Escrito por José de Alencar e publicado em 1872, Sonhos D’Ouro é um romance conhecido por iniciar o seu conteúdo com uma introdução intitulada Bênção paterna. Nessa introdução, o autor expõe o propósito geral da obra e sua estrutura, defendendo a particularidade da língua portuguesa falada no Brasil em contraposição ao português europeu. O romance é estruturado em trinta e dois capítulos e narra a história de amor entre Ricardo e Guida no contexto da sociedade carioca durante o Segundo Reinado. Alencar utiliza a narrativa para criticar sutilmente as hipocrisias e preconceitos da época, ao mesmo tempo em que valoriza os sonhos, o amor e a busca pela felicidade. Junto a isso, o romance também acompanha a trajetória de Jorge, um jovem advogado que se muda para o Rio de Janeiro com grandes esperanças e aspirações. Formado em meio aos rígidos princípios morais e intelectuais de seu entorno, Jorge se depara com a realidade caleidoscópica da cidade, que oferece oportunidades para a sua carreira, mas também apresenta desafios e contradições típicos de uma sociedade em transformação. Por meio da narrativa de Jorge, o escritor explora as tensões entre os ideais pessoais e as realidades sociais, aprofundando a crítica ao contexto em que seus personagens estão inseridos.
Ao longo de suas 216 páginas, o romance, contextualizado no século XIX, revela as críticas do autor à sociedade carioca da época, evidenciando a luta entre o idealismo da juventude e a dura realidade social que Jorge enfrenta. Educado em um ambiente rigoroso, ele encontra na cidade não apenas oportunidades para sua carreira, mas também um cenário repleto de desafios que refletem as contradições de uma sociedade em mudança. Como um dos pontos nevrálgicos, a narrativa se desenvolve através de um triângulo amoroso que envolve Jorge, Carolina e Guida, cada uma representando diferentes facetas de aspirações e status social. Carolina, uma jovem de origem humilde, e Guida, uma mulher da elite, personificam as opções que Jorge deve considerar em sua busca por amor e sucesso. Esse dilema amoroso não só complica suas relações pessoais, mas também se entrelaça com suas ambições profissionais, ilustrando as difíceis decisões que ele deve tomar entre o amor verdadeiro e as conveniências sociais que o cercam.
José de Alencar utiliza a trajetória de Jorge para abordar a corrupção política, as desigualdades sociais e a moralidade pública, apresentando um retrato detalhado do Rio de Janeiro de sua época. Através de diálogos e descrições vívidas, o autor examina como os valores individuais são desafiados pelas seduções do poder e da riqueza, questionando a viabilidade de manter a integridade pessoal em um contexto em que os fins muitas vezes justificam os meios. E, com isso, explorar os tópicos que delineiam o seu amplo projeto literário nacionalista. Ao ler, percebemos que o autor acreditava que a literatura podia ser uma ferramenta de reflexão sobre a identidade nacional. Em seus romances, ele propôs um diálogo com elementos da cultura, religião e tradições brasileiras, ajudando a consolidar a ideia de um Brasil único e plural. Alencar utilizou uma linguagem rica e poética, mesclando o erudito e o popular. Assim, buscou uma forma própria de escrever, que conversasse com a oralidade e os costumes locais, contribuindo para o desenvolvimento do estilo literário brasileiro.
Ademais, os prefácios desempenham um papel fundamental na compreensão e na apreciação de obras clássicas. Embora muitas vezes possam ser considerados como meros textos auxiliares, eles carregam uma profundidade que pode influenciar a interpretação e a recepção da obra ao longo do tempo. Certa vez, em um vestibular da Universidade Federal da Bahia, uma das questões da prova de Linguagens abordou tópicos preponderantes sobre uma determinada obra clássica. Quem tinha lido a versão indicada pela instituição conseguiu se sair bem. Outros que sequer valorizaram a etapa da publicação que antecede o romance em si, não alcançaram os mesmos resultados. Pior para aqueles que leram edições diferentes, sem o conteúdo mencionado. Em Sonhos D’Ouro, muita da força da publicação, para além da história interessante, é a presença do prefácio Benção Paterna, um documento basilar dos nossos estudos literários, passagem onde o escritor José de Alencar explica em pormenores o seu projeto literário nacionalista, nos permitindo compreender a gênese de sua proposta.
Primeiramente, caro leitor, os prefácios permitem uma contextualização histórica e cultural que enriquece a compreensão da obra. Muitas vezes, esses textos introduzem o leitor ao ambiente em que a obra foi criada, fornecendo informações sobre os acontecimentos sociais, políticos e intelectuais que o autor enfrentava. Essa contextualização é crucial, pois uma obra clássica não deve ser vista apenas como um produto isolado, mas como parte de um diálogo contínuo com seu tempo. Além disso, os prefácios podem servir como um meio de o autor, ou mesmo um editor, estabelecer uma conversa direta com o leitor. Muitas vezes, os prefácios contêm reflexões sobre o processo de criação, as escolhas estilísticas e narrativas, e as expectativas que o autor tem em relação à sua obra. Isso permite que o leitor se aproxime do texto com uma perspectiva mais informada e engajada. E é isso que José de Alencar faz de maneira muito eficiente em sua composição prévia ao enredo de Sonhos D’Ouro. Caso vá se aventurar na leitura, não se esqueça do prefácio, combinado? É um texto conciso, mas de reflexões panorâmicas.
Sonhos D’Ouro (Brasil, 1872)
Autor: José de Alencar
Editora: Ática – Série Princípios
Páginas: 216
