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Crítica | Semente do Mal

por Luiz Santiago
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O cineasta Billy Wilder representa um período em que a indústria hollywoodiana prezava pelo elegante (“filmes lindos para pessoas lindas”, conforme slogan da MGM), pelos diálogos afiados e por uma aura levemente social e satírica, fortemente inspirada pela comédia de costumes europeia.

Ao lado de Ernst Lubitsch, Fritz Lang, George Cukor e Frank Capra, o diretor encabeçou a lista dos realizadores que melhor trabalharam seus roteiros e que melhor criticaram, denunciaram ou satirizaram o mundo onde viviam, não deixando a tal elegância de lado mas, muitas vezes, colocando-a em xeque e mostrando como o belo também poderia ser uma aterrorizante prisão. Essas características já podem ser vistas de forma leve desde o primeiro filme de Wilder, Semente do Mal (1933), filmado na França, onde o jovem cineasta morou antes de partir para os Estados Unidos.

Semente do Mal é um daqueles filmes cuja aparente simplicidade pode minimizá-lo aos olhos de espectadores mais desatentos. No entanto, Wilder e Alexander Esway, com quem dividiu a direção, conseguiram a proeza de fazer uma obra de estreia completamente pontuada de poesia narrativa e forte tendência de sátira social. A história do filme é simples: um dandy parisiense se vê sem suas mordomias porque seu pai decide fazê-lo trabalhar. Ao roubar um carro, é perseguido por uma gangue que cuida dos “negócios de automóveis de Paris”. Na oficina de desmontagem para onde é levado, o jovem se afeiçoa a um dos membros da organização — um garoto que coleciona as gravatas que rouba — e também à sua irmã, por quem se apaixona. Por suas idéias de igualdade entre os membros do grupo, inclusive na divisão do dinheiro da venda dos carros roubados, o jovem ganha a antipatia do patrão e o filme caminha para um final trágico que se concretiza em partes.

Wilder trabalha todos os elementos desse conto urbano de uma forma livre de amarras e que é abraçada aqui e ali por comicidade, pontos emotivos e uma forte indicação visual de busca pela liberdade, algo que o espectador nota muito cedo porque quase todas as sequências são externas, com tomadas nas ruas e sempre a bordo de um carro. Por essa característica móvel de sua forma interna, o filme ganha uma grande agilidade, que é reafirmada pelas várias cenas de perseguição que traz, elemento que se tornaria recorrente em toda a filmografia do diretor. Além desta, podemos ainda citar outras características do cinema de Wilder que já são vistas em Semente do Mal, como a dificuldade para a concretização do par romântico, a oposição entre classes sociais, como a riqueza fascina os pobres e a relação entre valoes pessoais ou de grupo, a polícia e o indivíduo.

Não estamos diante de um filme político ou essencialmente de crítica social (este não é o foco do diretor), mas há nuances dessa característica aqui. Semente do Mal é um conto urbano que aborda um dos “problemas” da metrópole parisiense. Wilder inicia a sua carreira com um filme sobre as várias dificuldades de relacionamento entre as pessoas dentro de suas realidades, narrando as desventuras dos personagens com uma simplicidade que destoa da pompa em voga nos anos 1930, mas que muito se assemelha à liberdade das externas que futuramente seria tão prezada pela Nouvelle Vague. Semente do Mal é uma obra quase completa, bem dirigida e finalizada, o primeiro passo de um diretor que legaria ao cinema inúmeras obras-primas, que é praticamente toda a sua filmografia.

Semente do Mal (Mauvaise Graine) – França, 1934
Direção: Alexander Esway, Billy Wilder
Roteiro: Max Kolpé, Jan Lustig, Claude-André Puget, Billy Wilder
Elenco: Danielle Darrieux, Pierre MIngand, Raymond Galle, Paul Scoffier, Michel Duran, Jean Wall, Macel Maupi, Paul Velsa, Georges Malkine
Duração: 86 min.

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