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Crítica | Succession – 3X04: Lion in the Meadow

Quando os caçadores viram a caça.

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas das demais temporadas. 

Estamos apenas no quarto episódio da temporada e eu já estou precisando repetir meus elogios hiperbólicos sobre os roteiros e atuações de Succession. É impressionante – realmente impressionante – constatar como tanta coisa consegue ser magistralmente inserida em apenas uma hora de TV e como todo o elenco parece estar vivendo um dia verdadeiro, genuíno na vida de seus respectivos personagens, com uma naturalidade tão grande, mas tão grande, que a imersão na história é imediata, daquelas que só percebemos mesmo que o tempo passou quando, abruptamente, vem a tela preta com os créditos nos tirar do transe.

Lion in the Meadow, ou, em tradução direta, Leão no Prado, é outra perfeição narrativa nesta temporada que vem conseguindo superar as já incríveis anteriores. Há tanto o que falar que a angustiante situação que nomeia o episódio e que traz Adrien Brody para a série como Josh Aaronson, importante acionista da Waystar-Royco que passa a ser cortejado pelos Roys e por Sandy e Stewy, os troianos potenciais compradores da empresa familiar, nem é o que imediatamente chamou minha intenção para fins da escrita aqui. Quando os créditos começaram a rolar, eu só fiquei pensando no Tom Wambsgans de Matthew Macfadyen.

Sim, o atrapalhado Tom. O trágico Tom. O mesmo Tom que se ofereceu para ir para a prisão no lugar de Logan Roy se isso acabasse sendo necessário. Durante sua profunda pesquisa sobre as prisões americanas, inclusive com um catálogo(!!!) que o leva a “escolher” uma que é cheia de prisioneiros judeus e que, portanto, tem máquina de venda de comida kosher ou sobre a fermentação de vinho branco na privada da cela, eis que Shiv, claramente feliz da vida como a mandona do pedaço, lhe dá duas ingratas missões: interferir na editoria do telejornal para que Mark Ravenhead, defensor do presidente americano, comece a atacá-lo e convencer Greg de bandear-se para o lado de Logan. O resultado é duplamente destruidor para Tom, já que Mark – em uma inteligente e econômica elipse off screen – obviamente se recusar a mudar sua linha editorial e Greg, o ambicioso e traidor Greg que fica só comendo pelas beiradas até ter condições de dar o bote, já aparece devidamente comprado por Logan, com direito a cesta de pães e um cargo importante na divisão de parques. E isso sem contar que Mark é devidamente posto em seu lugar por Shiv logo em seguida, levando-o a desancar o presidente que liga furioso para Logan que, por sua vez, o atende com prazer.

Em outras palavras, Tom é um fracasso retumbante que não tem outra saída do que fazer o que mais gosta de fazer quando está frustrado: espezinhar Greg. Mas em breve nem isso será possível, pois o jovem executivo com sala sem janelas muito provavelmente terá sua sala de quina e, se duvidar, passará a ser hierarquicamente superior a Tom. Macfadyen brilha aqui, como já vem brilhando majestosamente nesta temporada. Aquela aparente insegurança dele leva a momentos de desconcertante comicidade quando ele fala das prisões e mascara ansiedade e verdadeiro pavor pelo seu futuro, algo que fica transparente para todo mundo por ali a ponto de ele ser apelidado de Tom Terminal. A forma como o ator consegue converter humor em raiva, sensação de abandono, rancor, inveja e impotência é admirável, algo que a direção da dupla Robert Pulcini e Shari Springer Berman explora ao máximo.

Mas é claro que o grande momento do episódio é mesmo quando Logan e Kendall Roy, encontrando-se presencialmente pela primeira vez desde que o escândalo foi escancarado, vão, cabisbaixos, até a mansão de Josh Aaronson para comer na mão dele. Estamos acostumados a ver a força, a insensibilidade e a sana por poder dos Roys – tudo nessa série é por poder, aliás – e chega a ser estranho ver alguém subjugando especialmente a dupla formada por pai e filho traidor. Brody, que há muito tempo não entregava uma atuação realmente boa, entra de imediato na vibe da série e se transforma em um sujeito que consegue ser mais asqueroso que todos os Roys juntos, um cara que quer sentir a pulsação da relação entre a dupla convidada e que, para isso, coloca os dois no que podemos chamar bastante facilmente de ritual sádico, com direito a longas caminhadas por sua propriedade, um almoço que obviamente ninguém toca e diálogos em meias palavras que são enervantes, mas ao mesmo tempo tão corrosivos quanto ácido sulfúrico.

Aaronson é, sem sombra de dúvida, o leão no prado prestes a engolir dois cervos, o que é algo monstruoso por si só considerando-se exatamente quem são esses servos (a troca de letra não foi um erro). Aliás, os cervos servos protagonizam dois momentos inesquecíveis dentro de toda essa sequência no prado de Aaronson. O primeiro deles é o silêncio destruidor, com a câmera nervosa aproximando-se e afastando-se do rosto dos dois logo depois que Logan se viu obrigado a elogiar o filho. Uma obra de arte audiovisual em silêncio desconcertante absoluto. O segundo, claro, é o angustiante retorno de Logan pelo “atalho” sugerido pelo investidor que é uma daquelas cenas que conseguem nos fazer sentir pena por um monstro mesmo sabendo que era improvável que ele fosse ter algo muito sério. Brody sem dúvida teve o melhor papel em muito tempo em sua carreira, mas Brian Cox e Jeremy Strong mostram, nesses momentos, quem é que manda de verdade em Succession.

Não poderia encerrar a presente crítica sem falar de Connor, que já havia deixado muito claro que queria um “pedaço da torta”, algo que ele de maneira particularmente direta e, diria, violenta, reitera para Shiv, como se ele estivesse tirando as luvas de pelica e mostrando sua verdadeira face. Como Tom, vejo em Connor um personagem trágico – não para sentir pena dele, não é isso – que passou o pão que o diabo amassou quando pequeno tendo como pai Logan Roy e que, agora, busca poder (novamente – e sempre – poder!) não só por uma questão de orgulho, mas também por um sentimento de vingança enterrado bem lá no fundo (ou nem tanto…). Também não posso esquecer de Gerri tentando firmar-se em seu cargo e jogando um jogo estranho – nem sei direito o adjetivo que deveria usar aqui – com o doentio Roman que sempre tenta estabelecer aquela intimidade desconcertante para também estabelecer seu espaço ali, quase que em uma história paralela que consegue metaforicamente sujar ainda mais a já podre estrutura de poder e riqueza da série. E nessa “brincadeira” toda, as únicas pessoas que não importam nada para ninguém – e eu repito: ninguém – são as vítimas do escândalo que serve de força motriz para a temporada. É ou não é a vida como ela é?

Lion in the Meadow chega a assustar quando percebemos que os todo-poderosos “servem” a outras pessoas que conseguem ser ainda piores do que eles. Da mesma forma, o humor que gravita Tom e que alquimicamente se transforma em pesar, desespero e medo é incômodo, até difícil de assistir, mas ao mesmo tempo impossível de virar o rosto até que, como disse, somos arrancados da hipnose pela tela preta dos créditos. Será que a sujeirada toda que vemos transcorrer na telinha pode nos afetar de alguma maneira?

Succession – 3X04: Lion in the Meadow (EUA – 07 de novembro de 2021)
Criação: Jesse Armstrong
Direção: Robert Pulcini, Shari Springer Berman
Roteiro: Jon Brown
Elenco: Brian Cox, Jeremy Strong, Sarah Snook, Kieran Culkin, Alan Ruck, Nicholas Braun, Matthew Macfadyen, Peter Friedman, J. Smith-Cameron, Natalie Gold, Justine Lupe, Sanaa Lathan, Hiam Abbass, James Cromwell, Hope Davis,
Zack Robidas, Adrien Brody
Duração: 59 min.

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