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Crítica | “Ride the Lightning” – Metallica

por Iann Jeliel
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Ride the Lightning

I have lost the will to live Ride the Lightning
Simply nothing more to give
There is nothing more for me
Need the end to set me free

Apesar de ser rockeiro de nascença, tenho uma certa dificuldade com o metal a grosso modo. Especialmente no gênero thrash, o qual Metallica consolidou. Fato é que, fora essa, são raríssimas as bandas dessa vertente mais agressiva que genuinamente me estimulam, porque sinto uma construção vinculada a um apelo lírico simplista sobre as fortes repetições batucadas no instrumental e gritos cansativos contando histórias de elementos mitológicos, com pouca sofisticação temática de fundo. Logicamente, esse não é o caso do segundo álbum da discografia principal de Metallica, que um ano após o primeiro disco, Kill ‘Em All, apresenta uma assustadora evolução e maturidade musical que consolidou a banda a um pedestal das maiores de heavy metal em todos os tempos.

Ride the Lightning é essencialmente um disco político, englobado numa embalagem filosófica a discutir os mais diferentes princípios da morte, algo em que a banda viria a se tornar especialista. A aplicação do thrash aqui, diferente do seu primeiro experimento visando mais a estilística – muito reflexo de uma banda que queria chamar atenção inconsequentemente –, era também para reforçar as diretrizes objetivas das letras, em que a agressividade instrumental daria ênfase aos apontamentos críticos direcionados a pontos problemáticos da sociedade (a questão carcerária, o desentendimento ideológico levando a confrontos bélico) e do comportamento humano (vingança, corrupção, depressão pós-perda), ou tudo que levava a fatalidades. Além disso, a intensidade na velocidade estava mais dosada, seguindo uma crescente temporal bem desenhada pelos articulistas James Hetfield e Cliff Burton (vocalista e baixista, respectivamente, responsáveis pela maioria das letras com a ajuda de revisão do baterista Lars Ülrich), mesclando aberturas com elementos remetentes ao metal clássico com uma progressão simétrica das estrofes à aparição da melodia mais pesada.

A abertura do Lado A com Fight Fire With Fire anuncia o tom frequentemente transicional de ritmo, começando na calmaria para entregar a tempestade com mais impacto, ainda dentro de uma sofisticação instrumental charmosa, sem deixar de ser ofegante. Ride the Lightning seria o mais próximo de um respiro, pois a letra realça uma melancolia desconfortante quando expõe a injusta discussão da responsabilidade de se tirar uma vida por justiça. Contudo, instrumentalmente, não perde o fôlego para a sequência a seguir, com as duas melhores canções da seleção. For Whom the Bell Tolls e Fade to Back são obras-primas do metal e definitivamente alavancam o patamar deste álbum. Ambas as canções possuem um nível de complexidade musical em sua construção pouquíssimas vezes reproduzido. A primeira, guiada por um baixo introdutório extremamente estimulante, entrecorta no meio o vocal grave de James, precisamente calibrado com o ritmo. A segunda, aberta com os acordes baixos e vozerio calmo melancólico, pega no meio uma identidade baladeira enquanto o eu-lírico questiona sua posição sentimental e no final transforma-se em um desabafo de escala épica, fechando com um dos maiores solos de guitarra da história do rock – Kirk Hammet gênio!

Há quem diga que o Lado B seja um pouco mais fraco que as quatro primeiras canções, mas particularmente discordo e tenho uma opinião impopular sobre ele. Considero Trapped Under Ice e Escape canções subestimadas, com uma construção harmônica interessantíssima de solos, riffs e vocais, sendo bem semelhante às duas anteriores tão elogiadas, com o diferencial de se arriscarem um pouco além do território da morte na temática. Enquanto isso, a elogiadíssima Creeping Death, colocada no hall das melhores músicas da banda, hino presente em todos os seus shows, considero a mais “fraca” do álbum. Talvez por ser a mais remetente ao padrão do álbum antecessor, esse metal mais cru e inconsequente, com diversas quebras de ritmo, não para um descanso, mas para fornecer um novo nível de intensidade, em determinado momento, a longa canção deixa de empolgar e cansa. Não me entendam mal, ainda é ótima música e nem de longe abaixa o nível do álbum, principalmente por ter, igual todas as outras, um lado instrumental absolutamente fantástico. Algo comprovado na finalização do disco com outra obra-prima, mas desta vez, somente instrumental. The Call of Ktulu é a orquestra definitiva sobre a mitologia lovecraftiana. É um pecado ela nunca ter sido usada em alguma adaptação cinematográfica do autor.

É difícil dizer que Ride the Lightning seja o ápice de maturidade sonora de Metallica, visto que em termos de experimentalismo técnico ainda teríamos o divisivo álbum negro, lançado algum tempo depois. No entanto, dentro do terreno assumidamente trash de origem, é sem dúvidas o mais bem executado, uma aula de como elaborar um controle prévio de um descontrole, para fazê-lo ser literalmente incontrolável em seus ápices emocionais.

Aumenta!: For Whom the Bell Tolls, Fade to Back e The Call of Ktulu
Diminui!: Creeping Death
Minha Canção Favorita do Álbum: Fade to Back

Ride the Lightning
Artista: Metallica
País: Estados Unidos, Reino Unido
Lançamento: 27 de julho de 1984
Gravadora: Megaforce Recrods, Music For Nations, Elektra Estados Unidos, Vertigo Reino Unido
Estilo: Heavy Metal, Thrash Metal

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