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Crítica | Sexo Sem Compromisso

por Davi Lima
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Como várias comédias românticas, o inverso excitante é a resolução pragmática, romântica, que se descobre no percurso cômico da  história. Neste filme, se a grande máxima estimulante é fazer sexo sem compromisso, ela na verdade é a busca pelo compromisso que não se quer admitir. Nisso, o máximo que o diretor Ivan Reitman (Os Caça-Fantasmas, A Grande Escolha) alivia de uma comodidade excessiva dentro do subgênero, que se estampa no título da obra que será invertido, é o humor naturalizado que ele extrai na peça interpretada pelos atores Natalie Portman e Ashton Kutcher, que simpatizam com as escolhas e as não escolhas do casal.

A tal naturalização que remete principalmente à interação dos protagonistas se vale pela junção bem casada do elenco Natalie Portman e Ashton Kutcher. Eles não precisam necessariamente ter química, porém ambos conseguem tornar a caminhada para a cama como um real desejo sexual natural, de forma que a atuação dos atores contribui na criação da contradição de que o ato vai assumindo o compromisso na cena de sexo romântico diante de suas personalidades antagônicas para um casal. A sensação é que os personagens de fato mudam no ato sexual de maneira transgressora sem qualquer preliminar, o que vai revelando o porquê da condição concorrente entre eles, tanto do descompromisso quanto do valor exacerbado que é dado à personalidade de cada um. 

Por isso, seus conflitos são tratados com parcimônia no filme a partir da apresentação direta, em que os atores fazem valer as palavras do roteiro que descrevem bem um homem carente e uma mulher orgulhosa. E a partir disso surge a comédia, em como o ser de cada um dos personagens vai se revelando paulatinamente nesse almejar do sexo como fuga direta da também explícita diferença entre eles, e mesmo o espectador sabendo que vai dar namoro, também sabe que há algo que irá impedi-los classicamente.

Mas o que impressiona, além de como os atores naturalizam o roteiro, é como o diretor Ivan Reitman ainda consegue usar essa dinâmica da comédia romântica a seu favor, dirigindo o que dá ênfase à capacidade interpretativa dos dois atores. Se Natalie Portman consegue se transformar de maneira mais intensa na sua personagem, a comédia surge em como ela vive a incongruência de estabelecer o sexo sem compromisso para ter tempo no trabalho quanto mais ela quer demorar na cama. Já Ashton Kutcher é o que se submete a não compromisso com expectativa exatamente por atuar em tons semelhantes. Porque nunca de fato dá namoro entre os personagens, é sempre uma tentativa de disfarce da personalidade de cada um com gestos de compromisso e descompromisso, como a cena da trilha sonora sobre menstruação e a visita para tomar satisfação de traição. O que torna de fato essas cenas engraçadas são as atuações, em que Natalie Portman usa toda a performance de voz e capacidade de improviso físico para comédia, enquanto Ashton usa sua carinha bonita para ironizar ou usa humor físico de dar murros nas paredes e bater a cabeça na mesa. E como ambos os personagens têm os pés na realidade, essas ações realmente quebram a expectativa.

No entanto, o grande problema do filme é como finalizar uma construção tão natural seguindo essa harmonia. Quando a trilha sonora e o drama desmancham a naturalização dos personagens, como um efeito de evidência das provas de um romance em meio ao descompromisso dele, mesmo que Ivan Reitman crie um tipo de nova linguagem para explicitar o amor entre os personagens, renega uma dinâmica desenvolvida como se a atuação agora fosse ensaiada demais para um efetivo romance vindo de algo muito improvisado. Soa como se o diretor deixasse finalmente no piloto automático das comédias românticas, quando ele parece realmente saber transformar o clichê em algo mais interessante com seu elenco, como nas cenas do empurrão nas lâmpadas que o policial tem que interferir, ou até na cena seca da ligação do celular que dramaticamente é bem trabalhada.

Assim, torna-se um filme meio perdido exatamente pelo diferencial da direção se acumular em um espaço burocrático de narrativa, em que tardiamente aborda questões dramáticas, como de fato sempre o romance carrega consigo. O drama acaba sendo um mero escape para um final simbólico, que aprofunda ainda mais a maneira como o filme rejeita a si próprio, com um aperto de mão que não revela um casamento, pois é o deles. A mensagem que se revela no grande humor do sexo sem compromisso é o compromisso inerente ao ato sexual, conclusa num drama, o reverso clássico da comédia romântica. Não que isso esteja em desacordo por si, mas dentro da linguagem do subgênero, nem Ivan Reitman refrescando a comédia com seus atores consegue desatar o nó da defraudação temática de alcançar o romance mais “conservador” sem desenvolvimento, mesmo que tenha seu laço de verdade. Quem dera fosse Jason Reitman (O Favorito, Juno), filho de Ivan Retiman, o diretor do filme para contornar melhor o objetivo conservador do sexo sem compromisso à ideia de casados com intimidade, mas também perderia o valor cômico que torna esse filme tão marcante.

Sexo Sem Compromisso (No Strings Attached) – EUA, 2011
Direção: Ivan Reitman
Roteiro: Elizabeth Meriwether
Elenco: Natalie Portman, Ashton Kutcher, Kevin Kline, Cary Elwes, Greta Gerwig, Lake Bell, Olivia Thirbly, Ludacris, Jake Johnson, Mindy Kaling
Duração: 108 minutos

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