Home TVTemporadas Crítica | Slow Horses – 1ª Temporada

Crítica | Slow Horses – 1ª Temporada

Heróis desajustados.

por Kevin Rick
4,2K views

Já assistiram uma obra que está tentando fazer algo inovador dentro de uma história batida, mas acaba tendo dificuldades entre adotar clichês e querer ser subversiva? Essa é a exata experiência que tive com Slow Horses, mais nova adição ao ótimo catálogo da Apple TV+. A série criada por Morwenna Banks, Will Smith, Jonny Stockwood e Mark Denton tem como base um material comum em obras britânicas: o mundo da espionagem, o serviço de inteligência da MI5 e uma trama complicada que envolve traições, segredos e poder. A abordagem narrativa, porém, contém uma certa distinção do que esperamos neste tipo de cenário, trazendo um tratamento mais cômico para o drama de espiões.

Somos apresentados à Slough House, um purgatório administrativo para onde o MI5 manda os agentes que fizeram besteira ou não foram bons o bastante para continuar em Regent’s Park, o coração da inteligência britânica. O departamento é encabeçado por Jackson Lamb (Gary Oldman), um alcoólatra rabugento que trata seus funcionários das formas mais miseráveis possíveis, incluindo River Cartwright (Jack Lowden), um agente promissor que acabou rebaixado após seu vexame num exercício de treinamento público. Cartwright e seus colegas assumem as tarefas mais tediosas e frustrantes do MI5, até que uma estranha investigação leva Slough House ao centro de um evento perturbador: o estudante britânico-paquistanês Hassan Ahmed (Antonio Aakeel) é sequestrado por um grupo de extrema direita que pretende decapitá-lo publicamente.

Dado o contexto, retorno ao questionamento do início da crítica. Slow Horses transita entre uma comédia de espiões e um drama com camadas de suspense, dando à obra uma configuração narrativa confusa e fora de tom. Por um lado, as dinâmicas dos personagens em Slough House emulam uma forma de comédia de escritório, contendo um humor seco, piadas de insulto e escolhas visuais depreciativas, desde a fotografia em tons marrons até a direção de arte “suja” e apática do departamento – existem muitas semelhanças cômicas à versão britânica de The Office, por exemplo. Por outro lado, a trama envolvendo o sequestro de Ahmed é voltada para uma experiência de thriller, incorporada por muitas referências e arquétipos comuns em histórias de espionagem, como as doses de politicagem, os joguinhos de desonestidade e o sistema corrupto de hierarquias e poder.

Vemos os membros da Slough House falharem epicamente em ações constrangedoras, e logo em seguida temos momentos de extrema violência e intrigas políticas, tudo alimentado por uma montagem que não sabe encaixar as transições de tom de forma natural. A experiência geral fica um pouquinho mais equilibrada por causa do humor cínico que se harmoniza melhor com o tom em algumas circunstâncias sombrias da história do que algo como uma comédia pastelona, e também o elenco, em especial Oldman e Lowden, que caminham com naturalidade entre as mudanças de abordagem do roteiro.

O mais interessante é que há ideias boas e ruins nos dois tratamentos da série. A proposta de párias e desajeitados salvando o dia é deliciosamente irônica e os diálogos contêm a afiada e típica acidez do humor britânico, mas Oldman sendo um constante babaca se torna cansativo. Já no outro lado da história, a narrativa lida muito bem com cenas de tensão e as sequências mais cinéticas do diretor James Hawes são surpreendentemente impressionantes, mas também há algumas escolhas ruins, como o estranho núcleo dos sequestradores que não extrai muita substância dramática (muito menos cômica) daqueles personagens, nem explora tão bem alguns elementos propostos, como as críticas à extrema direita e ao preconceito.

Slow Horses é uma obra meio perdida em termos de identidade, tentando balancear uma história de espionagem que é tanto cômica quanto dramática, mas o saldo final é positivo. O humor é uma clara tentativa de inovação dentro do subgênero famoso no Reino Unido, mas a trama de sequestro e traições segue uma cartilha bem comum deste tipo de história, com pessoas corruptas no poder, informações acobertadas e a verdade sendo maleável. Ainda assim, quando a série consegue combinar seus elementos de despretensão e mistério, a narrativa flui bastante (como nas cenas do grupo fugindo dos agentes), e há boas ideias aqui, desde a mistura de humor irônico para a visão de mundo moralmente cinzenta dos espiões, até as dinâmicas divertidas de um grupo de heróis desajustados.

Slow Horses – 1ª Temporada — Reino Unido, EUA, 2022
Criação: Max Borenstein, Jim Hecht
Direção: James Hawes, Jeremy Lovering
Roteiro: Morwenna Banks, Will Smith, Jonny Stockwood e Mark Denton
Elenco: Gary Oldman, Jack Lowden, Kristin Scott Thomas, Saskia Reeves, Olivia Cooke, Dustin Demri-Burns, Rosalind Eleazar, Jonathan Pryce, Antonio Aakeel, Christopher Chung, Sophie Okonedo
Duração: 06 episódios de aprox. 50 min.

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais