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Crítica | Raised by Wolves – 2X08: Happiness

Está provado: jogar videogame causa involução.

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios.

Quando o vovõ Castorini começa a chorar na mesa de jantar da família ao final de Feitiço da Lua, seu filho Cosmo pergunta qual é problema, ao que ele responde, enxugando as lágrimas dos olhos, “Estou confuso!”, em uma frase simples, mas memorável. Tão memorável que a imagem do senhorzinho se debulhando em lágrimas por não conseguir mais compreender a bagunça que são os relacionamentos de seus familiares foi a primeira coisa que me veio à mente ao final de Happiness, que encerra a segunda temporada de Raised by Wolves. A única diferença é que minhas lágrimas imaginárias são de felicidade, pois a confusão que sinto enquanto escrevo estas palavras é benigna e bem-vinda, algo que vem não de desordem, não da completa falta de sentido, mas sim de mistérios bem trabalhados que vão aos poucos – bem aos poucos – sendo revelados, mesmo que isso signifique fazer Marcus, crucificado de cabeça para baixo na árvore que cresceu da carcaça da serpente voadora, comece a flutuar como o “Enforcado” das cartas de tarô (leiam de novo essa frase e aceitem que, só de ela ser possível, já faz a série valer qualquer esforço).

Porque é isso. A série não acabou ainda (já estou preparando minhas sementes que transformam pessoas em árvores para enviar para quem toma essas decisões caso não haja renovação), e só teve, até agora, 18 episódios, pelo que podemos dizer que ela ainda está em sua infância ou, talvez, no máximo, em sua metade. Há muita coisa a ser solucionada, mas também há muita coisa que vem se encaixando, mesmo que a simbologia religiosa que Aaron Guzikowski faz questão de imprimir à sua obra propositalmente nuble a fronteira existente entre tecnologia e misticismo. Claro, se lá no futuro o showrunner meter os pés pelas mãos e não trouxer coesão ao que vem desenvolvendo, a qualidade da série terá que ser repensada, mas, pelo momento, o que temos é ouro puro em formato televisivo.

Como já escrevi algumas vezes, a série é fundamentalmente sobre seres artificiais. Os humanos, seus protegidos, são, na maioria das vezes, apenas detalhes ou instrumentos para que os androides sejam magistralmente trabalhados. Happiness reitera essa conclusão. Avó, que diz ter a função de perpetuar a humanidade, ou seja, dar uma de “vovozinha” mesmo, protegendo todo mundo, tem seu rosto magnificamente revelado, com seu véu sendo transplantado para Mãe, que, ato contínuo, com seus sentimentos postos em xeque, enfrenta Número 7 e o extermina de maneira tão cruel, tão fria e tão dolorosa, furando aquele olhinho de cobrinha pidona, que eu fiquei com pena do bicho em uma cena que não é menos do que memorável. Mas o conceito de humanidade que Avó tem parece ser bastante elástico e seu objetivo, na verdade, é manter viva qualquer versão da humanidade, mesmo que seja uma versão involuída para a forma de criaturas marinhas resistentes ao mar de ácido que, por seu turno, serve de proteção contra o inverno que está chegando agora que a camada protetora da região tropical foi inadvertidamente destruída por Mãe.

Mas como involuir o que sobra da humanidade? Ora, todos nós sabíamos essa resposta, mas nos recusávamos a aceitar, ou seja, jogando videogame, oras! Afinal, o que horas isolado do mundo real e mergulhado em um mundo de fantasia faz conosco, não é mesmo? Só fico imaginando o quanto a comunidade gamer deve ter ficado revoltada com a revelação desse segredo… Bem, seja como for, Mãe foi enganada novamente. Primeiro, foi engravidada, depois levada a crer que Número 7 era só fofura e, agora, o véu da avó a cobre como uma camisinha particularmente resistente, tornando fácil sua hibernação e, claro, vida lá no ambiente virtual onde foi impregnada (olha o videogame novamente aí!). E com Campion e o bebê de Tempest já ganhando “casquinha”, parece que a comunidade sobrevivente não terá muito tempo na superfície de Kepler 22-b.

Mas o lado puramente humano não foi esquecido e é ele que leva ao final WFT? que abordei no primeiro parágrafo. Mãe, que também erroneamente se alia a Marcus, deixa o diabo entrar em sua casa, já que o que o ex-Profeta quer de verdade é conseguir seus poderes e status antigos, com mais um mergulho lá naquele buraco sem fundo onde ele reviveu uma das criaturas por alguns segundos. O único detalhe é que Lucius, “infectado” pela voz de Sol, é um obstáculo em seu caminho, mas não da forma que o próprio Lucius imagina. Afinal, o último mitraico quer, ao mesmo tempo, vingar-se de Marcus e tornar-se o novo Profeta (todo mundo sabe que igreja dá dinheiro pacas!) e crucificá-lo de cabeça para baixo lá na árvore-serpente com aquele capacete assustador é tudo de bom. A questão é que ele não sabe que tudo aquilo, ao que tudo indica, foi um plano de Sol (ou seja lá o que for o sinal) para – e agora estou especulando loucamente – para extirpar Marcus do corpo de Caleb e usar Caleb para seus fins, talvez até “encarnar” no mitraico morto há décadas.

O que será disso tudo, eu não faço ideia. A única coisa que sei é que estou muito curioso para continuar acompanhando essa loucura dadaísta audiovisual de ficção científica e descobrir se Guzikowski, como os Cilônios, tem um plano, ou se ele está fazendo tudo só na orelhada, na base do “me engana que eu gosto”. E olha, mesmo que estejamos sendo enganados, já digo logo que estou realmente gostando. E muito.

Raised by Wolves – 2X08: Happiness (EUA, 17 de março de 2022)
Criação: Aaron Guzikowski
Direção: Lukas Ettlin
Roteiro: Aaron Guzikowski
Elenco: Amanda Collin, Abubakar Salim, Niamh Algar, Travis Fimmel, Jordan Loughran, Felix Jamieson, Ethan Hazzard, Aasiya Shah, Ivy Wong, Peter Christoffersen, Selina Jones, Morgan Santo, James Harkness, Kim Engelbrecht, Jennifer Saayeng
Duração: 49 min.

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