Home QuadrinhosEm AndamentoCrítica | Os Trapalhões #25: A Nega Maravilha (1979)

Crítica | Os Trapalhões #25: A Nega Maravilha (1979)

Lutas diárias.

por Luiz Santiago
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A saga dos Trapalhões nas histórias em quadrinhos começou em 1976, na Editora Bloch, num formato que mesclava quadrinhos, fotonovelas e outras atrações. Algo mais próximo do entretenimento da Nona Arte que conhecemos hoje chegou para a trupe em 1979, quando o estúdio de Ely Barbosa passou a trabalhar em parceria com a Bloch, fazendo a edição das HQs dos Trapalhões, já com mudança e formato e dedicando-se exclusivamente a colocar os personagens parodiando obras famosas do cinema, da literatura e da televisão da época. Essa nova fase se deu na edição #23 (setembro de 1979), intitulada Descarga Pesada (brincando com a famosa série de Antônio Fagundes e Stênio Garcia). Protagonizada pela “Trapa Suat”, equipe de investigação que teria, no mesmo ano, uma revista própria, a edição #25 traz um título e uma abordagem em texto e desenhos que nos faz ter a certeza de que este material jamais será reeditado no Brasil. 

A Nega Maravilha é a história principal da revista, e coloca os protagonistas enfrentando uma dupla de cachorros alienígenas que roubaram a ponte Rio-Niterói e o Pão de Açúcar. Há um charme nessa história que lembra muito mais os esquetes televisivos dos Trapalhões do que todas as outras histórias centrais da revista. O absurdo, o humor politicamente incorreto (leia-se: racista, em alguns aspectos) e as piscadelas críticas para coisas sempre discutidas no Brasil, como a fome (em uma placa perto de uma floresta, é possível ler “não alimente os assalariados”) aparecem aqui de maneira clara, e o grupo utiliza sua espontaneidade caótica para resolver o caso da melhor forma, contando com a transformação do Mussum e Mulher-Maravilha como um presente dos cães aliens policiais para capturar outros cães aliens. Agora, porque o Mussum estava se vestindo de Mulher-Maravilha, no começo da história, é um grande mistério. 

A segunda aventura da revista é O Caçador de Esmeraldas, que além dos problemas ético-morais já esperados, tem os problemas de caráter histórico, já que se trata de uma trama com bandeirantes. É claro que o roteiro trata os “desbravadores paulistas” como heróis, no entanto, como se trata de uma aventura cômica e protagonizada por uma trupe de desajeitados, a concepção geral quase parece uma crítica, de tão ridícula que é a figuração das infames figuras históricas — é bom destacar, porém, que o texto não foi escrito para ser crítico. A despeito disso, gosto das brincadeiras anacrônicas que aparecem aqui, tanto no começo da história quanto no fim, com o diretor de cinema bravo porque Didi não deu atenção para as valiosas esmeraldas, como dizia o roteiro, mas sim para “a” Esmeralda. Também destaco o caráter de grande jornada cômica que o texto coloca para os personagens, especialmente na sequência do Hotel Itu e no contato com os indígenas canibais.     

Talvez a mais fraca e mais boba história do volume, Os Detetives disfarça Didi de Sherlock Holmes, deixa os outros sem disfarce algum e cria uma busca por uma jovem sequestrada que tem um início narrativo questionável e um final batido, apesar de conseguir fazer o leitor rir. O encerramento, com O Cachorro Zebu, faz a revista retornar aos trilhos: é uma história simples, mas engraçada e até bonitinha, sem maiores problemas de tratamento dos personagens (já que as estrelas são os cachorros que bebem um “líquido de experiência química” e crescem demasiadamente) e com um destino aberto, mas bacana, para o Zebu, que acaba encontrando uma namoradinha que também bebeu do tal líquido e ficou tão grande quanto ele. 

Ao longo das histórias maiores, temos aventuras curtas, sobre as quais farei breves comentários. A primeira delas, Concurso de Imitadores, é uma trama simples e quase sem graça, sobre um homem que imita papagaio de um jeito meio inesperado (voando). Dedé (trama sem título, assim como todas as outras curtas do volume, que traz apenas o nome do protagonista), nos conta a história de um carro que fica bêbado, após o frentista abastecê-lo com álcool. Muçum é a minha favorita dessas tramas menores: um ótimo conto onde o Cacildis vive um alfaiate incompetente que corta demais o tecido de um cliente, fazendo uma gravata onde era para fazer um paletó. Noutra história de Didi, temos uma piadinha sobre um relógio que o personagem não usaria no pulso porque era um relógio de parede. E, para terminar, uma história de Muçum e outra de Didi: na primeira, o personagem é um cozinheiro que deixa o fogo ligado o tempo todo para não gastar fósforos; e na segunda, a medalha de prata entre as tramas curtas, temos Didi tirando todas as coisas (e são muitas!) do bolso, para entregar para o ladrão durante um assalto.

Talvez o maior incômodo que eu tive nesta edição foi com a arte. No geral, é um projeto visual que não me agradou e que considero ruim a maior parte do tempo, diferente do roteiro, que não só tem bons momentos, como histórias que, no todo, são mesmo muito legais e engraçadas. Acho que os desenhistas acertam mais na contextualização visual de espaços geográficos e outros personagens, animais e objetos, mas não nos rostos e movimentos dos Trapalhões, que são, majoritariamente, pavorosos.

Os Trapalhões #25: A Nega Maravilha e Outras Histórias (Brasil, 1979)
Editora:
Bloch
Roteiro: Genival A. Souza, Sérgio Valezin
Arte: Carlos Cárcamo, Domingos A. Souza, Eduardo Vetúlio, Waldemar Watanabe, Waldir Odorisso, Paulo Bonfim, Sonia Martins, João Andrade, Izidoro Groemberg
52 páginas.

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