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Crítica | Orange Is the New Black – 5ª Temporada

por Ritter Fan
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estrelas 4

Obs: Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas das temporadas anteriores.

Partindo diretamente do impossível cliffhanger da quarta temporada, Jenji Kohan estabelece um desafio a si mesma na quinta temporada de Orange Is the New Black: toda a ação seria passada durante apenas três dias consecutivos e lidando exclusivamente com a rebelião das detentas em Litchfield causada pela falta de punição ao terrível e tocante assassinato de Poussey Washington. Mesmo considerando a ousadia desse artifício narrativo – quase um experimento, por assim dizer – e as sempre excelentes atuações do elenco como um todo, o resultado foi menos do que perfeito, diria que um passo levemente atrás em relação ao que foi feito até agora.

O problema está na armadilha auto-imposta por Kohan, que  fecha a narrativa mais ainda atrás das paredes e grades da prisão de segurança mínima só para mulheres e impede a entrada – e a saída – de novos personagens, esticando situações ao limite e às vezes além do limite para que o tempo regulamentar de cada um dos longos 13 episódios seja alcançado. Ainda foi uma temporada muito acima da média e bastante poderosa, mas com impacto menor do que o visto nas três temporadas anteriores (a primeira eu ainda considero como algo relutante e experimental que, apesar de boa, permanece, para mim, como a mais fraca delas).

Além disso, nunca concordei com a classificação da série como uma dramédia, pois o drama sempre foi preponderante ao tom cômico de algumas poucas situações. E essa sempre foi uma pegada perfeita para o material, pois o objetivo da obra é lidar com um microcosmo representativo da população americana menos favorecida, lidando com temas difíceis e complexos como preconceito racial e religioso, a representatividade da mulher, o machismo, a sanidade mental e o abismo sócio-econômico existente entre as camadas mais e menos privilegiadas da população. No entanto, na quinta temporada, o tratamento desses assuntos teve sua lógica invertida, com roteiros muitas vezes usando um olhar cômico mais forte que, mesmo mostrando-se eficiente em alguns momentos – particularmente nas duplas formadas por Flaca e Maritza, ou “Flaritza”, que se tornam celebridades efêmeras do YouTube e Leanne e Angie, as duas drogadas que passam metade da temporada arriando as calças de outras detentas -, em diversos outros pecam pelo excesso e pela repetição, muitas vezes lidando de forma cômica demais assuntos sérios para essa pegada, como é o caso da crescente insanidade de Suzanne.

Os arcos narrativos também precisaram ser esticados e, com isso, veio a repetição e, ao mesmo tempo, por incrível que pareça, o sub-aproveitamento de outros. A situação dos guardas capturados e usados como moeda de troca, por exemplo, funciona por um ou dois episódios, mas nós os vemos praticamente em todos os episódios em meras repetições temáticas de tudo o que veio antes. Estranhamente, por outro lado, personagens como Sophia Burset, que já havia sido subutilizada na temporada anterior durante seu tempo na solitária, aparece em alguns momentos, mas, depois, simplesmente parece que ela nunca existiu, chegando ao ponto de esquecermos dela na medida da progressão narrativa. O mesmo pode ser dito de Soso, que é abordada com mais constância na primeira metade da temporada, somente para ser relegada ao esquecimento, abrindo as portas não para novas histórias, mas sim para mais do mesmo.

E mais. Ainda que o esconderijo secreto de Frieda encante pelo completo inusitado da coisa, ele muito rapidamente perde seu objetivo primário, ainda que funcione – talvez convenientemente em excesso – para criar uma trama completamente paralela lidando com o desejo de vingança de Piscatella contra Red, gerando um episódio inteiro com uma muito bem manejada pegada de “terror”, com o sumiço de cada uma das amigas da cozinheira russa. Aliás, o encerramento do arco do personagem é muito bem executado, com sua morte já “cantada” desde que ele é capturado pelas detentas depois de muito esforço e muitas consequências pessoais. A “bala de pimenta” no meio dos olhos foi o perfeito fechamento para Piscatella e para tudo que ele representa: brutalidade policial sendo resolvida pela brutalidade policial. Além disso, o esconderijo secreto, por mais cansativo que seja, acaba gerando o cliffhanger para a próxima temporada, mesmo que eu presuma que não vá haver muito drama ali, pois, de certa forma, é uma repetição do final da temporada anterior.

Outros dois pontos que não funcionam muito bem são os flashbacks em geral e o romance entre Piper e Alex Vause em particular. No caso dos flashbacks, com exceção do dedicado a Piscatella, importante para a compreensão de quem exatamente ele é e talvez ao dedicado à Frieda por ser peculiar e diferente e que explica seu bunker, os demais parecem estar ali para cumprir tabela, sendo desconectados demais das histórias sendo contadas no presente. No caso de Piper e Vause, vale lembrar que Piper, tendo servido de veículo para Kohan mergulhar nas diversas detentas ao ponto de a série não ter mais apenas uma protagonista propriamente dita, havia perdido sua relevância direta. O romance corrido e perdido ao final me pareceu apenas uma forma desajeitada e em última análise desnecessária de a série voltar às origens lá da primeira temporada.

Mas meus comentários negativos até aqui não detraem demais do todo da obra e nem estão completamente desconectados de minha avaliação final. Eles apenas pontuam aspectos que, muito em razão da escolha artística e estilística de Kohan – escolha essa que de forma alguma condeno, vale frisar – acabam reduzindo a força das histórias contadas.

A grande verdade é que o poder do elenco em OITNB é algo quase inacreditável. Já mencionei, em críticas anteriores, que falar sobre ele é uma tarefa hercúlea, pois são nomes demais para citar e certamente deixarei de fora vários que mereceriam comenda. Se Kate Mulgrew como Red, Uzo Aduba como Suzanne e Taryn Manning como Pennsatucky continuam brilhando e literalmente mastigando o cenário toda vez que aparecem, a quinta temporada serviu de palco para atrizes que certa forma vinham ganhando menos destaque como Natasha Lyonne como Nicky (aliás, aquela transformação visual dela foi impressionante), Yael Stone como Lorna e a espetacular Lea DeLaria como Big Boo.

No lado masculino, a surpresa foi a forma como os roteiros lidaram com Bayley, o assassino de Poussey. A morte da detenta já havia sido estupendamente retratada como uma crítica direta à violência policial e ao assassinato de Eric Garner em Nova York, em 2014. Ao colocar o novato Bayley como o culpado direto (o indireto, claro, foi Piscatella e tudo o que ele representa, como Taystee deixou muito claro ao final), Kohan tentou estabelecer que nada é tão assim preto ou branco. É evidente que Bayley nunca quis matar ninguém. Logo ele, o mais novato e de certa forma frágil guarda prisional. Mas aconteceu. Ele continua culpado, mas a relativização do acontecido é importante e Kohan soube continuar com as consequências disso muito bem em sua quinta temporada. Com toda a rebelião em Litchfield acontecendo em razão da morte (ou da forma como a morte foi abordada pela MCC) de Poussey, o foco em Bayley fora da prisão foi preciso e relevantíssimo. E Alan Aisenberg, ator que não havia tido oportunidade quase alguma de mostrar sua latitude, prova que tem futuro com sua abordagem destruidora do personagem sem saída, sem encontrar uma forma de lidar com o ocorrido. Seu confrontamento honesto e rápido com o pai de Poussey é um momento mais do que potente e memorável da televisão recente.

Mas seria criminoso não mencionar em um parágrafo próprio a grande estrela da temporada: Danielle Brooks, como a sempre simpática Taystee. Em um mundo ideal, ela deveria abocanhar todos os prêmios de melhor atriz em série de TV, mas não concorrendo com as demais, pois seria covardia (com as demais!). Ela deveria levar algo especial, hors concours mesmo, moldado para o que ela fez aqui. Não que ela não tivesse já mostrado sua capacidade na série, é importante afirmar. No entanto, os roteiros a colocam quase que completamente no centro do palco, tornando-a líder incontestável de seu grupo (todas, aliás, com atuações incríveis também, particularmente Adrienne C. Moore como Black Cindy) e da rebelião como um todo ao tornar-se a negociadora das condições para o fim da revolta com Figueroa, a representante do governador, elevando a personagem que carregava ainda uma certa inocência sobre a forma como o mundo funciona para alguém de inteligência invejável e capaz de lidar com as mais diversas e complexas situações simultaneamente, ainda que se deixe levar pela paixão incontida. Ver Taystee na telinha é esquecer que existem outras personagens à sua volta.

Portanto, os problemas que existem na quinta temporada pela escolha narrativa da showrunner da série são mitigados pelo incrível trabalho de seu elenco como um todo. Não há nenhum ator ou atriz de alguma relevância na série que não tenha atuação no mínimo muito boa, com a maioria se superando a cada nova temporada. Resta, agora, saber como a série continuará – considerando que ela tem pelo menos mais duas temporadas pela frente, já autorizadas – depois da separação causada pelo fim bem menos do que ideal para os eventos catastróficos em Litchfield.

Orange Is the New Black – 5ª Temporada (EUA, 09 de junho de 2017)
Criação: Jenji Kohan
Direção: vários
Roteiro: vários
Elenco: Taylor Schilling, Laura Prepon, Michael J. Harney, Kate Mulgrew, Uzo Aduba, Danielle Brooks, Natasha Lyonne, Taryn Manning, Selenis Leyva, Adrienne C. Moore, Dascha Polanco, Nick Sandow, Yael Stone, Samira Wiley, Laverne Cox, Jackie Cruz, Lea DeLaria, Elizabeth Rodriguez, Laverne Cox, Beth Fowler, Annie Golden, Laura Gomez, Kimiko Glenn, Blair Brown, Brad William Henke, Beth Dover, Artesian McCullough, Lee Dixon, Alan Aisenberg, James McMenamin, Lory Petty, Alan Aisenberg, Olivia Luccardi
Disponibilidade no Brasil: Netflix
Duração: 810 min. aprox. (13 episódios)

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