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Crítica | Succession – 4X09: Church and State

Uma brilhante gangorra emocional.

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas das demais temporadas. 

Antes de entrar na crítica propriamente dita de mais um espetacular episódio desta temporada final de Succession, gostaria de destacar três momentos absolutamente memoráveis de Church and State, dois deles envolvendo Roman Roy e um lidando com “as mulheres” de Logan Roy. Em ordem cronológica, temos a cena em que, na limusine, Shiv finalmente conta aos irmãos que está grávida, com Ken recebendo a informação de maneira quase que completamente fria em razão do turbilhão que passa em sua cabeça sobre Rava, seus filhos, o funeral e, claro, a Waystar-Royco e Rome lidando com o momento da maneira asquerosa bem característica dele, maneira essa que me fez rir compulsivamente (doentiamente?) especialmente com sua piada de extremo mau gosto sobre se masturbar vendo Shiv amamentar sua prole. A segunda cena (ou cenas, na verdade) acontece não muito tempo depois, quando, em uma rápida sucessão, Shiv genialmente chama sua mãe de Cruella De Vil, Caroline percebe e processa quase que com pena a informação de que a filha está grávida e, em seguida, pega Kerry debaixo do braço, apresenta-a para Sally-Anne (vivida por Nicole Ansari-Cox, esposa de Brian Cox) e, diante de Marcia, faz a correlação entre as duas, com as quatro juntas sentando-se juntas, com um viés de orgulho e confrontação, bem em frente à cerimônia. E, finalmente, temos a fantástica sequência em que o inicialmente seguro Rome derrete no púlpito quando finalmente realiza que seu pai está morto.

A razão de eu destacar esses momentos logo no início da crítica em um parágrafo que eu tenho plena consciência de que ficou longo demais é simples: eu não queria arriscar deixá-las passar em branco em razão de meus comentários a seguir, já que, assim como a discussão de Shiv e Tom ao final de Tailgate Party, essas cenas são preciosidades audiovisuais que só mesmo Jesse Armstrong conseguiria criar em meio a um complexo emaranhado de personagens e situações que, por seu turno, arriscaria dizer que só Mark Mylod, na direção, seria capaz de destilar visualmente sem quebrar o fluxo narrativo e sem com que as cenas percam sua força destruidora. Existem sutilezas em cada um dos meus três destaques que cada um deles, separadamente, merecia uma análise específica, pois o roteiro cirurgicamente trabalhado constrói pequenas cápsulas narrativas que são mundos em si mesmo e que evocam tudo o que os personagens são e, mais ainda, tudo o que a série sempre foi desde seu início.

De forma alguma, porém, eu quero dizer que outras sequências e cenas não são tão memoráveis quanto as três que destaquei, pois é impossível deixar de admirar o grande James Cromwell retornando ao seu papel de Ewan Roy, irmão de Logan e seu discurso não programado que é surpreendentemente “suave”, mesmo que honesto e duro ou o discurso de emergência que Ken faz no improviso ou o momento de Shiv no palco ao levar a abordagem para um lado muito mais pessoal e humano, ainda que com camadas evidentes de falsidade. No final das contas, trata-se de mais um episódio em que cada vírgula, cada frase não completada, cada chiste, cada olhar, cada gesto conta uma história inteira e eu jamais, em minha insignificância, seria capaz de colocar em palavras, pelo menos não em menos do que dezenas de milhares de palavras.

Mas deixe-me chegar ao ponto que queria chegar quando decidir começar pelas cenas que mais me marcaram: Church and State, mais do que talvez qualquer outro episódio da série, mostrou que os personagens de Sucession não caminham em apenas uma direção. Não há uma evolução que poderíamos chamar de “clássica” deles, algo comumente esperado em filmes e séries. A gangorra emocional oscila de verdade ao longo da história e, se pensarmos bem, emula a realidade. E não falo, aqui, da realidade do exclusivíssimo recorte socioeconômico que a série aborda, mas sim algo bem mais amplo, aplicável a todos nós, seremos humanos normais, em nosso cotidiano. Nós hesitamos, nós paramos para pensar em meio a conversas, nós mudamos de opinião de uma hora para outra, nós nos irritamos com coisas importantes da mesma forma que nos irritamos com coisa prosaicas, nós choramos sem entender bem o porquê e vemos beleza em situações que outros não enxergam da mesma forma. O ser humano é naturalmente inconstante e volátil e essas características não devem ser vistas apenas como negativas, pois há muito valor nelas.

E, talvez mais do que isso, o ser humano costuma querer mais e não apenas dinheiro como Ken menciona em seu discurso, ainda que o dinheiro seja um trampolim inegavelmente essencial. Chamem isso de ambição ou talvez de ganância, mas olhemos à nossa volta e para nós mesmos e sejamos sinceros, pois sim, queremos sempre mais. Portanto, é perfeitamente possível compreender em algum nível a obsessão de Shiv, Rome e Ken em serem CEO (o CEO, no singular) da Waystar-Royco, pois isso os eleva a algo que eles nunca foram e que eles não exatamente podem comprar. E, obviamente, isso os posiciona para o mundo como o(a) verdadeiro(a) sucessor(a) de Logan Roy, o homem que comprou um mausoléu por cinco milhões de dólares de forma que ele não seja enterrado, mas sim… “depositado” é a palavra?… em um monumento à grandeza que ele achava que tinha e que os filhos também desejam lambendo os beiços.

Então sim, Ken reforçando a estratégia anti-aquisição da Waystar-Royco com o objetivo de galgar ao posto de Rei do Mundo e Shiv manobrando Matsson e Mencken para tornar-se a Rainha do Mundo e, finalmente, Roman em processo de autodestruição por perceber que perdeu essa oportunidade ao deixar seus sentimentos (que classificaria, friamente, como infantis até) falarem mais alto. Não há espaço para sentimentos. A não ser o sentimento de que o que se tem não é suficiente. E Church and State, assim, posiciona a temporada final de Succession para ser um triunfo audiovisual  sem igual.

Succession – 4X09: Church and State (EUA – 21 de maio de 2023)
Criação: Jesse Armstrong
Direção: Mark Mylod
Roteiro: Jesse Armstrong
Elenco: Brian Cox, Jeremy Strong, Sarah Snook, Kieran Culkin, Alan Ruck, Matthew Macfadyen, Nicholas Braun, J. Smith-Cameron, Peter Friedman, David Rasche, Fisher Stevens, Dagmara Dominczyk, Justine Lupe, Alexander Skarsgård, Justin Kirk, Hiam Abbass, Harriet Walter, Hope Davis, Jóhannes Haukur Jóhannesson, Eili Harboe, Natalie Gold, James Cromwell, Zoe Winters, Scott Nicholson, Larry Pine, Nicole Ansari-Cox
Duração: 73 min.

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