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Crítica | Pequena Grande Vida

por Gabriel Carvalho
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Sabe aqueles filmes que nos instigam apenas pelas suas sinopses? Pequena Grande Vida tem inegavelmente uma premissa interessante, que nos faz imaginar uma série de possibilidades a serem trabalhadas diante da hipótese de ficção científica apresentada. No caso, cientistas europeus desenvolvem uma tecnologia capaz de encolher matéria orgânica, o que traz em consequência seres humanos, os quais optaram por passar pelo processo, tão pequenos que cabem na palma da mão de pessoas “normais”. Em um mundo com milhões de pequeninos, cidades, proporcionais ao tamanho das pessoas que lá habitarão, foram criadas e os países passaram a viver com duas realidades totalmente distintas, sendo que uma delas, obviamente a inédita para a sociedade, promove o consumo sustentável de forma inimaginável, reduzindo drasticamente as consequências das atitudes dos homens em relação ao ambiente. Indo para a história de fato, Paul Safranek (Matt Damon) e Audrey Safranek (Kristen Wiig) são um casal de classe-média como qualquer outro, ambos, aparentemente, decididos a passar pela transformação irreversível.  Com uma série de temáticas encorpando o pano de fundo da trama, incluindo aquecimento global, a questão dos refugiados e até intolerância, Alexander Payne, dono de duas estatuetas de Melhor Roteiro Adaptado, traz em seu texto, assinado também por Jim Taylor, uma reviravolta: Audrey desiste do procedimento e deixa Paul para traçar seus próximos passos sem o amor de sua vida. De resto, mesmo em sua escala reduzida, Pequena Grande Vida termina sendo um projeto bem menor do que o prometido pela sua própria sinopse.

Tornando-se, portanto, um morador rico da Lazerlândia, visto que a conversão de dinheiro aumenta estratosfericamente a quantia monetária possuída, Paul, tempos depois dos eventos referentes a sua ex-esposa, está tentando progredir com a vida um andar de cada vez. Ao envolver-se com Dušan Mirković (Christoph Waltz), o destino o aproximará de Ngoc Lan Tran (Hong Chau), uma mulher vietnamita com um passado sofrido, mas que não se permite derrubar perante o que ela acredita ser seu dever. A começar uma análise mais minuciosa, é altamente claro e reluzente que o ponto mais alto deste pedaço de filme em miniatura é a personagem de Chau, dona de um background fortíssimo, bem apresentado, o que a permite ter de imediato uma conexão empática com o espectador. No entanto, não apenas isso, a própria atriz nos dá uma performance sensível, contrapondo a modéstia de Ngoc em seus afazeres mundanos com o seu jeito mais atrevido de contracenar com Damon, garantindo química aos dois personagens. Pequena Grande Vida, todavia, não é um longa-metragem que se permite ir além, sendo simplérrimo e mal resolvido no roteiro. Alexander Payne e Jim Taylor, surpreendentemente, exibem para nós peças que nunca vão além, como a presença súbita da mãe de Damon. Por falar no protagonista, também é ato falho de Payne esticar desnecessariamente o filme para lugares que não levam a nenhum outro, o que resume integralmente a presença de Kristen Wiig na obra. Quando se demora muito para chegar no destino programado, o qual era antecipado fortemente pelo público dada a sinopse e os trailers, e, durante esse percurso, percebe-se que o primeiro ato arrastadíssimo não acrescentou em nada à experiência, sendo muitas vezes redundante, o filme quebra, não conseguindo sustentar bem o restante de sua duração.

Além do mais, Pequena Grande Vida, que teria como um de seus aliados mais fortes uma estética diferenciada, não convence o público quando traz os jogos de proporção entre o que é normal e o que é encolhido. A computação gráfica não é das mais evoluídas, fazendo os efeitos visuais soarem artificiais, principalmente os usos de chroma-key. Sendo assim, a fotografia não consegue captar composições visuais de encher os olhos, pois o cenário destacado pela iluminação, seja até um belíssimo pôr do sol, é evidentemente falso. Em um último plano, Alexander Payne nos permite, no mínimo que seja, sentir alguma coisa em termos de comprometimento emocional do público em relação ao filme, mesmo que a história se perca no meio de tantas possibilidades temáticas. Muito pouco se é falado sobre tudo que é pontuado, e quando Payne assume definitivamente uma posição final para o seu filme, ela é genérica em relação a monólogos e resoluções narrativas. Entretanto, somos movidos por duas figuras principais eficientes, com boas motivações e arcos, embora faltasse um pouco de Contatos Imediatos do Terceiro Grau naquele final, assim como todo o restante do filme precisava de um foco mais certeiro e um enredo menos unidimensional e enxuto – Christopher Waltz está no longa apenas para ser um vizinho mulherengo e, para variar, milionário. Ao buscar encontrar um pouco de mensagem universal para a sua obra, Alexander Payne recorre no último instante à mensagem intimista de outrora, pouco desenvolvida pelas mais de duas horas de filme, que aparenta ser desonestamente vazia quando realmente até que faz sentido dentro do que Paul estava representando para a história; uma ilustração da nossa dimensão ínfima em relação a grandiosidade do restante do mundo. Mas, seja em qualquer nível, Pequena Grande Vida é um filme pequeno demais para abraçar qualquer discurso.

Pequena Grande Vida (Downsizing) – EUA, 2017
Direção: Alexander Payne
Roteiro: Alexander Payne, Jim Taylor
Elenco: Matt Damon, Christoph Waltz, Hong Chau, Kristen Wiig, Jason Sudeikis, Maribeth Monroe, Udo Kier, Rolf Lassgård, Ingjerd Egeberg, Søren Pilmark, Neil Patrick Harris, Laura Dern
Duração: 135 min.

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