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Crítica | South Park: Pós-Covid

South Park Plus ou Minus?

por Ritter Fan
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Vai se f@d&r, Trey Parker!
– Eu, nos 30 segundos iniciais.

A maior paulada que Trey Parker poderia nos dar com o primeiro longa spin-off de South Park exclusivo para o Paramount+ do mega-pacote de 900 milhões de dólares pelos próximos seis anos de conteúdo com a Viacom, acontece logo nos primeiros segundos de projeção, com notícias na tela de um computador mostrando a felicidade mundial com o fim da pandemia de Covid, somente para descobrirmos que estamos 40 anos no futuro, com os agora ex-amigos Stan, Kyle e Cartman beirando os 50 anos de idade. Chega a dar uma dor no coração ver esse início e dá para sentir a maldade escorrendo dos dedos de Parker e equipe ao imaginar algo assim, o que justifica a delicada citação que fiz no começo e que foi minha exata reação, seguida de uma coleção enorme de expletivos do gênero enquanto, com o programa pausado, eu chamava os demais membros de minha família para assistir essa sacanagem suprema.

Mas esse início assustadoramente genial é somente o começo mesmo, pois South Park: Pós-Covid é, em sua primeira metade, uma perfeição de início dessa nova fase, por assim dizer, da criação da dupla Trey Parker e Matt Stone. Na primeira meia-hora, o uso de referências visuais principalmente a Blade Runner e a estrutura de It: A Coisa, com a morte de Kenny (Eles mataram o Kenny! Seus bastardos!) servindo de estopim para a reunião dos amigos há muito separados, com salpicos daquela crítica mordaz costumeira, como a “moda” do uso de “Plus”, “+” e “Max” em tudo, a constante necessidade de se dizer que estamos no futuro e que no futuro não se come carne vermelha, os idosos são importantes e não se faz piadas politicamente incorretas, a campainha de casa canta e a Alexa é uma esposa holográfica (como uma versão de meia idade, franca, desbocada e desiludida da Joi, de Blade Runner 2049), além de uma história bem construída, que vai introduzindo as versões adultas de diversos personagens além da quadra principal, é um hilário deleite audiovisual.

As caracterizações de Stan Marsh como um azedo alcoólatra (ops, na verdade um consultor online de uísque) que vive com a mencionada Alexa, Kyle Broflovski como um sujeito que parou no tempo e permaneceu em South Park sozinho e Eric Cartman como um sensível e educado rabino (sim!), com direito à esposa dedicada e três filhos angelicais é um primor de reimaginação dos queridos personagens que funciona e convence, apesar de ser francamente surreal – ao ponto de exigir uma boa dose de aclimatação – ver principalmente Cartman totalmente transformado. É isso que, para além da concepção desse “futuro” pessimista, preenche South Park: Pós-Covid de vigor cômico e que seguram o telefilme (lembrem-se, não é um episódio ou mesmo um episódio especial, mas sim um média, quase longa metragem de 59 minutos!) por pouco mais do que a duração de um episódio padrão.

Os problemas começam justamente quando chegamos à segunda metade e constatamos que falta outra meia hora, com Parker, então, referenciando mais abertamente South Park: Especial da Pandemia e criando continuidade clara entre as histórias ao mesmo tempo em que ele torna mais complexo o mistério ao redor da morte de Kenny. Essa escolha narrativa detrai do todo e tira até mesmo o foco de Stan, Kyle e Eric, especialmente quando a “novidade” das caracterizações deles como quase cinquentões desaparece e, mais ainda, encerra a história sem encerrá-la de verdade, já que este é a parte um do que parece ser um projeto em duas partes, com a segunda a ser lançada ainda em 2021. O problema maior é que as críticas do roteiro também se esvaem com a dispersão da história causada pela inserção de uma sucessão de mistérios cada vez mais enrolados e pouco característicos da série como um todo, o que não exatamente destrói o que foi feito antes, mas certamente dilui seu impacto.

South Park: Pós-Covid é um excelente episódio da série, um muito bom episódio especial, mas é apenas um bom telefilme da franquia, pois ele perde sua força na medida em que a minutagem vai extrapolando os limites mais conhecidos para essa abordagem (mesmo considerando que há um longa-metragem cinematográfico que foi ainda além e acertou em grande parte). Há riqueza na sátira pessimista de Trey Parker e na construção das versões futuristas dos personagens que povoam o telefilme, mas elas não se sustentam uniformemente ao longo de toda a projeção, com o humor mordaz sendo sacrificado para que elementos mais complicados desse futuro sejam introduzidos, quase que criando um universo próprio ainda a ser realmente desenvolvido. Mas, claro, é uma primeira experiência nesse caminho ainda inexplorado de South Park e só nos resta esperar que Parker encontre seu norte.

South Park: Pós-Covid (South Park: Post COVID – EUA, 2021)
Direção: Trey Parker
Roteiro: Trey Parker
Elenco: Trey Parker, Matt Stone, Mona Marshall, April Stewart, Kimberly Brooks, Adrien Beard, Delilah Kujala, Betty Boogie Parker
Duração: 59 min.

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