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Crítica | Paternidade

por Kevin Rick
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Baseado em eventos reais, Paternidade, o mais novo filme do comediante Kevin Hart, traz uma premissa básica e sentimental em torno de um viúvo que precisa cuidar de sua adorável filha após sua esposa falecer durante o parto. E, logo de início, o filme estabelece sua base dramática de luto em torno da grande estratégia comercial e proposta audiovisual: demonstrar que Kevin Hart sabe atuar em papéis dramáticos. E, bem, em certa medida, a ideia surpreendentemente funciona.

O comediante americano conhecido por sua energia e os personagens inseguros, traz uma interessante faceta dramática no início da obra, seja a tragédia hospitalar, um discurso impossível ou a solidão de um velório, o ator é comedido, chocante, perturbado e, acima de tudo, tremendamente machucado. Não é uma performance completamente memorável, mas, por alguns instantes, Kevin Hart nos faz esquecer que ele é… Kevin Hart, o cara risonho e cheio de carisma que sempre carrega sua persona para diferentes filmes. Aliás, para seu mérito, Amigos Para Sempre já foi uma bela entrada dramática para o comediante, mas Paternidade, se ainda bastante comum em termos de premissa melodramática e desenvolvimento sentimental em torna da perda, cria um curioso veículo estelar para Hart adentrar novos trajetos artísticos. Infelizmente, o filme não mantém seu percurso.

Depois de um começo emocionalmente avassalador e raivoso, Paternidade começa a se perder no núcleo que deveria ser a maior força da narrativa: a dificuldade de sobreviver ao luto enquanto cria um bebê sozinho. Enquanto eu continuamente assistia o filme se resignar a caminhos fáceis e ordinários, ficou bastante claro que a inicial proposta de desvencilhar Hart da comédia não foi trazida para o âmbito criativo da construção dramática, que decide demonstrar outro lado do ator entre diferentes padrões e convenções temáticas para atingir as conhecidas notas de sentimentalidade barata.

Tudo começa com o contínuo retrato da paternidade perdida na criação de filhos, afinal, homens não entendem nada de bebês, correto? Bem, dentro da padronização da obra, esta é uma verdade irrefutável, já que apenas as mulheres têm uma participação ativa na moldação de um ser humano. Muito disso é utilizado como efeito cômico pobre, e lentamente começamos a assistir a persona de Hart tomar conta da interpretação inicialmente adversa. A mesma padronização é vista em outros artifícios baratos como o relacionamento de ódio/amor entre Matt (Kevin Hart) e sua sogra, Marion (Alfre Woodard), o novo interesse romântico destruído pelo trauma, a falta do modelo feminino na criação da menina ou então a dificuldade de equilibrar trabalho e vida pessoal. É como assistir diferentes recortes formulaicos de dramédias sobre luto familiar diluídas em um filme que segue cada passo esperado do arco de redenção e amadurecimento da dupla.

E, pelo menos para mim, os clichês não são ruins por serem clichês, mas sim pela maneira que são desenvolvidos. No caso de Paternidade, a padronização narrativa não tem um verdadeiro efeito emocional, pois não há verdadeiro conflito. O trabalho e o chefe de Matt são extremamente razoáveis e não exercem um grande obstáculo profissional ou financeiro, o próprio relacionamento incompatível do protagonista com sua sogra parece forçado, já que a animosidade entre eles soa mais como uma parceria cômica do que adversária, e, acima de tudo, o núcleo mais corajoso do filme, que acontece em torno da discussão de gênero de Maddie (Melody Hurd), através de sua vestimenta, não exerce qualquer tipo de dramaticidade profunda ou discussão temática na obra. Além disso, acredito que o salto temporal de Maddie bebê para criança retirou tempo de tela da melhor construção dramática do filme: o luto do viúvo desesperançoso.

Há o que se gostar em Paternidade, desde um elenco de apoio bem constituído, especialmente o hilário Lil Rel Howery, e a própria interpretação de Hart, que, mesmo não mergulhando nos ótimos vislumbres iniciais do filme, consegue carregar o restante da obra com muito carisma e a charmosa química com a atriz mirim. No entanto, o cineasta/roteirista Paul Weitz, já conhecido por filmes de sentimentalidade ordinária e melodrama barato, se esforça bastante para ser padrão em cada aspecto da unidade da fita, seja seu conteúdo, performances ou direção, sempre filmando de maneira genérica em planos meio abertos ou enquadramentos próximos com os personagens em tristeza. Pode até emocionar em alguns momentos, mas o último esforço de Kevin Hart não quer se arriscar para demonstrar seu lado dramático.

Paternidade (Fatherhood) – EUA, 18 de junho de 2021
Diretor: Paul Weitz
Roteiro: Paul Weitz, Dana Stevens (baseado no livro Two Kisses for Maddy: A Memoir of Loss and Love, de Matthew Logelin)
Elenco: Kevin Hart, Alfre Woodard, Lil Rel Howery, DeWanda Wise, Anthony Carrigan, Frankie R. Faison, Paul Reiser
Duração: 109 min.

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