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Crítica | Porta dos Fundos: Videografia Não Autorizada de Jesus Cristo

Onde tudo começou...

por Luiz Santiago
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Nada como relembrar as raízes de uma grande criação, não é mesmo? Bem, no caso dos famosamente odiados, comentados e até queridos Especiais de Natal do Porta dos Fundos, a “grandeza da criação” está apenas no quesito de importância midiática que ganhou e no tamanho que o produto artístico acabou recebendo de quem o odeia. Plenamente cientes do número cada vez maior de cristãos no Brasil (e eis aí um dos motivos pelos quais a pergunta da Jumenta de Balaão sobre “por que não parodiam Maomé ou Alá?” já tem resposta pronta na realidade para a qual tais esquetes/filmes são produzidos), o grupo resolveu embarcar numa paródia de elementos do judaísmo/cristianismo, pisoteando, fazendo graça, chacota e todo tipo de deturpação dos elementos presentes nessa mitologia.

Escrito por Fábio Porchat, com elementos adicionais trazidos por Antonio Tabet, essa Videografia Não Autorizada de Jesus Cristo deu início a algo que virou tradição para a trupe, certamente surfando na onda raivosa dos cristãos amorosos que sempre saem para defender Deus, o Todo-Poderoso, dos pecadores hereges e desrespeitosos. Desde essa primeira edição, em 2013, os Especiais natalinos do Porta sempre conseguiram levantar debates acalorados sobre liberdade de expressão (o que é e o que não é) e sobre abordagens humorísticas como condicionais para se produzir algo. Pode entrar em qualquer caixa de comentários sobre essas obras que vocês verão frases como “por que não fazem graça com grupos LGBT?” — e o Porta vive fazendo graça com grupos LGBT –; “por que não fazem graça com religiões afro?” — o Porta vive fazendo graça com religiões afro — e por aí vai… A lista segue até o infinito.

Contudo, a clássica pergunta que os anti-usuários do cérebro normalmente fazem é em relação à chacota com Maomé, Alá e o Islamismo como um todo. O primeiro ponto a se considerar aqui é o já citado contexto de público. Embora existam inúmeros vídeos do Porta fazendo graça com elementos doutrinários específicos do Islã, algo diretamente ligado ao profeta ou ao deus islâmico, para um público brasileiro… talvez não fosse exatamente um bom chamativo. Ou talvez fosse. Mas a motivação mais óbvia de todas é a de autopreservação. O medo de loucos extremistas islâmicos! Evidentemente o Porta, como qualquer pessoa ou grupo, tem medo de lidar com extremistas religiosos que matam (explodem, esfaqueiam, decapitam) as outras pessoas em nome de seu deus.

E é exatamente por isso que eu nunca entendi o que essa turba de “cristãos” querem dizer com essa pergunta. Qual é o ponto? É o desejo de que o grupo faça piada com Maomé e tenham o destino do Charlie Hebdo? É uma indicação de que os cristão deveriam assumir uma postura extremista e matar todo mundo que fala mal de sua fé, de seus ícones, de seus elementos de adoração? É essa a defesa? Porque é uma pergunta que realmente não faz sentido: ela é condicional, indicativa ou desejosa? Até onde eu saiba, a Era do cristianismo matar quem questiona ou fala mal do cristianismo já passou tem alguns séculos. Hoje, os cristão extremistas só tentam explodir o escritório de um grupo de fala mal de sua mitologia, mas “nada demais“, segundo muitos deles, não é mesmo? Afinal de contas, estão defendendo um Ser Todo-Poderoso com bombas. Normal, gente.

O curioso é que esse primeiro Especial do Porta pega levíssimo com tudo. Ele é dividido em 5 partes, cada uma narrando uma fase da vida de Jesus, desde a sua concepção (Não sabia que tinha visita aqui hoje) até o momento de sua crucificação (Não vai doer), passando pelo momento de chegada dos Reis Magos para presentear o menino (Presente, vocês trouxeram?), pelo momento em que Jesus apresenta Maria Madalena, sua namoradinha, para os pais (Eu tenho a impressão que conheço você você de algum lugar) e, por fim, pelo momento de festinha entre amigos (É porque a gente chamou de ‘A Última Ceia’), o melhor de todos os esquetes.

Cada um desses blocos é protagonizado por um grupo diferente de atores da equipe, com níveis diferentes de qualidade, mas a maioria sendo bem mediana. O melhor momento, para mim, é o da “última ceia” especialmente pela presença hilária de Marcus Majella interpretando Sandrinho, o personagem que Jesus curou da gastrite em Cura (2013), um dos melhores esquetes do Porta.

Muitíssimo prejudicado pelos cortes entre um bloco e outro mostrando Gabriel Totoro vestido de Papai Noel e encenando situações “fora da caixa” em relação ao Natal, esse primeiro Especial do PF tem alguns bons elementos, nos faz rir em algumas de suas cenas, mas como já era de se esperar, está marcado por piadinhas sem graça sobre coisas que a gente até entende por que foram escolhidas para constar num texto de humor com esse propósito, mas que não significa que sejam bem feitas ou que realmente funcionem para essa situação. O projeto, como um todo, é bom, principalmente se a gente tirar os takes com o Totoro. Mas já começou capengando em pontos que a gente conseguiria apontar o dedo muito mais facilmente nos Especiais dos anos seguintes.

Porta dos Fundos: Videografia Não Autorizada de Jesus Cristo (Especial de Natal) – Brasil, 2013
Direção: Ian SBF
Roteiro: Fábio Porchat, Antonio Tabet
Elenco: Gabriel Totoro, Fábio Porchat, Antonio Tabet, Julia Rabello, Rafael Infante, Marcos Veras, Camillo Borges, Dinho Machado, Gregório Duvivier, Letícia Lima, Clarice Falcão, João Vicente de Castro, Marcus Majella, Luis Lobianco, Gigante Léo
Duração: 16 min.

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