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Crítica | “Problema Meu” – Clarice Falcão

por Handerson Ornelas
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Se tem algo que a música brasileira possui em abundância de qualidade atualmente, isso são ótimas cantoras solos – seja de MPB ou pop – que revezam entre o mainstream e o underground. Podem ser tiradas dessa safra nomes como Tulipa Ruiz, Tiê, Alice Caymmi, Céu, Ana Cañas e por aí vai. Mas, se uma dessas cantoras me deixou sérias dúvidas, essa foi Clarice Falcão através de seu primeiro álbum, Monomania. Sua estreia pode ser considerada no mínimo mediana. Faltava algo nos arranjos simples demais, faltava algo nas letras que revezavam de bem divertidas a excessivamente “bobas”.

Em seu segundo álbum, Problema Meu, lançado dia 26 de fevereiro, o que vemos é uma surpresa enorme. Quanto aos arranjos, o que se escuta é uma complexidade extremamente maior que a de sua estreia. Existe influências de pop, MPB, rock, Jazz, eletrônico, música clássica e até jovem guarda. Em relação às letras – marca registrada da cantora para o bem ou para o mal – o que se vê são composições bem mais variadas – não se prendendo só ao âmbito romântico – e mais divertidas, apesar de ainda conter, vez ou outra, citações bizarras.

O próprio single Irônico, apesar de longe de figurar entre as melhores do disco, já causa surpresa pela presença de sintetizadores e um bom arranjo carnavalesco, típico de banda marcial. Isso seria apenas o início, Problema Meu não cansa de surpreender ao misturar as mais diferentes influências. Pode ser o pop ingênuo e os tambores introdutórios de Eu Escolhi Você que evocam o clássico Pet Sounds dos Beach Boys, o rock n’ roll de guitarras e sintetizadores fundidos de A Volta de Mecenas, ou o jazz “bêbado-trágico-romântico” de Duet. Há também uma aura típica do duo americano She & Him nos momentos que revitalizam o clássico e o retrô de maneira um tanto moderna (Se Esse Bar Fechar, Eu Sou Problema Meu e Vagabunda), onde seria até justo comparar sua interpretação à da bela e sempre elegante Zooey Deschanel.

A produção de Kassin – responsável por produzir uma imensidão de elogiados álbuns nacionais – merece grandes elogios já que cada instrumento soa com uma autenticidade enorme. Cada sopro, corda e efeito de sintetizador soa único aqui. Veja, por exemplo, como a bateria e os metais de Marta roubam a cena, ou como os fantásticos e peculiares sintetizadores de Como É Que Eu Vou Dizer Que Acabou nos fazem ignorar por completo a fraca letra. Clarice continua com sua bela voz delicada de fofura enorme, dessa vez até arrisca cantar em inglês em Duet e no cover de L’amour Toujours (I’ll Fly With You), aliás, uma ótima reformulação mais ‘clássuda’ do hit pop que marcou o início do milênio.

As letras aqui podem ser tanto bastante elogiadas quanto questionadas. Considerando que a cantora evoluiu muito nesse quesito, os elogios devem ser bem mais ressaltados. Se trata de uma forte voz da nova geração, isso fica claro desde as referências pop até os problemas de relacionamento citados, típicos da atualidade. Clarice – que também é famosa por seu trabalho no canal humorístico Porta dos Fundos – sabe usar o humor como um grande aliado, além de tratar tudo de maneira informal. Há momentos hilários, ainda que, às vezes, passe por problemas de métrica e coesão. Entre suas letras, destaque à derradeira faixa Clarice, uma grande piada em relação aos frequentes comentários a respeito de suas composições.

Clarice Falcão fez de sua segunda empreitada no ramo musical uma divertida e surpreendente viagem. Um caldeirão de sonoridades diversas (tudo sem perder o foco) e letras que, por mais que possam soar um tanto estranhas, são um válido reflexo das gerações ditas Y e Z, acostumadas com imediatismo e múltiplos acessos a informação. Sim, se você não consegue entender suas letras corre sério risco de estar ficando velho (e mesmo eu pertencendo a essas gerações, não me excluo dessa possibilidade).

Aumenta!: A Volta de Mecenas
Diminui!: Irônico

Problema Meu
Artista: Clarice Falcão
País: Brasil
Lançamento: 26 de fevereiro de 2016
Gravadora: Chevalier de Pas
Estilo: MPB

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