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Crítica | Os Pássaros, de Daphne Du Maurier

por Luiz Santiago
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Os Pássaros foi originalmente publicado em 1952, numa coletânea de contos chamada The Birds and Other Stories, volume que acabou tendo diversos outros nomes e acrescido de outros contos conforme foi sendo reeditado. Àquela altura de sua carreira, a escritora Daphne Du Maurier já tinha construído um notável legado e já contava com dois de seus trabalhos adaptados para o cinema por Alfred Hitchcock, o primeiro em 1939 (A Estalagem Maldita) e o segundo em 1940 (Rebecca, A Mulher Inesquecível), primeiro filme do diretor nos Estados Unidos.

A autora junta aqui algumas de suas mais interessantes características literárias para criar uma obra que direciona o medo para a natureza, e cria, em poucas páginas, um cenário épico de medonha destruição. A escalada dos eventos é rápida e o leitor tem pouco tempo para abstrair sentimentos ou caraterísticas dos personagens, e até mesmo para entender melhor a situação geral, o que certamente acaba diminuindo a qualidade da narrativa, já que a menor ligação emocional/contextual com os protagonistas nos deixa o tempo inteiro na superfície. Ainda assim, ficamos espantados pelo horror que se instaura nessa pequena cidade litorânea da Cornualha, onde os pássaros começaram a mostrar um comportamento muito estranho.

A criação da atmosfera, nas primeiras páginas, é uma das melhores coisas do conto. A autora estabelece a ação no início de dezembro e já aponta para uma onda de frio que chega “cedo demais“. As observações meteorológicas e as primeiras frases que citam os pássaros (como se estivessem migrando tardiamente) ajudam na criação de uma percepção ampla para problemas na natureza, algo inicialmente tomado apenas como “inesperada alteração“, mas que quando a crise se estabelece, recebe um outro significado, o de pistas que todos viram, mas ignoraram — não necessariamente por negar a possibilidade de algo muito errado estar acontecendo, mas porque no mundo real as pessoas realmente não esperam que grandes desastres como estes ocorram.

Isto, aliás, é um dos pontos interessantes da narrativa que infelizmente acabam sendo abreviados, tirando-nos a oportunidade de conhecer melhor os vizinhos do protagonista Nat Hocken (um veterano da 2ª Guerra Mundial que aparece aqui em sua casa no campo, com toda a sua família) e ver como o ataque dos pássaros possui diferentes impactos para diferentes pessoas. Claro que para um espaço literário menor, como um conto, essa amplitude não chega a níveis muito altos, mas convenhamos, já vimos temas muito mais complexos e profundos serem trabalhados em narrativas muito menores. Que é possível, é. E isto não é feito aqui.

A despeito dessa caraterística, o susto que as aves inicialmente causam em Nat, sua esposa e seus filhos, e depois a maneira como mais e mais pássaros surgem (procurando bicar violentamente os olhos dos humanos), com notícias de que os ataques não são apenas na Cornualha, mas se espalharam por toda a Grã Bretanha, dão uma impressão fortemente apocalíptica. É o tipo de obra que nos causam uma impressão bem forte, mas que só está preocupada em estabelecer “linhas gerais” a respeito de toda a trama, sem muita exploração para todo esse conteúdo. É uma boa história, mas pelo tema e impacto que possui no leitor, nos faz concluir que a autora perdeu uma oportunidade imensa de trabalhar verdadeiramente o desenvolvimento dessa tenebrosa situação com cara de fim de mundo.

Os Pássaros (The Birds) — Reino Unido, 1952
Autora: Daphne Du Maurier
Editora original: Gollancz
70 páginas

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