Home TVTemporadasCrítica | Respira: 1ª Temporada

Crítica | Respira: 1ª Temporada

Um drama médico espanhol sobre os dilemas pessoais e profissionais de personagens diversos em um hospital público.

por Leonardo Campos
3,8K views

A expressão “respira” é frequentemente utilizada em momentos de grande ansiedade ou estresse. O seu significado é mais profundo do que simplesmente solicitar que alguém pare e respire. Ela carrega consigo uma série de conotações emocionais e psicológicas que podem ser desvendadas através de sua utilização em situações extremas. É assim que podemos encarar a titulação do drama médico espanhol em questão, trama já renovada para segunda temporada que nos apresenta os conflitos entre enfermeiros, médicos, pacientes e demais envolvidos na prestação de um serviço público de saúde à beira do colapso. Em primeiro lugar, “respira” funciona como um convite à calma. Quando uma pessoa se encontra em uma situação inquietante, como uma crise emocional ou uma emergência, o organismo pode entrar em modo de luta ou fuga, resultando em reações físicas e mentais intensas. Ao dizer “respira”, o interlocutor está, muitas vezes, reconhecendo esse estado de urgência e, ao mesmo tempo, oferecendo uma estratégia para enfrentá-lo. A prática de respirar profundamente ativa o sistema nervoso parassimpático, que ajuda a reduzir a frequência cardíaca e a promover a tranquilidade.

Além disso, essa expressão representa empatia e suporte emocional, algo que tem tudo a ver com o que contemplamos, também, ao longo dos episódios do drama médico. Muitas vezes, quando alguém está vivenciando um momento desafiador, a simples presença de outra pessoa que diz “respira” pode servir como um lembrete de que não estão sozinhos. É um sinal de que alguém se importa e está disposto a ajudar a lidar com a situação. Essa conexão humana é vital em momentos de crise, pois promove um sentimento de segurança e pertencimento. No geral, “respira” também encapsula a ideia de que a vida é feita de altos e baixos. Enfrentar situações extremas faz parte da experiência humana, e a expressão sugere que, mesmo diante de dificuldades, é possível encontrar um momento de pausa para reavaliar e buscar clareza. Assim, “respira” se torna não apenas um conselho prático, mas uma filosofia de enfrentamento, que encoraja a resiliência diante dos desafios. E, batalhas e obstáculos são o que mais os personagens encontram em suas jornadas diárias, seja na posição de profissional de saúde, seja no lugar de alguém desesperadamente necessitado de atendimento.

Criada por Carlos Montero, Respira é uma adição significativa ao gênero de dramas hospitalares, trazendo à tona questões sociais pertinentes e atuais sobre o sistema de saúde público em Valência, Espanha. Com uma trama envolvente que se desenrola no Hospital Joaquín Sorolla, a produção não se limita a descrever a vida de médicos e enfermeiros, mas mergulha nas complexidades e nas pressões que esses profissionais enfrentam em suas rotinas diárias. A direção de Guilherme Escribano e David Pinillos, entre outros, garante uma execução precisa que equilibra a dramatização e a realidade. Ao lado de médicos bonitões e dos enredos emocionais, a produção também oferece uma crítica profunda à precariedade do sistema de saúde, permitindo que os espectadores se conectem não apenas emocionalmente, mas também intelectualmente com os desafios que essa profissão enfrenta. No calor da ação diária do pronto-socorro, Respira nos apresenta personagens que são mais do que rostos bonitos. Eles encarnam a luta contra a adversidade. Os profissionais de saúde retratados no drama médico enfrentam condições adversidades no ambiente de trabalho, com baixos salários, falta de equipamentos e escassez de recursos essenciais. A criação de um ambiente tão desafiador evidencia como o sistema de saúde pública pode ser pressionado, levando os médicos a trabalhar em condições que muitas vezes superam seus limites.

A decisão de incluir uma paciente ilustre como Patricia Segura, interpretada por Najwa Nimri, como uma figura central, eleva a narrativa a um novo patamar, catalisando discussões críticas sobre o impacto da política na saúde. Essa abordagem permite que a série não só funcione como um entretenimento, mas também como um espelho que reflete as dificuldades enfrentadas pelos profissionais na vida real. Ao inserir uma figura ficcional envolvida com o estado, a produção estabelece pressões de ambos os lados: tanto ela se enxerga em um cerco apertado, quanto começa a dificultar o trabalho alheio para se desviar do alvo de polêmicas em torno de sua imagem, prejudicada por escolhas burocráticas e partidárias que prejudicam determinadas ações em um sistema de saúde que ela mesma vai precisar para enfrentar uma doença. Em decorrência dos desafios enfrentados, a série também apresenta a trajetória do jovem médico Biel, vivido por Manu Ríos, que representa a expectativa e a realidade de muitos novos profissionais no sistema de saúde. A jornada de Biel, que sonha em mudar vidas após anos de estudo, rapidamente se transforma em uma reflexão amarga sobre as limitações do sistema que ele tanto deseja servir. Ao decidir apoiar uma greve geral organizada pelos setores administrativos do hospital, Biel se vê confrontado com a dura verdade de que seus sonhos de carreira podem estar ameaçados por um sistema que não valoriza adequadamente seus esforços.

A greve, que surge como um ponto de ruptura, aborda não apenas o descontentamento em relação ao tratamento dos funcionários, mas também a urgência de se discutir um modelo de saúde que permita a dignidade tanto para os trabalhadores quanto para os pacientes. Assim, embora Respira não introduza inovações radicais ao gênero de drama médico, sua efetividade reside na capacidade de capturar o espectador de forma envolvente. A trama, embora marcada por dramas comuns a muitas produções similares, consegue manter um ritmo satisfatório em seus oito episódios, incentivando os espectadores a refletirem sobre questões sociais e a condição do sistema de saúde. Carlos Montero, ao afirmar que a série se baseia em questões amplas e não em histórias específicas, abre espaço para uma discussão que vai além da narrativa, tornando-a um espaço de debate sobre a saúde pública e suas dificuldades, isto é, a produção se destaca como uma reflexão sobre o estado atual do sistema de saúde da Espanha, desafiando o público a considerar não apenas o sofrimento dos personagens, mas também o sofrimento real enfrentado pelos profissionais de saúde em suas jornadas diárias.

Com uma trama que equilibra drama humano e considerações sociais, Respira mostra-se relevante em um mundo onde o tema da saúde pública é frequentemente debatido. A série capta não somente a beleza das relações interpessoais e o fervor da vida hospitalar, mas também expõe, de maneira corajosa, a fragilidade de um sistema sobrecarregado. Este equilíbrio entre entretenimento e reflexão faz do drama médico uma série que merece sim, ser assistida, não apenas para se divertir, mas para provocar discussões sobre um tema que afeta a sociedade como um todo. O que o drama consegue, em última análise, é inspirar os espectadores a olhar para o futuro do sistema de saúde não apenas como um mero espectador, mas como parte de uma discussão vital que envolve todos. Portanto, é um painel com oito episódios que consegue ir além das tramas convencionais e convida todos nós a refletir sobre o que realmente significa cuidar da saúde em tempos desafiadores. E, sobre sua entrega no âmbito da estética, a direção de fotografia dividida por Oscar Durán e Raquel Fernandez Nuñez entrega o essencial, colocando os espectadores em uma atmosfera hospitalar, trabalho também assertivo do design de produção de Carlos Bodelón. Bom trabalho de Lucio Godoy na trilha sonora também.

Agora, é o público que acompanhou e gostou respirar e, aguardar, os novos episódios.

Respira: 1ª Temporada (Espanha – 2024)
Criação: Carlos Montero
Direção: David Pinillo, Marta Font
Roteiro: Carlos Montero, Carlos Ruano, Guillermo Escribano Pablo Saiz
Elenco: Alex Medina, Najwa Nimri, Aitana Sánchez-Gijón, Blanca Suárez, Manu Rios, Borja Luna, Macarena de Rueda, Ana Rayo
Duração: 45 min. (Cada episódio – 08 episódios)

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais