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Crítica | Papai é Pop

A função da paternidade, ou o “novo pai”?

por Davi Lima
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papai é pop

papai é pop Filho não é video-game! – Gladys

Na entrevista que Lázaro Ramos deu aos jornalistas, após a cabine da sessão do filme Papai é Pop, comentou como sua atuação fez repensar alguns erros da paternidade, e o diretor Caíto Ortiz (O Roubo da Taça) ficou satisfeito como seu longa abarcou as dimensões do tema. Realmente, ao se assistir essa nova obra do cinema brasileiro é perceptível que Lázaro se entrega a um papel paterno do personagem Tom, numa variação de expressões com pé na caricatura e no realismo, assim como a direção necessita do protagonista para legitimar o roteiro de idas e vindas entre conveniências e clichês. Porém, no desembocar da narrativa em uma palestra youtuber, que busca evitar fórmulas de paternidade enquanto as formula, as boas fugas de Ortiz das facilidades do drama comum infelizmente alcança o pop com um verniz cult, sem perceber a contradição.

Quando acontecem conflitos de representações sociais, especialmente quando se trata de paternidade, é normal, mas quando ela é posta como voz absoluta, envolta da simpatia de discurso, abre-se um leque a se criticar negativamente. Falar sobre o que é ser pai com naturalidade é um desafio, porque percorre imaginações diversas, e quando se especifica um recorte brasileiro de função paterna também direciona-se uma nova perspectiva de pai do mundo contemporâneo. Nessa especificação e direcionamento, Ortiz tenta o alívio cômico como realismo do dia-a-dia e o drama como fantasia permissível para as coisas darem certo na história de Tom, fazendo-nos admirar muito mais a boa experiência de assistir cenas confortáveis do que uma transformação coesa e lógica com o tema familiar. Em sua inclusão temática pode-se perguntar ao filme: o protagonista é um exemplo de “novo pai”, ou é uma obra tranquilamente conservadora sobre a função do pai na família?

Essa dúvida surge pela iniciativa de Papai é Pop discutir as dinâmicas de trabalho dentro do casamento de Tom e Elisa (Paolla Oliveira), ao mesmo tempo que decide abraçar qualquer símbolo de paternidade, como uma playlist implícita do YouTube de vários episódios sobre paternidade. Ou seja: dentro da possibilidade retratar um pai gamer, o filme coloca isso como um trampolim, não como sua tese dramática até o fim. Na diversidade de dramas sobre Tom, a sensação é que a coincidência do roteiro tenta se justificar pela necessidade de avançar o desenvolvimento paterno de Tom para conseguir criar um protagonista adaptável à palestra final do longa. Assim, não há problema com discurso ou representações contemporâneas de pais, e sim como é feito o percurso entre esses dois pontos.

Se a intenção do filme era evidenciar a possibilidade jogadores de videogame serem pais, dando sentido ao Pop como enfrentamento aos preconceitos do papel paterno do pai conservador, a narrativa que quer discursar torna Tom em Cult – assim como Lázaro Ramos é também – e o tema da função paterna em linhas conservadoras. O alívio cômico e o drama, que a direção usa para se desviar dos clichês, acabam enraizando preconceitos leves, porque a primeira parte da obra parece mais divertida – quando Tom é black power e mais caricato – e a segunda mais dramática – com Tom usando óculos, cabelo cortado e mais Lázaro Ramos vestindo ele mesmo. Os preconceitos se valem por na tentativa de mostrar que a função da paternidade pode ser compreendida por uma pluralidade de trejeitos masculinos, por outro lado, quando o homem aprende a ser pai, ele sempre parece o pai conservador de sempre. 

Essa narrativa de conclusão está longe de ser ruim, e diz muito sobre como o filme enxerga a paternidade responsável, com senso de mundo real. A atriz Paolla Oliveira, por exemplo, não tem experiência como mãe, mas, assim como Lázaro Ramos como pai, ela buscou interpretar amplitude des perspectivas funcionais numa família e identidade social que a maternidade implica. As atuações no filme são uma das técnicas na obra que sustenta boa porcentagem do que o público pode captar de qualquer proposta em Papai é Pop. A interação entre Lázaro e Elisa Lucinda, interpretando Gladys, a mãe de Tom, mostra dimensões que essa classe do “novo pai”, o meninão que casa e não sabe cuidar de criança (homens que crescem aos montes ultimamente). A frase “bebê não é videogame” dita por Gladys a Tom, ou até mesmo a crítica aos pais de selfie – que não cuidam realmente dos filhos, só tiram fotos com ele para postar no instagram – tem um moralismo que combina com o filme, da mesma forma que seu espectro mais conservador, bem alinhado com um filme positivamente pró-vida e family friendly.

Apesar disso, esse último filme de Caíto Ortiz é muito mais um esforço para que papais façam vídeos emocionantes sobre o recorte social da paternidade, por vezes pouco dramatizado como foco temático no cinema nacional. Quando se conta histórias sobre pais é muito mais com a interação com os filhos, ou a família, num desenvolvimento bem mais representativo do que direcionado e específico. Papai é Pop se diferencia nisso, colocando a mãe do “novo pai”, a esposa desses novos esposos gamers e mostrando o quanto o pai pode ser desmistificado de imaginações acerca da irresponsabilidade e dureza. Se isso é irreal ou real na abordagem com Lázaro Ramos é o que vai diferenciar o efeito médio ou mais positivo em quem assistir. No fim, a boa experiência de assistir a direção bem planejada de Ortiz mais o retrato aglutinado da função da paternidade dão uma razoável degustação cinematográfica, o suficiente para enfrentar a inconstância narrativa e as contradições do que se imagina e vende sobre o que é ser um pai pop, popular e moderno.

Papai é Pop – 2022, Brasil
Direção: Caíto Ortiz
Roteiro: Ricardo Hofstetter (baseado no livro O Papai é Pop, escrito por Marcos Piangers)
Elenco: Lázaro Ramos, Paolla Oliveira, Elisa Lucinda, Dadá Coelho e Leandro Ramos. Produzido por Beto Gauss, Francesco Civita, Ricardo Costianovsky, Tomás Darcyl, Gabriel Gurman
Duração: 108 minutos

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