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Crítica | Pedro Coelho 2: O Fugitivo

por Luiz Santiago
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Não é nada espantosa a diferença de qualidade (para pior) de Pedro Coelho 2: O Fugitivo em relação ao seu antecessor, Pedro Coelho, lançado em 2018. Muita coisa da fórmula dos filmes com animais interagindo com humanos já se viu e se esgotou naquele primeiro longa, e o fato de o principal vilão ter se acostumado com os bichinhos da fazenda tirou a possibilidade de uma investida forte nesse tipo de humor, que é meio conto de fadas e meio pastelão. Na cena de abertura desse novo filme temos uma pequena mostra do que poderia ter sido um retorno àquele status de comédia e narrativa, e só agradecemos pela mudança. A questão é que, por mais interessante que os blocos desse filme possam ser, isoladamente, não dão ao filme a unidade que promete e que deveria entregar, o que deixa essa sequência com uma pergunta em letras garrafais: qual é o verdadeiro foco?

Bea (Rose Byrne) e Thomas McGregor (Domhnall Gleeson) se casam. O fato de uma nova família aparecer já é motivo o bastante para mudar a dinâmica de relação entre o casal e os animais, tanto que o papo da chegada de um bebê assusta Peter Rabbit (James Corden, com quase nenhum charme ou energia) e é martelado ao longo de toda a fita, provavelmente sendo o tema de um possível filme três. Mas o roteiro de Will Gluck (também diretor) e Patrick Burleigh utiliza esse drama e os conflitos familiares iniciais como uma ponte para aquilo que deveria ser o tema da película, indicado no título: a fuga/as andanças de Peter, o coelho travesso. Mesmo que o início seja lento e muito desajeitado na forma como estabelece a sua ponte dramática, o filme ainda poderia estar acima da média se o texto não resolvesse fugir de sua proposta e criar duas histórias paralelas que acabam sendo tudo o que o longa tem a nos entregar.

A primeira delas está ligada a uma crise de identidade de Peter, e a premissa é muito boa. Depois de ser constantemente taxado de travesso e malvado, ele chega à conclusão de que precisa vestir a carapuça e fazer jus a todas as coisas que dizem a seu respeito. Esse pensamento ganha corpo quando encontra Barnabas (Lennie James), um coelho mais velho, que vive nas ruas e tem todo o traquejo de malando, levando Peter “para o mal caminho“. No decorrer da trama teremos algumas surpresas em relação a essa parceria, mas em nenhum momento a vilania desses animais desabrigados parece algo assustador, genuinamente mau. Foi uma abordagem interessante para mostrar o lado de alguns vilões no filme, deixando claro que certas ações, intenções e formas de pensamento são o bastante para que se trace uma linha divisória entre as companhias da vida.

Já a segunda história paralela é a mais interessante e, paradoxalmente, a que mais atrapalha o andamento da película. Nela, os roteiristas trabalharam uma ótima crítica ao mercado editorial — embora o que vemos possa ser aplicado a qualquer mercado artístico nos dias de hoje –, onde Bea presencia a sua criação, As Aventuras de Pedro Coelho, virar alvo da febre de produtos, da arte-brinquedo, da arte-faturamento. Fico imaginando o quão legal seria se o filme tivesse esse foco e tal questão fosse o centro das atenções, abordada com a consciência e o humor que temos aqui. Ver David Oyelowo como o editor que tem a alma-lucro e vive pensando em transformar a mais sutil, delicada e autoral obra de arte em um borrão clichê de aventuras tolas, mas capaz de vender milhões de cópias, é impagável.

Perdido entre essas duas histórias, o filme abre muitos caminhos e não consegue fazer com que eles se cruzem de maneira orgânica, tornando Pedro Coelho 2: O Fugitivo uma produção com pedaços interessantes, mas completamente estranhos quando os consideramos parte de um todo. Se somarmos isso ao uso meio deslocado da trilha sonora na segunda metade da fita e a insistência em tirar todos os animais da fazenda para uma aventura na cidade, temos um quadro bastante caótico e que justamente pelo pecado do excesso, vai perdendo a graça. Talvez tivessem pensado que conseguiriam o fenômeno que os produtores de As Aventuras de Paddington conseguiram com o segundo filme… mas acabaram do lado oposto da régua da execução, do conteúdo e da qualidade. Não foi dessa vez, coelhinhos.

Pedro Coelho 2: O Fugitivo (Peter Rabbit 2: The Runaway) — EUA, Autrália, Índia, 2021
Direção: Will Gluck
Roteiro: Will Gluck, Patrick Burleigh
Elenco: Rose Byrne, Domhnall Gleeson, David Oyelowo, James Corden, Colin Moody, Margot Robbie, Elizabeth Debicki, Aimee Horne, Lennie James, Hayley Atwell, Damon Herriman, Rupert Degas, Sia, Sam Neill, Ewen Leslie, David Wenham
Duração: 93 min.

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