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Crítica | Succession – 4X01: The Munsters

Um vislumbre de humanidade?

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas das demais temporadas. 

No espetacular Too Much Birthday, acompanhamos a milionária, modernosa e deprimente festa de 40 anos de Kendall Roy e, agora, no começo da derradeira temporada de Succession, temos um vislumbre da também milionária, mas completamente tradicional festa de aniversário do patriarca da família, Logan Roy, faltando 48 horas para a compra da Waystar pela GoJo ser efetivada e mais alguns dias para a eleição presidencial dos EUA que promete colocar seu candidato preferido no assento máximo e em meio a uma tentativa de ele próprio comprar a PGM da família Pierce. Em meio a sorrisos, “parabéns para você” e felicitações, Logan é uma solitária pilha raivosa de nervos que quer mais é se livrar daquele monte de sanguessugas comedores de canapés ao seu redor.

Em outras palavras, no mundo extremamente endinheirado que os Roys vivem, não há nenhum semblante de felicidade, nada que se assemelhe a menos do que uma batalha campal em que o dinheiro é a arma mais poderosa ou, talvez, a única verdadeira arma. E o mais interessante é notar, quase que como uma antítese do que eu acabei de afirmar, o quanto nesse patamar o dinheiro é irrelevante, é algo que não faz diferença, algo que fica comicamente claro quando a noiva de Connor Roy pergunta para ele se, mesmo depois de ele gastar mais 100 milhões de dólares em sua campanha presidencial só para preservar seus míseros 1% de votos de forma que ele possa ser “mantido na conversa”, ele continuará rico, ao que ele responde quase rindo na linha de “é óbvio que sim”.

O dinheiro, aqui, portanto, representa poder e é isso que está em jogo ao longo da excepcional uma hora de The Munsters em que grande parte do episódio é dedicado a uma licitação entre os dois lados da família Roy para a compra da PGM, com Nan Pierce, com seu verniz de liberal anti-Logan, mostrando-se muito claramente que de liberal e anti-Logan ela não tem nada, só interessando mesmo o quanto de poder será jogado em seu colo por aqueles que se digladiam por seu império. Mas antes de Nan entrar fisicamente na história, é sensacional ver Kendall, Shiv e Roman conversando excitados sobre o “brinquedinho” novos deles, o The Hundred, que nada mais é do que um amontoado de ideias banais sendo apresentadas em um pacote repleto de chavões e clichês e o quanto essa ideia logo desaparece da mente deles quando uma conversa entre Shiv e Tom os faz farejar a PGM também.

Entra, aqui, a vontade dos três filhos não em terem um negócio próprio pós-GoJo, mas sim em se mostrarem melhores que o pai, mesmo que toda sua inteligência em negócios não passe justamente da única frase que Logan dirige a eles: “Parabéns por terem falado o número mais alto”. Porque é exatamente isso. Os três, por mais inteligentes que possam ser, não passam de crianças mimadas querendo fincar suas bandeiras a todo custo e que, no processo, deixam o emocional tomar conta de tudo a ponto de fazerem uma oferta que, para todos os efeitos, é absurda. Roman é o único que – por fazer todo tipo de esforço para evitar conflitos, especialmente com o pai – se mostra consciente em algum nível do que eles estão fazendo na verdade, mas, justamente por sua covardia, ele apenas acompanha o frenético fluxo comandado por Kendall e Shiv.

E é exemplar – sempre foi na série, aliás – como a montagem ecoa as diferentes atmosferas estabelecidas no episódio. O mencionado frenesi dos três Roys como tubarões sentindo sangue na água ganha uma edição picotada, enervante que funciona também para questionar as próprias decisões sendo tomadas. Os diálogos rápidos entre os irmãos, muitas vezes com frases curtas e até meias frases revelam excitação e desmascaram o que eles mesmo afirmam, que não se trata de uma operação para eles se vingarem de Logan e sim, apenas, puro negócio (balela!). Eu fico admirado como as palavras são usadas com absoluta precisão em cada sequência, seja o telefonema quase ininteligível (inicialmente) entre Tom e Shiv que é, para todos os efeitos, o “sangue na água” que leva os três a instantaneamente esquecerem o The Hundred (já pensaram no quanto eles gastaram só para montar a proposta e, em um estalar de dedos, jogaram fora?) e farejarem a PGM.

Na outra ponta, há uma profunda melancolia e solidão do lado de Logan Roy. O único membro efetivo de sua família que está de seu lado é Connor, mas Connor tem agenda própria que sequer tangencia com a do pai. O contraste dos cortes rápidos das cenas com Kendall, Shiv e Roman com as tomadas mais longas no apartamento de Logan chega a ser desnorteador, assim como a fotografia que alterna entre a claridade e a escuridão quando vai de um grupo a outro nessa guerra familiar. De certa forma até, mesmo considerando o quanto Succession é uma série corajosamente povoada de pessoas que o espectador não consegue deixar de detestar, é possível sentir o vazio em Logan, algo que é amplificado quando ele decide sair de sua festa para caminhar e comer alguma coisa com seu fiel segurança, levando-o a monólogos que reafirmam a natureza econômica das pessoas e, de certa forma surpreendentemente, a um questionamento sobre o que há – se há algo – após a morte.

Seria um sinal de cansaço por parte de Logan? Ou será que estamos apenas vendo um breve e raro vislumbre do que restou de sua humanidade, de um pai que sente falta dos filhos, talvez de sua segunda esposa também, de um homem que construiu um império, mas sem exatamente saber o porquê? Eu gosto de imaginar que ainda há algo relacionável em Logan, mesmo que essa “demonstração de fraqueza” acabe sendo um interlúdio para o retorno de sua persona dominante que, como sabemos, é impiedosa e maquiavélica, capaz até mesmo de melar o negócio WayStar-GoJo somente para impedir que os filhos tenham fundos para adquirir a PGM. E vamos combinar que, por melhor que Jeremy Strong, Sarah Snook e Kieran Culkin tenham se mostrado ao longo da série, quando o foco fica em Brian Cox nem que por apenas cinco minutos, o veteraníssimo ator simplesmente engole o cenário. Basta ver a simples sequência final em que Logan, assistindo o telejornal noturno de sua empresa, liga para Cyd para reclamar e, mais do que isso, para projetar nela sua própria momentânea insegurança, tristeza e insatisfação. Um verdadeiro monstro dramatúrgico esse escocês!

No entanto, é também possível ver um pouco de humanidade em Shiv durante sua conversa com Tom. Ela pede o divórcio finalmente, mas seu semblante diz outra coisa bem diferente, mesmo que ela nunca pareça ter ligado muito para o marido. Toda a sequência em meia-luz é também extremamente melancólica, até porque sabemos que Tom realmente sempre amou e ainda ama a esposa e vê-lo receber o pedido de divórcio, mesmo que completamente previsível em razão especialmente dos lados opostos que eles tomaram em relação a Logan Roy, é melancólico também. E eles, ao final, deitados na cama – separados, mas juntos ainda – cria um belo momento de ambiguidade que parece ecoar as lealdades fluidas em relação aos lados entrincheirados nessa guerra.

Succession aparentemente vem com tudo para sua temporada final e desde já digo que fará falta na gigantesca grade de séries ofertadas por aí. Mas, como tudo o que é bom na televisão, é melhor que acabe antes de se desgastar e a escolha do showrunner em fazer do quarto o último ano da série é mais do que acertada. Se The Munsters é alguma indicação, o encerramento tem tudo para ser perfeito.

Succession – 4X01: The Munsters (EUA – 26 de março de 2023)
Criação: Jesse Armstrong
Direção: Mark Mylod
Roteiro: Jesse Armstrong
Elenco: Brian Cox, Jeremy Strong, Sarah Snook, Kieran Culkin, Alan Ruck, Matthew Macfadyen, Nicholas Braun, J. Smith-Cameron, Peter Friedman, Cherry Jones, Jeannie Berlin
Duração: 60 min.

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