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Crítica | Speed Racer

A deformação da imagem com a arte da corrida.

por Davi Lima
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speed

Em 1999 Matrix mudou tudo como as pessoas enxergavam a união da computação gráfica e o corpo. É impressionante ver a capacidade pueril e lúdica de criar um universo que estimula tantos sentimentos vivos com ainda mais ausência de realismo na composição do CGI e a performance de atores. As cores estimulam concomitantemente a mensagem artística da mudança do ser no prazer do ofício, fazendo com que os atores sejam receptáculos de pura honestidade de coração. É tudo tão extremamente sincero na natureza do discurso que emociona na mesma medida em que os efeitos visuais são entranhados no mesmo ano que o cinema realista chega ao auge, com Christopher Nolan e seu Batman – O Cavaleiro das Trevas (2008). Speed Racer vai na contramão, como as irmãs Wachowski gostam, dando um valor ao formalismo da arte que poucos espectadores imaginavam ser possível acreditar, na maneira como o audiovisual pode se harmonizar com imagens tão coloridas e ágeis para criar imersão e entretenimento.

A Mãe, interpretada pela famosa Susan Sarandon, diz “O que você faz é a arte, Speed”, e o misterioso Corredor X fala: “Não importa o que você muda nas corridas, mas o que elas mudam em você”. São essas frases que dizem algo ao protagonista Speed, ingênuo, plenamente caracterizado como criança que também está amadurecendo. São todos os assuntos conectados em uma simultaneidade sentida na própria montagem, e que praticamente o que se diz no roteiro é desenvolvido nas corridas e nos efeitos que o cinema pode fazer. A princípio, parece uma ilustração, apenas, mas o que diferencia o audiovisual, movimento e som, é no que as diretoras se baseiam, ou seja, conceitos básicos para toda a narrativa exista.

Os giros da fotografia – que são concebidos  também de efeitos visuais para manter a coerência da fotografia banhada de tela verde -, os recortes dos atores em constantes transições de cena, como um conflito arrebatador que sustenta o drama – bem semelhante a como fazem as animações japonesas – e os flashes luminosos que expõem a aceleração de tudo na montagem tornam Speed Racer um filme singular e incompreensível para a sua época de lançamento. 

O visual impacta como uma arte moderna do século XX. A introdução do filme chega com um abstrato mosaico geométrico 3D colorido antes da logo da Warner Bros.; as frases feitas do roteiro elevam o potencial dramático diante do campo de guerra da imagem em cores; a trilha sonora de Michael Giacchino (Os Incríveis, Lost, Missão Impossível 3 e Ratatouille) energiza a quinta marcha que liga a March 6, com vocais de coral e tons epopeicos de orquestra. As Wachowski vão tão profundo na jornada heroica de Speed, com esses traços audiovisuais, que o final tem direito até ao carro que o herói dirige deformando a imagem com tanta velocidade para ganhar a corrida, como uma dança futurista e crítica, uma arte além do mercado.

Antes desse filme as irmãs Wachowski dirigiram um recheado de referências orientais de anime e estilos de luta, questionando estruturas sociais com uma mitologia religiosa e tecnológica. Com Speed Racer, a inspiração no anime original incentiva as diretoras a partir direto para as composições da arte e inserir a corrida lúdica como um confronto a qualquer trava, ou arpão empresarial que segure o cinema. Alegremente se forma uma obra que não é mais corporal com slowmotion, é motorizada e veloz como modos de contar a história do cinema em suas possibilidades técnicas, como um James Cameron se motiva a fazer seus longa-metragens para modificar a tecnologia cinematográfica ao mesmo tempo que conta histórias clássicas com narrativas dramáticas.  

Entretanto, no filme de 2008, o objetivo é mais formal que as ideias de Cameron. Para distinguir a trama familiar, a ação não para apenas na corrida, a comédia infantil equilibra o drama de embate exagerado e cheio de caretas entre o vilão e o herói em relação às crenças sobre a arte da corrida, e rimas visuais vão desde a associação de imagens ao ensinamento, a sentir o motor do carro em todos os arranjos se fecharem  com a edição das imagens. São essas características que tornam Speed Racer um show de sensibilidade, com jornalistas gritando, uma plateia em alvoroço computadorizado, e as linhas de uma virada de câmera com  estilo gráfico, assim como o quadriculado da faixa de vitória.

Não falta criatividade para esse filme: em que tudo é contado e descrito na simultaneidade eficaz e objetiva de narrativa textual, sonora e visual, como um agente de compreensão artística emocionante e de paralelos familiares inseridos num mundo veloz da corrida como herança. Os efeitos visuais, sempre dispostos ao julgamento do espectador, e a articulação da tecnologia “botãodorizada”  fazem carros carnavalescos do mundo de Speed Racer terem personalidade ao saltarem e serem brinquedos vivos, mesmo em CGI, empolgando em manobras com slowmotion precisas, com a impressão de curvas tão acentuadas de maneira ao universo se justificar na mesma bizarrice artificial. 

Pode ser que que realmente o sentimentalismo ou a vivacidade não realística das cores canse o público, mesmo com tantas justificativas que o filme se explique nas suas propostas formais. Porém, com certeza a unidade estilística aqui é uma das melhores do cinema no quesito da formação de uma propriedade narrativa única. Ao menos isso precisa ser reconhecido.

Speed Racer (Speed Racer) – EUA, Australia, Alemanha, Japão | 2008
Direção: Andy Wachowski, Lana Wachowski
Roteiro: Andy Wachowski, Lana Wachowski, baseado na obra animada Speed Racer de Tatsuo Yoshida
Elenco: Emile Hirsch, Nicholas Elia, Susan Sarandon, Melissa Holroyd, Ariel Winter, Scott Porter, Kick Gurry, Christian Oliver, John Goodman, Vinzenz Kiefer, Paulie Litt, Willy, Christina Ricci, Matthew Fox, Moritz Bleibtreu, Richard Roundtree, Benno Fürmann
Duração: 135 min.

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