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Crítica | Succession – 4X07: Tailgate Party

Viking reverso.

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas das demais temporadas. 

Todo mundo conhece a fábula do Escorpião e do Sapo e o artrópode enclausurado em vidro que Tom presenteia Shiv logo no começo de Taigate Party não só é um “fuck Shiv” – que, no final, se torna um “fuck Tom” triplo -, como um reconhecimento de que o que escorpião faz com o sapo é da natureza de sua esposa, algo que ela não pode escapar. Não é uma justificativa, não é a aceitação dessa natureza, mas sim um “eu sei o que você é”. E, claro, esse estranho início é, também, um prenúncio do que está por vir, já que tudo o que Shiv faz durante a festa de véspera de eleição originalmente organizada por seu pai e que ela e o marido ciceroneiam é usar seu ferrão repetidas vezes de forma a passar para Lukas Matsson as informações estratégicas sobre seus irmãos.

Não é lá uma metáfora muito sutil, e isso me desaponta um pouco, devo confessar, assim como me desaponta a continuação da história do “vende não vende” entre Waystar-Royco e GoJo, mas, diferente do episódio anterior, em que essa repetição temática parecia uma forma de enrolar o desfecho da série, aqui o assunto não só evolui a passos largos, como, de certa forma, torna-se matéria subsidiária diante do jogo de forças políticas que vemos se desenrolar ao longo da festa que deixa evidente a relação promíscua entre a grande mídia e a política. E não, não vou aqui restringir-me ao que Jesse Armstrong faz em primeiro plano, que é emular a conexão da Fox News com a eleição de Donald Trump nos EUA, pois isso é mais do que óbvio e vem sendo construído desde o início da série. Quando falo da grande mídia e da política, não quero me limitar a esse momento da história recente dos EUA, pois isso não só não aconteceu apenas essa vez, como não está circunscrito aos Estados Unidos. Trata-se de um fenômeno mundial desde sempre e o valor do roteiro de Will Tracy é justamente conseguir resumir essa complexa e suja relação de maneira tão eficiente, mesmo considerando o turbilhão de outras questões que ele precisa abordar.

Não só vemos a questão hors festa do bullying sofrido pela filha de Ken em razão do posicionamento politico da ATN em favor do candidato republicano Jeryd Mencken, como notamos como a ATN, mesmo com esse viés, está disposta a encaixes políticos aqui e ali para sua própria sobrevivência. A maleabilidade de Ken, representada principalmente pela oferta que ele faz a Nate de suavizar o ataque ao candidato democrata nos primeiros 100 dias de governo caso ele ganhe, é a primeira prova disso. Outra é a promessa aberta de trocar a liderança da ATN – ou seja, mandar Tom para a rua – caso o negócio com a GoJo não vá em frente, o que teria o potencial de mudar o cenário politico americano. Novamente, tudo é um jogo. Tudo o que vivemos não passa de um tabuleiro em que as peças são movidas por interesses econômicos de uma elite desgarrada da realidade ou, talvez melhor dizendo, tão consciente da realidade, que é essencial que ela seja mantida e não alterada.

No seio da família Roy, esse jogo se manifesta com a proposta que os assessores de Mencken fazem para Cameron por intermédio de Roman: se ele desistir da corrida, o que provavelmente significaria que seus votos beneficiariam o republicano, ele ganha uma posição diplomática em algum país que “razoavelmente importante”. É sensacional ver como algo assim parece tão palpável e tão verdadeiro. Tudo bem que, em razão de interferência de Willa, Connor acaba não aceitando a proposta – mas ele queria aceitar – e segue em frente com sua campanha, mas, na vida real, isso já aconteceu muitas e muitas vezes das maneiras mais diferentes e por posições bem mais importantes do que o cargo de embaixador em Omã.

Esse pano de fundo para a estratégia de sabotagem da compra da Waystar-Royco por Ken e Rome é sem dúvida mais fascinante do que a própria estratégia de sabotagem, mesmo com todas as manipulações de Shiv e mesmo com a revelação, extraída primeiro por um Roman que ordena logo no início uma investigação mais profunda da GoJo e, depois, diretamente de uma relutantemente vingativa Ebba. Assim como a parábola do escorpião e do sapo foi um tanto quanto na cara, diria que a revelação de que, assim como Ken fez com sua empresa, a GoJo também tem seus números “levemente inflados”, nada que uma outra Índia não resolva, parece-me um tantinho quanto conveniente e fácil. Não que a mentirada sobre números corporativos de um lado ou de outro não seja realista e até provável, mas confesso que esperava uma saída melhor para permitir que Ken realmente virasse o jogo e partisse para o ataque combinado com Frank, com o comprado tornando-se o comprador.

Mas, claro, mesmo com esse caminho levemente mais cansado que Armstrong toma, o grande final com a discussão dura entre uma Shiv pela primeira vez realmente abalada pelo jogo que ela sente que foi mal jogado por ela com um Tom pronto para assumir a forma do sapo e receber todas as picadas quase que como uma forma de deixar ainda mais evidente para Shiv o que ela realmente é. A troca de dolorosas farpas entre os dois é um momento poderoso na série e Sarah Snook e Matthew Macfadyen estão simplesmente perfeitos em suas demonstrações de miséria, de mesquinharia e de pura raiva passional, se é que isso existe. Sei que esse é justamente o papel do ator, mas eu sempre me impressiono como os diálogos são realistas nesta série e a discussão do casal é outro exemplo vitorioso disso. A oscilação de Shiv entre fúria e choro contido e o crescendo de um Tom profundamente magoado são, sozinhos, material suficiente para os atores merecerem todo o tipo de reconhecimento na temporada de premiações.

Tenho para mim, porém, que Succession chegou a uma encruzilhada. Por melhor que tudo ao redor da compra ou não da Waystar-Royco pela GoJo, ou, agora, vice-versa, essa história central precisa ser resolvida antes do último minuto do segundo tempo. São ainda mais três episódios e, por mais que seja lógico que o grande momento climático aconteça lá pela metade do último capítulo, deixando tempo para eventuais dénouements, creio que seria preferível que o showrunner repetisse o feito de Connor’s Wedding e adiantasse o grande momento decisório, ou algo incomum nessa mesma linha. Caso contrário, assim como o ferrão do escorpião no flanco do sapo, a série pode afundar estando prestes a chegar gloriosamente na outra margem do rio, ou talvez menos dramaticamente, chegar lá, mas não sem engolir água no caminho…

Succession – 4X07: Tailgate Party (EUA – 07 de maio de 2023)
Criação: Jesse Armstrong
Direção: Shari Springer Berman, Robert Pulcini
Roteiro: Will Tracy
Elenco: Brian Cox, Jeremy Strong, Sarah Snook, Kieran Culkin, Alan Ruck, Matthew Macfadyen, Nicholas Braun, J. Smith-Cameron, Peter Friedman, David Rasche, Fisher Stevens, Dagmara Dominczyk, Justine Lupe, Alexander Skarsgård, Jóhannes Haukur Jóhannesson, Natalie Gold, Ashley Zukerman, Eili Harboe
Duração: 62 min.

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