramona García (Natalie J. Robb), o vilão Benjamin Meyers (Stephen Lord) manda entrar no recinto um personagem chamado Emile (Dan Davies), matando-o em seguida em uma piscina eletrificada para fazer Ramona sofrer. O problema é que, até aquele ponto do longa, o espectador não faz ideia de quem é o sujeito, tanto que só aprendemos sua importância para a capitã depois que toda a ação acabou, com ela e Jack de volta aos EUA.

Comecei a crítica com a questão acima apenas para ilustrar o quanto o roteiro de Operação Fronteira é inábil em criar uma história concatenada, que nos faça pelo menos sentir algo pelos personagens durante os 94 minutos de projeção. A dupla de roteiristas – Joe Gayton, com um currículo de pérolas semelhantes e Cade Courtley que nem currículo tinha ou tem – não faz ideia do que é escrever um filme com desenvolvimento básico de personagens e com ordenamento de sequências que conte uma história que no mínimo dos mínimos faça sentido. E olha que estamos falando de um longa-metragem de Jean-Claude Van Damme, não exatamente conhecido por estrelar obras-primas e cuja base narrativa é a vingança, ou seja, um tropo tão simples e tão banal que escrever algo que a justifique não é muito difícil.

Infelizmente, porém, Operação Fronteira é, do começo ao fim, uma lição de como não escrever um filme. Outro exemplo? Quando Robideux chega em Columbus, no Novo México, transferido de Nova Orleans, sua nova chefe diz, do nada e com todas as palavras, para ele não se meter em encrencas com os locais. O que acontece na cena seguinte? Sim, isso mesmo, Robideux espanca quatro locais em um bar. E tem mais, muito mais. Afinal, mesmo que fique evidente que o protagonista tem seus próprios objetivos para estar lá, por alguma razão inexplicável, eles só são explicados no famigerado terço final e, mesmo assim, quando ele finalmente, sob tortura e ameaça à Ramona, conta sua história triste, ela não faz sentido absolutamente nenhum para ele estar ali querendo matar especificamente o tal Benjamin Meyers, ex-militar americano que ganha um preâmbulo que não rima com o longa, e que é chefe de um cartel de drogas.

Eu poderia também falar da sequência em que o vilão e seus capangas transportam 35 milhões de dólares em drogas em apenas um ônibus armado até os dentes pela fronteira, em uma decisão estratégica que é hilária de sem sentido, ou da forma genérica como Robideux impede a entrada do veículo nos EUA, mas isso seria chutar cachorro morto. Como disse, Gayton e Courtley não dizem o famoso “lé com cré” e, claro, nada fica em pé de verdade, nem mesmo a imagem de duração de Robideux carregando para lá e para cá uma gaiola com um coelho. Se não fosse toda a pegada séria da direção, diria que a intenção foi fazer uma paródia de filme de ação ou algo que fosse pelo menos autoconsciente de sua estupidez.

Falando em direção, Isaac Florentine, descrito no IMDb – provavelmente por ele mesmo, pois é hilário demais – como “adorado por seus fãs, por muitos anos [o diretor] construiu uma excelente reputação na indústria de filmes”, até que não é uma tragédia completa. Ele mostra que sabe comandar sequências de luta que, na verdade mesmo, só são duas no filme, uma em uma jaula na prisão e outra que coloca o não-ator lutador carismático Van Damme contra o não-ator lutador sem carisma Scott Adkins (que faz Karp, o silencioso capanga principal de Benjamin) e que maneja com mínima competência sequências de ação em geral. Mas não tem direção que consiga melhorar o quanto o roteiro é ruim, pelo que seu esforço é quase em vão. O próprio Van Damme não parece à vontade e atua no automático, sem sequer conseguir nos convencer como um pai da família que sofre ou como o dono de um coelhinho fofo.

Operação Fronteira tinha o DNA de um filme de ação genérico, mas divertido, uma mera desculpa para ver pancadaria e tiroteio ininterruptos por toda sua duração, mas os cromossomos herdados de seus pais roteiristas vieram com defeitos mortais de origem que impedem mesmo aquelas risadas nervosas involuntárias diante de tosquices extremas que se levam a sério. Tudo o que vemos em tela é aquilo que ele poderia ter sido com um pouquinho mais de esforço, o que torna a experiência ainda mais frustrante, se pensarmos bem.

Operação Fronteira (The Shepherd – EUA, 2008)
Direção: Isaac Florentine
Roteiro: Joe Gayton, Cade Courtley
Elenco: Jean-Claude Van Damme, Stephen Lord, Natalie J. Robb, Gary McDonald, Daniel Perrone, Scott Adkins, Andrée Bernard, Dan Davies, Miles Anderson, Luis Algar, Todd Jenson, Ivaylo Geraskov, Velislav Pavlov, Phil McKee, Bogdan Plakov, Atanas Srebrev, Dian Hristov, Bianca Van Varenberg, Kaloian Vodenicharov
Duração: 95 min.

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