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Crítica | Perigo: Diabolik (1968)

O bandido que tem solução para [quase] tudo.

por Luiz Santiago
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A história da produção de Perigo: Diabolik é longa e conturbada. Uma primeira filmagem começou em 1965 (tendo Tonino Cervi como produtor e Seth Holt como diretor), mas foi completamente descartada: não só o material filmado, mas toda a equipe envolvida. Uma nova produção se organizou logo em seguida, com Dino De Laurentiis como produtor e Mario Bava como diretor, tendo as filmagens dessa produção durado de abril a junho de 1967. O roteiro dessa versão pega uma miríade de referências de obras de ação e espionagem para dar força à representação desse anti-herói dos fumetti neri italianos, o super ladrão Diabolik e sua mulher Eva Kant.

Criado pelas irmãs Luciana e Angela Giussani em 1962, numa história chamada O Rei do Terror, Diabolik foi a abertura para as histórias em quadrinhos com personagens que matavam e roubavam (Kriminal, que estreou em O Rei do Crime, em 1964, é um dos mais interessantes dentre os derivados) e para as histórias com diversos tipos de violência ou vícios. Daí é que vem o nome para esse subgênero de HQs naquele país, os fumetti neri (“quadrinhos sombrios“), que em linhas gerais é a versão em outra mídia do giallo no cinema, que estava em crescente popularidade nos anos 1960, desde que foi oficialmente inaugurado pelo mesmo diretor do presente filme, Mario Bava, em A Garota Que Sabia Demais (Olhos Diabólicos), lançado em 1963.

A escola temática de Perigo: Diabolik é, portanto, ligada a uma cultura de produção de histórias de detetive com uma boa quantidade de ingredientes violentos, como um reflexo mais delineado do que de pior se tinha na sociedade. No filme, porém, o diretor não foca no aspecto sangrento que caracterizava o giallo e nem está o tempo inteiro focando em ação pela ação. Há uma divisão de momentos dramáticos aqui, com espaço para as várias tendências encontradas no cinema europeu da década, e isso vai de cenas lisérgicas e desconectadas de qualquer coisa que tenha a ver com o núcleo do filme (como a sequência na boate de um dos homens da máfia) até as aleatórias cenas sexy, que só se salvam pela presença estarrecedora de sex appeal vinda de Marisa Mell, que interpreta Eva Kant.

Mesmo que essas cenas estejam majoritariamente concentradas no primeiro ato da fita, elas possuem um impacto negativo porque parece não existir uma motivação para a sua existência dentro daquele contexto. Com o desenvolvimento do drama, essa parte do incômodo diminui, mas o filme não está livre de problemas. Em relação ao elenco, porém, a obra está bem servida. Todo mundo se sustenta em seus papéis, e mesmo que eu ache John Phillip Law um Diabolik meio sem graça, ele não chega a estragar o personagem. Já em relação à linha narrativa, o que falta aqui é foco, porque a obra parece uma antologia com diferentes curtas-metragens narrando diferentes roubos de Diabolik. Mas só parece mesmo, porque ela não foi concebida dessa forma. Daí já se vê o problema.

O final aberto é um outro capricho estranho da película, mas talvez funcione diante dessa persona que constroem para Diabolik aqui. Como não há desenvolvimento de personagem e os únicos diálogos com alguma relevância estão no bloco da polícia, o espectador acompanha o ladrão com uma curiosidade afastada, sem entender muita coisa sobre ele, mas aceitando o que vier pela frente. Como a direção de arte aqui é soberba, brincando muito bem com inúmeras tecnologias para o esconderijo e o cotidiano de Diabolik e Eva, o espectador não questiona a possibilidade de o ladrão fazer o que faz. Dos setores técnicos, o desenho de produção é o que mais se destaca, portanto. É difícil não se impressionar com a “batcaverna” tecnológica do protagonista, sem contar os inúmeros gadgets que ele possui e o uso que temos disso em cenas-chave. A despeito de alguns efeitos ruins, o incômodo gerado por eles não é assim tão grande, porque há muita coisa ao redor dessas aplicações que desviam a nossa atenção e fazem valer aquele momento.

Diabolik é o tipo de personagem que o público gosta de ver vencendo. Vê-lo enganando a polícia e passando pelas mais diversas provações para conseguir um roubo é o que torna esse filme tão estranhamente irresistível. Não é à toa que, apesar de seus inúmeros problemas, manteve-se como uma obra cult e que influenciou ou encantou diversos outros diretores em anos seguintes. Não é uma adaptação que esteja à altura do personagem nos quadrinhos, mas não desce a níveis tão baixos a ponto de fazer com que a gente queira esquecer do que viu. Perigo: Diabolik consegue ser divertido, apesar dos pesares. E isso diz muito sobre o grande Mario Bava: mesmo em seus momentos regulares, ele ainda conseguia garantir o entretenimento ao público.

Perigo: Diabolik (Diabolik) — Itália, França, 1968
Direção: Mario Bava
Roteiro: Dino Maiuri, Brian Degas, Tudor Gates, Mario Bava (baseado em história de Angela Giussani, Luciana Giussani, Dino Maiuri, Adriano Baracco)
Elenco: John Phillip Law, Marisa Mell, Michel Piccoli, Adolfo Celi, Claudio Gora, Mario Donen, Renzo Palmer, Caterina Boratto, Lucia Modugno, Annie Gorassini, Carlo Croccolo, Lidia Biondi, Andrea Bosic, Federico Boido, Tiberio Mitri
Duração: 105 min.

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