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Crítica | “Renaissance” – Beyoncé

Vamos dançar!

por Kevin Rick
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I’m lookin’ for motivation
I’m lookin’ for a new foundation, yeah
And I’m on that new vibration
I’m buildin’ my own foundation, yeah
Hold up, oh, baby, baby

Depois do intimista e denso Lemonade, Beyoncé retorna com um álbum bastante diferente em Renaissance. Desde que lançou seu disco que abordava os seus problemas de casamento e a sua família, a artista fez algumas colaborações interessantes em Everything is Love (com seu marido Jay-Z) e The Lion King: The Gift (disco conceitual baseado em O Rei Leão), com ambas as obras olhando com confiança e orgulho para diferentes facetas da artista, seja uma reverência para heranças afro-americanas, seja para uma valorização própria com suas canções e videoclipes de “realeza” com Jay-Z. Renaissance bebe desses mesmos tipos de elementos temáticos, celebrando a música negra, a cultura LGBTQ+ e puros prazeres humanos, como dançar e fazer sexo.

A grande diferença deste lançamento para Lemonade está justamente no senso de diversão que Beyoncé busca com o ouvinte, começando pela parte lírica que foca mais em sensualidade e alegria do que seu lado político e introspectivo, também mudando de seu habitual R&B e pop para uma mistura de house, funk e disco, trazendo representações culturais de dancehall, o cenário ballroom e, claro, as pistas de dança dos anos 70/80. Essas inspirações clássicas são mescladas com gêneros e recursos atualmente populares como trap, afrobeats, hip-hop e muitos samples que dão uma cara retrofuturista para o álbum em todo o seu DJ mix com uma das engenharias de som mais polidas e complexas que iremos ouvir no mainstream.

I’M THAT GIRL abre a lista de faixas com aquela autoconfiança de Beyoncé que citei no começo da crítica, incluindo o irônico e provocativo canto de fundo “Please motherfuckers ain’t stopping me” para uma letra que sabe ser vaidosa, segura de si mesma e representativa sem cair no exibicionismo de ostentação que vemos no cenário pop. Melodicamente falando, a canção tem muita inspiração latina, passando pelo dancehall jamaicano e o dembow dominicano, ambos inspirações para o popular reggaeton que ouvimos aos montes hoje em dia. Podemos sentir isso nas batidas ecoantes da canção, mas a melodia também traz misturas pops com sintetizadores e um estilo vocal semi-rap que a cantora tem dominado há anos.

Logo em seguida temos COZY, uma faixa mais próxima da identidade dançante do álbum em sua produção totalmente voltada para o eletrônico e o house, com batidas que começam a nos lembrar da música disco. Os versos sobre amor próprio e com acenos diretos para a cultura LGBTQ+ são acompanhados por um ritmo uptempo que caracteriza a maioria das faixas de Renaissance. BREAK MY SOUL é uma faixa semelhante, só que ainda mais complexa e em êxtase, com uma produção de piano-house, o melhor gancho da obra e um estilo de remix incrivelmente coeso. É uma música que nasceu para as pistas de dança e que nos dá uma carga de energia pulsante.

A terceira faixa do álbum é a sensacionalmente estranha ALIEN SUPERSTAR. É mais uma canção com elementos do dance music e do techno, mas há uma harmonia expansiva aqui, passando por rap, uma linha de baixo muito forte e uma melodia um tanto cósmica, me lembrando as odisseias de David Bowie. Também é marcante como Beyoncé transita entre o freestyling e os vocais suaves de R&B/Pop na canção.

Depois dessa viagem espacial, nós temos CUFF IT, a música mais divertida da produção. É uma canção puramente disco e funk, seguida de um ritmo delicioso de guitarra e uma das letras mais gostosas e sexys que ouvi de uma artista recente (junto com Bruno Mars). Beyoncé traz aquele erotismo vivo e envolvente de músicos como Marvin Gaye. É uma canção surpreendentemente radiofônica, mas também feita para boates e com uma pegada underground, demonstrando a complexidade sonora e temporal do álbum. É vintage mas também é atual.

A transição desta canção para ENERGY é direta e soberba, mantendo o mesmo groove com o ouvinte, mas a faixa caminha mais para inspirações jamaicanas, afrobeats e reggaeton. Eu gosto do conceito por trás do segmento, incluindo a interessante participação do rapper Beam, mas não é uma produção que me agrada em contraste com o disco-funk de outras faixas. Também acredito que, estruturalmente, a canção fica espremida entre as excelentes CUFF IT e BREAK MY SOUL, transformando-a quase num interlúdio esquecível.

As coisas ficam interessantes com CHURCH GIRL. É uma música um pouco na contramão da identidade de Renaissance, com um ritmo de queima lenta e uma linha melódica gospel, incluindo coros e uma letra com partes cristãs, mas que paradoxalmente tem segmentos de hip-hop e batidas traps. É a música mais pessoal do disco, com o eu-lírico demonstrando diferentes ângulos da sua experiência como mulher, crente e artista. O fato de que a música funciona nessa mistura de versos e melodias, ainda conseguindo ser dançante na sua reta final, é um verdadeiro milagre.

PLASTIC OFF THE SOFA também traz um lado mais conhecido de Beyoncé, com uma letra, vocais e arranjos típicos de um R&B progressivo e uma pegada de neo-soul também. É uma canção romântica e o mais próximo de uma balada no álbum. VIRGO’S GROOVE segue com a pegada mais romântica, só que mais vocalmente e liricamente sensual, também retornando com a vibe disco funk da obra, ainda que com uma harmonia relaxada e sedutora em seus seis minutos de persuasão erótica. Vemos elementos similares na lasciva SUMMER RENAISSANCE, canção que fecha o álbum com perfeição.

A obra ainda tem outras faixas excelentes, como a dancehall MOVE, contando com ótima participação de Grace Jones; a techno e cheia de afrobeats HEATED, que tem um dos vocais mais bonitos da cantora; e a PURE/HONEY que vai fundo no cenário ballroom. Essas músicas traçam muitas semelhanças com as que analisei mais detalhadamente acima, demonstrando uma consistência técnica e uma identidade do álbum dentro de seus experimentalismos e variações.

Renaissance nos apresenta uma Beyoncé sem medo de inovar e de se arriscar, trazendo seu álbum de estúdio mais impressionante sonoramente e artisticamente. É uma obra tecnicamente ousada para a cantora, integrando house, hip-hop, soul, funk e, acima de tudo, disco e dance music para experimentar com o R&B e o pop que a tornaram icônica, mas com uma coesão ímpar e com um cuidado harmônico absurdo. Renaissance é sexy e super divertido, feito para celebrar nossos desejos e essências, feito para dançar e ficar em êxtase.

Aumenta!: CUFF IT, BREAK MY SOUL
Diminui!: ENERGY
Minha canção favorita do álbum: CUFF IT

Renaissance
Artista: Beyoncé
País: EUA
Lançamento: 29 de julho de 2022
Gravadora: Parkwood, Columbia
Estilo: Dance, pop, R&B

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