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Crítica | Pulp

O western pulp de Brubaker e Phillips.

por Kevin Rick
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A parceria do roteirista Ed Brubaker com o artista Sean Phillips é um dos maiores presentes que a Nona Arte já recebeu. Com grande foco no mundo do crime/thriller, a dupla criou uma grande variedade de histórias incríveis juntos, como Criminal, Fatale e Kill or Be Killed, para citar alguns. Mas foi em 2020 que a parceria rendeu um dos projetos mais inusitados na sua bibliografia conjunta, com o lançamento da graphic novel Pulp. A obra é uma mistura de western/neo-noir/crime/guerra em um contexto histórico pós-faroeste e no início da 2ª Guerra Mundial, fazendo uma espécie de homenagem aos quadrinhos de revistas pulp no começo do século XX, enquanto carrega um olhar cínico e melancólico para o período, como comum em narrativas de ressurgência do Velho-Oeste.

A trama segue Max Winter, um escritor de histórias fictícias para uma revista de Nova York na década de 1930. O personagem redige contos básicos de pistoleiros, bandidos e duelos no western, com seu protagonista Red River Kid. No entanto, as histórias são baseadas na vida de Max como um criminoso no oeste selvagem. Pouco vemos dos dias de glória do personagem, e sim acompanhamos sua vida na velhice. O autor começa a cair em uma espiral no seu trabalho, que reduz sua taxa de pagamento e não o deixa publicar histórias mais experimentais e introspectivas. Além disso, o personagem é assaltado enquanto tentava ajudar um estranho e teve um ataque cardíaco. Com o cenário de quase-morte, Max começa a pensar na vida que deixaria para trás para sua esposa no caso de sua morte prematura.

O que se segue após o ataque cardíaco é uma narrativa de meditação sobre mortalidade e violência, típicas de westerns revisionistas com narrativas mais maduras e aprofundadas para o gênero de masculinidade exacerbada dos duelos armados. Max é um produto de uma época passada que não consegue sobreviver em universo de guerras e ideologias complicadas, um mercado competitivo pós-A Grande Depressão e, claro, os problemas de saúde de um corpo que não responde aos comandos da mente. Tudo isso resulta em um senso de cinismo um tanto hipócrita de Max, culpando a geração mais nova por consequências de erros da sua vida criminosa. Aos poucos o personagem entra em um estado de autorrealização e epifanias pontualmente narradas por monólogos internos de contemplação melancólica.

É como se Max fosse um grande metáfora para o fim do faroeste. Sua vida é resignada a contos de quadrinhos em um mundo industrializado que renega suas histórias verdadeiras. Ele é uma casca cheia de lamentações de um período violento, agora enaltecido para entretenimento, mas que ignora os remanescentes. É possível ver como Max anseia por uma nova aventura, um resquício de um tempo que ele entendia, mas que não pode voltar atrás. Assim como o olhar cínico do personagem é uma metáfora para o contexto histórico da 2ª Guerra Mundial com a trama de Max e um ex-perseguidor da Pinkerton juntando forças contra o nazismo em Nova York. Dois anti-heróis lutando por adrenalina.

Andando de mãos dadas com o roteiro melancólico, os traços finos de Phillips nos introduz ao mundo de Max. Os flashbacks de Max são coloridos como se fossem um conto western saído de uma revista pulp, com duas ou três cores básicas. Uma simplicidade que passa a sensação de memória, como se Max estivesse revivendo o passado. Um passado mais acessível e quente. Já no presente, a HQ contém uma paleta de cores sombria de uma atmosfera urbana neo-noir abatida. Max está cansado e seu mundo parece cansado com ele.

Pulp é um quadrinho que trabalha a melancolia de resgate do faroeste com a sensação de incerteza do futuro do mundo das guerras mundiais e das crises econômicas. Há, como eu disse, um subtexto cínico de Brubaker, em relação à violência cíclica, independente da época. O remorso e a mortalidade de Max trabalham todos esses conceitos narrativos no campo particular, mergulhados em um miolo neo-noir de um velhinho tentando revisitar seu eu do passado, confrontando fantasmas, ao mesmo tempo que se conforma com a morte. A sua e a do seu período. Agora revisitadas através do pulp.

Pulp – EUA, 2020
Roteiro: Ed Brubaker
Arte: Sean Phillips
Editora original: Image Comics
Data original de publicação: 29 de julho de 2020
72 páginas

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