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Crítica | Que Viva México! (1979)

por Luiz Santiago
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Depois de dirigir A Greve (1925), O Encouraçado Potemkin (1925) e Outubro (1927), Sergei M. Eisenstein tornou-se referência na cinematografia mundial. Admirado por cineastas do mundo inteiro, especialmente na Europa e na América, não demorou muito para que ele chamasse a atenção da então jovem Hollywood, que de fato acabou convidando-o para dirigir um filme nos Estados Unidos, um projeto que começou com assinatura e o encerramento de um contrato, sem produção alguma, mesmo o processo tendo sido mediado por amigos do diretor russo como Charles Chaplin e Robert Flaherty.

Mas Eisenstein não deu “viagem perdida à América”, apesar do fracassado projeto na Paramount. Com financiamento do escritor Upton Sinclair, Eisenstein, Grigori Aleksandrov (assistente de direção) e Eduard Tisse (câmera) partiram para o México em dezembro de 1930, onde começaram a produção um ambicioso projeto, ¡Que Viva Mexico!, filmado entre abril de 1931 e janeiro de 1932, quando por falta de fundos — e após diversos problemas de Eisenstein com a polícia, além de pressões de Moscou para que ele, Aleksandrov e Tisse retornassem à União Soviética–, o filme foi interrompido.

Inacabado e sem perspectiva comercial para que no mínimo 30 horas de material filmado fosse editado (lembremos que a Crise de 1929 afligia o mercado americano) o filme foi acabar no MoMA (Nova York) e depois de um longo processo de tentativas, a URSS conseguiu a posse do material. Era a segunda metade da década de 1970. Estando Eisenstein e Tisse mortos, coube a Grigori Aleksandrov fazer a montagem final do filme, tentando ser o mais fiel possível aos storyboards e anotações de Eisenstein. Em agosto de 1979, o filme foi enfim lançado no Festival de Moscou, estreando nos Estados Unidos em novembro daquele mesmo ano.

Fica claro para o público que a montagem de Aleksandrov dá um sentido bem diferente ao filme daquele que esperávamos de uma obra de Eisenstein. Em parceria com Esfir Tobak, que assinara a montagem de obras como Outubro, Cavaleiros de Ferro (1938) e Ivan, o Terrível – Parte II (1958), Aleksandrov dividiu Que Viva México! em episódios lógicos, do período Pré-Colombiano até a queda de Porfírio Diaz, explorando entre esses extremos as nuances da cultura, sociedade e economia mexicanas ao longo das décadas, sempre fazendo relações com o presente, como fruto de um passado não muito distante.

No epílogo do filme, a festa do Dia dos Mortos em 2 de novembro, há uma interessante reflexão sobre a luta do povo mexicano, sua fuga e ‘formas de enganar a morte’; sua reinvenção a cada nova dificuldade e o triunfo da vida, apesar de todas as adversidades históricas. Com ecos da montagem de atrações, metáforas e críticas sociais, o longa não é exatamente socialista, mas não nega essas ideias. A reflexão, no entanto, é humanitária, universal e bastante objetiva, emprestando elementos da arte de Diego Rivera, José Orozco e David Siqueiros para mostrar formas de se enfrentar os problemas e assumidamente nos entregar um olhar parcial sobre aqueles fatos.

Entre imagens da natureza e sítios arqueológicos na abertura e as caveiras da festa dos mortos ao final, um episódio ficou apenas na intenção de ser realizado. Soldadera seria a visão de Eisenstein para a Revolução Mexicana (1910 – 1920), exibindo “cenas do conflito” a partir da experiência das mulheres que lutaram ao lado de seus maridos na guerra. Já entre os outros capítulos temos o lírico Sandunga, o antropológico Fiesta, e o político-social Maguey, todos com imagens belíssimas (os meus blocos favoritos são Prólogo, Sandunga e Epílogo) e olhar respeitoso para o povo mexicano. A versão final não é perfeita, há certos exageros e permissões da montagem que atrapalham um pouco a apreensão do espectador, mas nada capaz de tirar o brilho da obra.

Como um pêndulo triangular entre o documentário, a ficção e o filme político, Eisenstein filmou Que Viva México! como um projeto do coração. Sua viagem ao país mudou bastante sua maneira de ver o mundo e o fez lidar com alguns demônios pessoais como se estivesse em estado de libertação. O resultado disso é um longa que hoje temos de forma parcial e intermediada, mas do qual emana aquela aura típica das obras do diretor, algo que dificilmente consegue passar despercebido por qualquer um que ame o cinema.

¡Que Viva Mexico! (Da zdravstvuyet Meksika!) — URSS, 1979
Direção: Sergei M. Eisenstein
Roteiro: Sergei M. Eisenstein (com material adicional de Grigori Aleksandrov)
Elenco: Grigori Aleksandrov, Sergei Bondarchuk
Duração: 90 min.

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