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Crítica | Succession – 4X04: Honeymoon States

Sublinhado ou riscado?

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas das demais temporadas. 

Sempre que uma grande série nos brinda com um episódio completamente arrebatador, é natural que esperemos que o seguinte não chegue ao mesmo nível. A diferença, no caso concreto, é que não existem superlativos suficientes para classificar Connor’s Wedding que, como disse na crítica anterior, não só é o melhor episódio da série até agora, como é um dos melhores episódios já feitos na História das Séries de Televisão. Portanto, o que eu esperava de Honeymoon States que, vale dizer, é o terceiro episódio seguido que se utiliza do casamento de Connor para extrair seu título, era uma volta à normalidade, ficando claro que normalidade nesta derradeira temporada de Succession é apenas e tão somente o enfileiramento de obras-primas. E é justamente isso que Jesse Armstrong nos entrega mais uma vez.

O que o showrunner faz, sem poder contar com a presença imbatível e magnética do Logan Roy de Brian Cox é fazer de sua ausência uma das presenças mais sentidas e mais poderosas que a televisão já (não) mostrou. Tudo gira ao redor de Logan Roy, o que é natural quando estamos, na prática, no dia seguinte de sua morte, mas que é amplificado sobremaneira pela forma como o roteiro que Armstrong co-escreveu com Lucy Prebble trabalha cada núcleo e a maneira de cada um de lidar com a perda, sempre transformando-a em algo mais – ou menos, dependendo de como olharmos – e constantemente relacionado com dinheiro. Peguem Connor como um exemplo simples, mas doloroso, disso em sua conversa breve com Marcia em que ele acerta a compra do gigantesco apartamento do pai por 63 milhões de dólares, o que leva Willa, mais para a frente, já discutir que modificações faria no imóvel. Por mais que detestássemos Logan Roy, não é ainda mais detestável ver seu filho mais velho, aquele que, em Reherseal, disse que aprendeu a viver sem amor, não esperar nem o corpo de seu pai esfriar para regatear o preço de onde ele morava com uma ex-exposa que, por sua vez, já tinha o preço na ponta da língua?

Claro que a questão do apartamento é apenas um detalhe, mas ele consegue ser uma espécie de epitáfio perfeito para Logan Roy, algo como “aqui jaz um monstro cujas monstruosidades se perpetuam em seus filhos”, e ilustra muito bem tudo o que acontece ao longo de todo o episódio. Afinal, se imaginarmos que, realmente, Ken, Shiv e Roman ficaram abalados com a perda do pai – e eles realmente ficaram, talvez especialmente Ken – isso muito rapidamente é colocado em segundo plano na mente da trinca a partir do momento em que os executivos da velha guarda da Waystar-Royco, que também brigam entre si pela sucessão, revelam a existência do “pedaço de papel” em que Logan teria indicado que seria seu desejo que Ken o sucedesse. O nome sublinhado – ou seria riscado? – a lápis torna-se um gatilho da húbris de Kendall que passa a fazer de tudo para agarrar-se ao tão desejado título nem que seja de forma interina até a venda da empresa para a GoJo e dos ciúmes de seus dois irmãos envolvidos com o mundo corporativo, o que gera uma maravilhosamente bem executada briga de foice velada entre os três até que os dois homens, unidos, afastam Shiv e a ideia de um triunvirato, deixando-a desnorteada no processo com a vaga promessa de que ela sempre estaria envolvida em todos os processos decisórios.

Aliás, repararam que maneira elegante que o roteiro, na abertura do episódio, revela, como quem não quer nada, que Shiv está grávida de algo próximo de 20 semanas? É como se já soubéssemos disso a ponto de causar até aquela dúvida se isso havia ou sido abordado antes – não, não foi – e a reação de Shiv não tem preço em sua frieza e vontade de desligar o telefone para não ter que falar sobre esse assunto, o que nos remete ao momento em que ela pede o divórcio de Tom em The Munsters, mesmo nutrindo por ele um sentimento no mínimo análogo ao amor. Falando em Tom, considerando que ele, agora, é um pária rejeitado pelos Roys de um lado e pelos seus ex-aliados por outro, será interessantíssimo quando ele descobrir sobre a gravidez de Shiv, algo que talvez acabe sendo o último prego em seu caixão marital e corporativo.

Mas há muito mais, muito mais mesmo para se falar sobre o episódio. Temos aquele horripilante momento em que Marcia humilha Kerry publicamente ao ponto de deixar até mesmo Roman com pena da moça. Temos as diversas interrupções constrangedoras de Greg que, do seu jeito e assim como Tom, tenta cavar novamente um espaço qualquer ali naquela cizânia. Temos, não podemos esquecer, o nojento Ron Petkus sequestrando o momento para, como Connor deixa claro, reescrever a história. Temos ainda, claro, o esperto momento em que Ken entreouve a conversa de Hugo com sua filha logo no começo do episódio que serve de instrumento de chantagem para que Ken, com o peito inflado de orgulho e de arrogância, faça da traição seu primeiro ato como CEO, reiniciando um ciclo perverso e sem fim.

Em outras palavras, Honeymoon States é como um novo começo para a série que usa a morte de Logan Roy como uma maneira de deixar bem claro que ele está ali bem presente nas mentes e nos atos de todos, ainda que nenhuma pessoa isolada ali reúna realmente todas as “qualidades” do magnata mesmo que vários achem que reúnem. É como ver um grupo de hienas circundando um animal abatido e tentando garantir seu pedaço, mas com Armstrong transformando essa imagem sanguinolenta em pura poesia audiovisual que continua mantendo na estratosfera o nível desta temporada. O Rei está morto. Vida longa aos Reis!

Succession – 4X04: Honeymoon States (EUA – 16 de abril de 2023)
Criação: Jesse Armstrong
Direção: Lorene Scafaria
Roteiro: Jesse Armstrong, Lucy Prebble
Elenco: Brian Cox, Jeremy Strong, Sarah Snook, Kieran Culkin, Alan Ruck, Matthew Macfadyen, Nicholas Braun, J. Smith-Cameron, Peter Friedman, Cherry Jones, Jeannie Berlin, Justine Lupe, Zoe Winters, Arian Moayed, Stephen Root, Fisher Stevens, Dagmara Dominczyk, Hiam Abbass
Duração: 59 min.

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