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Crítica | Shazam: Primeiras Aventuras e Origem do Doutor Silvana (Whiz Comics, 1940 – 1941)

por Luiz Santiago
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O originalmente chamado Capitão Marvel (Captain Marvel/William “Billy” Batson) — futuro Shazam! — surgiu nas páginas da segunda edição da Whiz Comics Vol.1, com data de capa de fevereiro de 1940, criado por Bill Parker (roteiro, cores, editoria) e C.C. Beck (arte, finalização, capa). O herói veio na esteira de concepções editoriais frente à fórmula que deu fama ao Superman (personagem da então National Comics, futura DC), e rapidamente caiu nas graças do público, se tornando um fenômeno de vendas, algo que muito incomodaria a NC/DC, gerando, tempos depois, o famoso processo da casa do Azulão contra a Fawcett.

No presente compilado, trago as críticas para as edições #3 a 7 da Whiz Comics, publicadas entre março e agosto de 1940. E também a história de origem do Dr. Silvana e sua filha Beautia, publicada na revista de número 15, em março de 1941.

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Silvana Ataca Novamente e o Reino Venusiano de Silvana

Sivana Strikes Again + Sivana’s Venusian Kingdom

shazam Silvana Ataca Novamente e o Reino Venusiano de Silvana

Classificadas como edições #3A e 3B (por um erro de impressão na capa das revistas, datadas de março e abril de 1940), essas edições dão sequência às aventuras do Capitão Marvel, que fizera sua estreia na Whiz Comics #2. Nas duas revistas temos a presença do Doutor Silvana, sempre com planos bizarros para “conquistar os Estados Unidos”, algo que no roteiro de Bill Parker parece uma representação dos líderes fascistas europeus, deixando de maneira muito presente os reflexos da Segunda Guerra Mundial, então em andamento. A primeira aventura, Silvana Ataca Novamente, é a que mais lembra o momento histórico em que a revista foi publicada. Para dominar a Terra do Tio Sam, Silvana dispõe de um Super-Exército e toda a parafernalha de armas possíveis, algo que aparece no texto sem explicação alguma e some, também sem explicação.

Já na segunda edição (3B), temos um caminho um tantinho diferente, mas com desfecho igualmente questionável. Billy, o menino-repórter, recebe a carta de um cientista de nome Xerxes Smith (pode rir, eu entendo), que desenvolveu um foguete para levá-lo até Vênus. Não há absolutamente nenhuma explicação de como Silvana escapou da explosão do castelo na edição anterior e, nessa toada de “aceitem o mistério“, a história continua, com o cientista chegando com Billy ao planeta Vênus, com Billy se transformando em Shazam na frente do cientista e o seguinte diálogo logo na sequência:

__ Mas… mas… você era um garoto minutos atrás!

__ Um dia eu falarei com você a respeito. Talvez.

Não é necessário dizer mais nada a respeito da suspensão da descrença e falta de explicações para basicamente tudo o que acontece nessas histórias, não é? Ainda assim, existem momentos divertidos e, no todo, a história não trai a visual geral das tramas para o seu público-alvo, ou seja, as crianças. Vale dizer que temos aqui a primeira aparição de Beautia (Linda Silvana, aqui no Brasil), filha do vilão e que lança uma porção de cantadas no inocente Shazam, fazendo o herói corar como um belíssimo por-do-Sol num cálido dia de verão. Mesmo com poucas ou nenhuma preocupação em explicar elementos básicos da narrativa, além de uma série de contradições, essas histórias possuem um charme infantil que faz com que alguma diversão consiga sair de todos esses nós-cegos.

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Beautia Para Presidente!

Beautia For President!

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Aqui já é possível ver uma clara diferença na escrita dos roteiros da revista, com mais texto, mais contexto e explicações necessárias para as questões essenciais da história. Pela primeira vez Bill Parker escreve algo sensato em relação à identidade de Billy/Shazam. Depois da aventura em Vênus, isso precisava ser feito. Fica aqui estabelecido, portanto, que o Doutor Silvana é a “única pessoa na Terra que sabe a identidade secreta do Capitão Marvel!“. Bom… bom… muito bom!

O plot aqui ergue de maneira cômica e cheia de conspirações a ideia de transformar Beautia em presidente dos Estados Unidos, novamente com o roteiro mostrando elementos de seu tempo, com alguém eleito democraticamente para o maior cargo executivo da nação e, depois de colocado no cargo, estabelecendo uma ditadura.

Em contraponto, vemos o roteiro explorar a personalidade neutra de Beautia, que salva Billy e impede que Silvana atire no Capitão Marvel, embora isso não seja um problema para o herói. O desfecho dá a ideia de prosseguimento dos “planos malignos” do vilão maluco e marca a primeira “deportação planetária” de Beautia, que é novamente enviada para Vênus, lugar onde é imperatriz.

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Os Escravos do Dr. Lake    

The Slaves of Dr. Lake

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Após cinco anos de um planejamento cuidadoso, um gênio do crime (sempre afastado das cenas, deixando que outros cometessem os crimes por ele) aperfeiçoa um esquema inteligente para cometer roubos em grande escala. Billy, nosso Capitão Marvel, observa uma onda de crimes varrer o país, dando um prejuízo no valor de 250 bilhões de dólares. O roteiro dessa edição é o meais interessante da revista desde a sua estreia, fazendo valer a presença de Billy como um personagem importante, seja como criança, seja como Shazam.

No decorrer da investigação que ele faz (é engraçado que a política parece totalmente alheia aos fatos…), descobre que os ladrões são, na verdade, crianças e adolescentes hipnotizados por Mister Scar, utilizando uma máquina do verdadeiro vilão da saga, o Dr. Aloysius Lake. Aqui, gostei particularmente da ação que ocorre em várias cidades, sempre com meninos hipnotizados em QGs diferentes, chefes diferentes (até um chinês estereotipado, o Mister Chung, aparece no meio do caminho!) e o mesmo princípio vilanesco: as máquinas hipnotizadoras que forçavam os meninos a cometerem os assaltos, livrando os adultos do trabalho sujo.

Billy Batson se junta à gangue de Washington e é hipnotizado e enviado para roubar pedras preciosas, numa ação que sai mal (para os bandidos) e dá a primeira abertura para que o Capitão Marvel saia caçando os chefes de gangues ao redor do país. Uma instigante e ágil história de gângster.

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O Circo da Morte

The Circus of Death

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E vejam só quem está de volta! Dr. Silvana! Nesta aventura, ele traz de Vênus para a Terra seis foguetes carregados de animais exóticos. Só nesse primeiro momento da narrativa eu tinha um milhão e meio de perguntas, mas é aquela coisa… eis o tipo de situação em que precisamos aceitar o mistério. Com a chegada dos bichos à Terra, Silvana abre um circo. Ele tem a intenção de fazer fortuna e se tornar o homem mais poderoso, controlando a sociedade através do dinheiro — um plano inocente demais, em termos de faturamento, para alguém supostamente tão inteligente como o cientista, mas…

Billy está em campo, fazendo a cobertura radiofônica do circo, algo que é sempre muito bacana de ver. In loco, ele conhece bichos com aparência pré-histórica, sem saber que são de Vênus. O roteiro acaba dando maior atenção para Clarence, o Homem Maníaco, que guarda muitas semelhanças com ancestrais da nossa espécie, embora não seja do nosso planeta.

O brutamontes se apaixona por Lovelia (que eu jurava que era Beautia disfarçada, só que não) e a partir daí, uma história de ciúmes irá se entrelaçar ao grande problema da edição. A forma como o Capitão Marvel lida com os animais é a mais engraçada (e desaconselhável) possível, assim como sua vergonha ao ser paquerado por Lovelia, a bela acrobata. E como era de se esperar, a história termina com Silvana conseguindo fugir para bem longe. Não foi dessa vez, Billy!

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O Esquadrão da Perdição

The Squadron of Doom

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Uma aventura que começa de maneira muito intrigante, com Billy novamente em campo, procurando um furo de reportagem para seu programa de rádio, mas que simplesmente desaba para algo que sempre me incomoda nessas histórias do Shazam da Era de Ouro: o mal uso dos poderes. Ou, em última instância, uma não-justificativa aceitável para o menino não usar os poderes. Nesse texto de Bill Parker, o explorador Rodney Stark descobre uma tribo inteira de homens congelados do período Pleistoceno e cria um meio para trazê-los de volta à vida, treinando-os para construir e pilotar aviões (não perguntem…).

Sim, é isso mesmo que vocês leram. No andamento da história, os homens roubam seis bombardeiros de dois motores, de uma base aérea na Groenlândia. Por ordens de seu “mestre”, os recém-acordados já estão construindo centenas de cópias dessas naves. O propósito do explorador e vilão aqui é, adivinhem só, dominar o mundo.

Já no início da edição a gente vê Billy se encontrando com o explorador e o encontro não sai bem, por diversos motivos. O mais grave desses motivos, no entanto, é o fato de o menino não utilizar os poderes para ir atrás do navio que parte em direção ao Polo Norte, e a questão vai se tornando ainda mais grave à medida que o tempo passa, pois o autor só faz com que Billy diga a palavra mágica no último momento, tornando a trama quase insuportável de se ler, pela estupidez de algumas coisas e pela clara possibilidade de certas tragédias serem evitadas.

O ideal de exploração, de perigos corridos por Billy e tudo o mais, é interessante. Desde o começo da revista vimos que o autor quis fazer com que menino e Capitão Marvel tenham os seus momentos de ação nas páginas. O problema é quando o uso do menino passa a ser injustificado, e aqui vemos isso, especialmente no final. A propósito, o Capitão fala a palavra mágica num momento em que estava sobrevoado a cidade, o que significa que Billy tinha que cair lá de cima e se esbofetar no chão… Ai ai….

Whiz Comics #3 a 7 (EUA, março a agosto de 1940)
Roteiro: Bill Parker
Arte: C.C. Beck
Cores: Bill Parker
Capas: C.C. Beck
Editoria: Bill Parker
12 a 15 páginas (cada edição)

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A Origem do Dr. Silvana

The Origin of Dr. Sivana

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Muita coisa acontece nessa didática, mas interessante revista que nos conta a origem do Dr. Silvana (lembrando que ele aparecera pela primeira vez na Whiz Comics #2, em 1940, mas sem uma história de origem por trás). E para completar, Bill Parker resolveu revelar para Billy, no mesmo roteiro, a verdadeira identidade de Beautia, além de introduzir mais um personagem nessa família, o fortão Magnificus Sivana, também com sua história de origem.

A história até começa de maneira simples, com Billy recebendo um prêmio de jornalismo no rádio e tendo que fazer um discurso, falando do Capitão Marvel (imagina a frustração), mas rapidamente uma série de eventos se juntam — como a saída noturna do herói com Beautia até um restaurante e o consequente encontro com um bandido que já havia marcado a cara do herói. Mesmo com todas essas coincidências, nós entendemos a proposta do autor e curtimos a história na medida do possível.

A verdadeira explicação para o primeiro vilão de Shazam vem apenas no final da revista, narrada por Beautia. E não, não é uma história complicada, é algo bem simples, na verdade. Nos primeiros anos do século XX, Thaddeus Bodog Sivana era uma das maiores mentes científicas de toda a Europa, com invenções e ideias que desafiavam o conhecimento de seus pares e que causavam estranheza em outros, o que atraiu má reputação para o estranho cientista. Aos poucos ele ficou desacreditado e foi perdendo seus meios de sobrevivência, vendo-se sozinho e com dois filhos pequenos.

A esta altura — não se explica como — ele já tinha construído um foguete e então o usa para ir com a família para Vênus, onde se estabelece, até que eventualmente volta para a Terra. A ideia de uma origem familiar me pareceu fantástica e a edição realmente se segura nessa parte final. Não é um enredo totalmente bem escrito, pois existem muitas coincidências e algumas coisas sem justificativa, mas ainda assim é possível se divertir, o que já é um bom ganho.

Whiz Comics Vol.1 #15 (EUA, março de 1941)
Roteiro: Bill Parker
Arte: C.C. Beck
Capa: C.C. Beck
12 páginas

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