Home FilmesCríticas Crítica | Santo Agostinho (1972)

Crítica | Santo Agostinho (1972)

por Fernando Campos
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Em uma passagem da bíblica, no livro de Mateus, Jesus é questionado por um jovem sobre como conseguir a vida eterna. Então, Cristo respondeu:Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, e segue-me”. Ao ouvir isso, o rapaz se retirou entristecido, visto que possuía muitas propriedades. Essa parte mostra como um dos princípios do cristianismo é a caridade e o desapego a bens, evidenciando a hipocrisia de certos líderes religiosos, do presente e do passado, que usam suas posições para o enriquecimento pessoal. Inclusive, algumas religiões vendem falsas promessas de sucesso, como se isso fosse uma virtude aprovada por Deus.

Uma das poucas figuras cristãs que realmente tentou viver a palavra de Cristo, e elaborou uma filosofia própria sobre ela, foi Santo Agostinho. Por isso, o bispo tornou-se uma referência não só católica, mas também filosófica, com falas que abordavam a alma humana e como se tornar divino como Cristo através do desapego às vontades da carne.

Em 1972, em uma série de filmes para a TV sobre filósofos históricos, o diretor italiano Roberto Rossellini tomou Santo Agostinho como personagem e deu seu olhar para o religioso. A cinebiografia foca a principal fase da vida e obra de Agostinho: o momento em que se torna bispo de Hipona.

Acompanhamos a vida e pensamentos de Agostinho em meio a dois conflitos da época: dentro do Império Romano, que passava pela queda, e do cristianismo. Em Roma, alguns poderosos achavam que o cristianismo enfraquecia o império, devido às palavras de misericórdia e perdão. Já dentro da religião, algumas vertentes se colocavam como superiores. Diante desses conflitos, Agostinho se mostrava um pacifista, que abria seu mosteiro para acolher qualquer um, até inimigos. Além disso, devido aos questionamentos que sofria, por ser considerado exageradamente justo e humilde, o filósofo elaborou seu maior legado para a filosofia, o conceito de que o ser humano é composto por corpo e alma, sendo a carne a responsável por corromper o espírito.

Para o bispo de Hipona, como o filme mostra, Roma caiu porque se deixou levar pela luxúria e prazeres do corpo. Já religiosamente, o padre achava necessário abandonar bens e futilidades para se dedicar exclusivamente à fé em Cristo e buscar a graça Dele. Para Agostinho, o ser humano só pode ser divino agindo através da alma. Um exemplo disso está na cena em que ele abre mão de posses que eram direito da Igreja para passar para um rapaz necessitado.

Portanto, Santo Agostinho se apresenta como um filme pedagógico, trazendo frases e passagens do filósofo. Nessa estratégia, a direção de Rossellini opta por uma estrutura tradicional, abrindo mão de qualquer plano complexo, focando na reconstrução de época, através de cenários, figurino e penteado. Até mesmo o design som ajuda na proposta, inserindo diversos ruídos diegéticos, como vozes ao fundo, choro de criança ou barulhos de animais, que ajudam a dar vida aos cenários.

Porém, mesmo que o realizador seja bem sucedido na proposta inicial, falta dramaticidade. Sem uma construção dramática eficiente e uso da linguagem para aproximar os personagens do público, toda a narrativa parece distante para quem assiste, como se fosse uma peça rica em conteúdo, mas com ritmo e forma cansativos. O resultado disso é o desgaste a partir da metade do longa, tornando a experiência cansativa. 

Santo Agostinho é uma experiência educativa, especialmente para quem não conhece o filósofo. Quem busca uma iniciação sobre a obra do bispo, encontra no filme uma iniciação eficiente. Porém, analisando o longa como uma peça artística, falta uma dramaticidade que permitiria ao público se envolver com o universo apresentado e elaborar sua própria visão sobre os conceitos apresentados.

Santo Agostinho (Agostino d’Ippona) – Itália, 1972
Direção: Roberto Rossellini
Roteiro: Roberto Rossellini, Luciano Scaffa, Carlo Cremona, Marcella Mariani
Elenco: Dary Berkani, Virgilio Gazzolo, Cesare Barbetti, Bruno Cattaneo, Leonardo Fioravanti, Dannunzio Papini, Giuseppe Mannajuolo, Livio Galassi, Fabio Garriba, Giuseppe Alotta, Pietro Fumelli, Valentino Macchi
Duração: 121min

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